Também há Portugal sem Ronaldo

Dificilmente alguma equipa do mundo pode dizer que joga melhor sem Ronaldo. Trata-se, sim, de criar o contexto táctico certo para quem o rodeia. Nesta terça-feira, no Azerbaijão, isso já foi feito de alguma forma.

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É antiga a discussão sobre se a selecção portuguesa joga melhor sem Cristiano Ronaldo. O capitão tem contrariado constantemente essa tese – fá-lo com golos –, mas o debate teve, nesta terça-feira, mais um episódio.

Sem Ronaldo, Portugal venceu. Sem Ronaldo, Portugal jogou melhor do que na partida anterior. Sem Ronaldo, tudo foi tranquilo no triunfo (3-0) frente ao Azerbaijão, em jogo de qualificação para o Mundial 2022.

Dificilmente alguma equipa do mundo pode dizer que joga melhor sem Ronaldo, tal é a capacidade goleadora do madeirense. É um dos melhores seres humanos que alguma vez jogaram futebol.

A questão trata-se, isso sim, de criar o contexto táctico e as dinâmicas certas para quem rodeia Ronaldo, beneficiando, por arrasto, tanto o capitão como a selecção. E isso, no Azerbaijão, já foi feito de alguma forma.

Sem Ronaldo, Fernando Santos optou por manter o sistema habitual. Foi, porém, um 4x3x3 diferente – não tanto no desenho, mas nas características dos jogadores. Curiosamente, a teórica maior fragilidade dos azerbaijanos, comparados com a República da Irlanda, não levou o seleccionador a colocar “tracção à frente”. Acabou, até, por escolher um “onze” teoricamente menos ofensivo, trocando Ronaldo e Rafa por André Silva e João Moutinho.

Mas o futebol não é 1+1, pelo que a equipa portuguesa, apesar de ter menos atacantes, acabou por ser bastante mais competente do que tinha sido frente aos irlandeses.

Em tese, o posicionamento e as dinâmicas foram, frente ao Azerbaijão, mais ao encontro das características dos jogadores – mais do que a ausência de Ronaldo, a qual dificilmente melhora alguma equipa, notou-se maior lógica naquilo que cada craque pode dar, proporcionando um futebol mais combinativo.

E ter um avançado capaz de arrastar e fixar marcações – algo que Ronaldo não costuma dar como ponta-de-lança – é logo um bom ponto de partida, já que é mais fácil criar “confusão” na área adversária quando há uma referência capaz de a provocar.

Houve um ponta-de-lança mais declarado, André Silva, e um médio como João Moutinho, capaz de “colar” a equipa e não a deixar refém dos repelões individuais de Ronaldo, Jota, Rafa ou Guedes. Também por aí passou a maior capacidade de criar um futebol rendilhado.

Com Bruno Fernandes como médio interior direito e Bernardo como ala direito, Portugal montou, com João Cancelo, um trio capaz de proporcionar um jogo mais combinativo, por contraponto com o lado oposto, onde havia um futebol mais vertical de Diogo Jota, responsável por entrar em zonas de finalização.

O mesmo acontecia do lado contrário, quando Fernandes queria criar na esquerda – aí, era Bernardo a juntar-se ao avançado, depois de o adversário ser arrastado para o lado da bola.

E, depois de uns minutos iniciais com maior dependência dos detalhes técnicos e das “invenções” individuais de Cancelo, foi precisamente por estas dinâmicas que Portugal chegou aos golos.

Aos 26’, Bruno Fernandes chamou o jogo e a si do lado esquerdo e Bernardo, aproveitando a “sesta” momentânea de Khalilzada, finalizou ao segundo poste, num gesto técnico de grande nível e pouco ortodoxo, mas que pareceu ser intencional.

Aos 31’, a mesma receita, mas do lado oposto. Bruno Fernandes “chamou” o Azerbaijão à direita, cruzou, Diogo Jota desviou ao segundo poste, novamente nas costas dos defesas, e André Silva finalizou sem dificuldade – e sem oposição a preceito.

Como se dizia na transmissão da RTP, o problema de passar um jogo a defender é que é difícil manter a concentração perfeita durante todo o tempo. O Azerbaijão não conseguiu, “adormecendo” duas vezes, e sentiu-o na pele.

Para a segunda parte, Fernando Santos até poderia não se sentir tentado a mudar algo, mas o cartão amarelo a João Palhinha poderá ter sido a “desculpa” ideal para colocar no jogo um médio diferente.

Com o Azerbaijão remetido à defesa, os predicados defensivos de Palhinha poderiam ser menos úteis do que os ofensivos de Rúben Neves. Mas havia algo que não mudaria com Neves ou Palhinha: o parco engenho azerbaijano para ter a bola e, mais ainda, para atacar com qualidade.

Sem forçar muito, Portugal somou oportunidades de golo suficientes para chegar à goleada – perdoaram Diogo Jota, aos 48’, Bernardo, aos 54’, e novamente Jota, aos 65’. Mas como não é comum que o ala do Liverpool falhe muitos golos, Jota tratou de garantir que mantém a aura implacável: aos 75’ houve jogada individual e cruzamento de Cancelo, para um cabeceamento de Jota no centro da área - uma vez mais, mostrou que é um cabeceador de excelência, apesar da baixa estatura.

O jogo acabou por ficar mais vazio de futebol ofensivo e caminhou tranquilamente até ao fim. Afinal, o 3-0 a isso convidava.

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