Alterações climáticas: quantos anos cabem numa década?

No 10.º aniversário do P3, estendemos o Megafone a dez vozes para falarem de dez causas. O que mudou numa década? Como será a próxima? Ricardo António, doutorando em Alterações Climáticas e Políticas de Desenvolvimento Sustentável, olha para os próximos dez anos no que diz respeito ao ambiente.

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André Kosters/Lusa

Dos 4500 milhões de anos de existência do nosso planeta, apenas cerca de 400 mil anos compreendem a presença da espécie humana: o nosso “parente evolutivo” Neandertal começou a habitar a Terra há 400 mil anos, seguindo-se o Homo sapiens moderno entre 200 a 300 mil.

Nesta perspectiva somos um pequeno nada na linha de tempo do planeta azul que já assistiu a cinco extinções em massa. Não será ficção dizer que estamos actualmente a cozinhar todos os ingredientes que levarão à mesa da Humanidade aquela que será a sexta. A grande diferença face às cinco anteriores é o factor humano e o facto de este ser o principal responsável pelas alterações climáticas e os catastróficos efeitos que daí advêm, que podem levar a que sejamos a primeira espécie a construir a estrada da sua extinção.

Nos últimos 100 anos lançámos dióxido de carbono para a atmosfera a um ritmo mais rápido do que em todo o tempo anterior em que o ser humano esteve na Terra. Como David Wallace-Wells escreve no livro A Terra Inabitável, infligimos tantos danos ao destino do planeta e à sua capacidade em sustentar a vida desde que Al Gore publicou o seu primeiro livro sobre o clima como em todos os séculos e milénios anteriores que marcaram a nossa existência enquanto espécie.

Perante este contexto em que já ultrapassámos a linha vermelha de 400 partes por milhão de concentração de dióxido de carbono na atmosfera terrestre, onde a meta de um aquecimento global máximo de 2ºC, estabelecida em 2016 no Acordo de Paris, surge cada vez mais como cenário mínimo, será mais útil olhar para o que podemos fazer nos próximos dez anos para mudar de rumo do que realizar um balanço da década que passou.

Se efeitos ambientais previsíveis já se fazem sentir e a ansiedade climática é uma realidade, os efeitos sociais ainda não são verdadeiramente compreendidos por todos. A título de exemplo, pensemos que a crise provocada pela guerra civil na Síria lançou para a Europa cerca de um milhão de refugiados. As Nações Unidas estimam que em 2050 sejam cerca de 200 milhões os refugiados do clima, oriundos da Ásia, África, América Latina e demais destinos onde a subida da água do mar, as temperaturas e fenómenos climáticos extremos tenham um efeito devastador sobre as populações mais frágeis e com menores possibilidades de adaptação e sobrevivência.

Foquemo-nos nos números que Bill Gates apresenta como mais relevantes para o destino do planeta no livro Como evitar um desastre climático. O primeiro é 51 mil milhões, relativo ao total de toneladas de gases com efeito de estufa que anualmente são lançados para a atmosfera. O segundo é 0 (zero), relativo ao valor de emissões que teremos de atingir.

Muitos são os factores que vão ditar o sucesso ou insucesso dessa empreitada nos próximos dez anos. Coragem e determinação de governantes e líderes de empresas, a genialidade e capacidade de inovação da comunidade científica e académica, o compromisso e mudança de hábitos e atitudes de cada um de nós, entre tantos outros que combinados vão ditar a nossa sorte. Todos têm algo em comum: dependem do factor humano.

É com esta premissa que devemos olhar para a próxima década, na certeza de que os jovens que nos últimos dez anos se indignaram e exigiram mudanças serão os líderes deste movimento transformador. As suas lutas terão vários palcos e formas de expressão. Um deles será, sem dúvida, as redes sociais, onde a capacidade destes novos guerreiros do planeta para influenciar, inspirar e capacitar se faz sentir de forma cada vez mais sólida, com dados em vez de opiniões infundadas e uma linguagem capaz de chegar aos corações e mentes de muitos.

Também em Portugal temos vários exemplos destes guerreiros pela mudança. Parte do que podemos fazer é estar atentos a eles, seguir o seu exemplo e ser parte da solução para que em dez anos façamos regredir o nosso impacto em pelo menos 100 anos.

Alguns das nossas “guerreiras” e “guerreiros” a seguir:

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