Tribunal muito crítico da localização do aeroporto no Montijo

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada indeferiu uma providência cautelar apresentada por um grupo de cidadãos, por entender que não há risco iminente de ser construído um aeroporto civil no Montijo, mas a juíza diz também que a Declaração de Impacte Ambiental para o projecto só poderia ser negativa, dadas as condicionantes de carácter ambiental da zona

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A actividade de um futuro aeroporto civil não pode ser comparada com a que existe actualmente na base militar, diz a juíza Miguel Manso

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada indeferiu uma providência cautelar relativa à Declaração de Impacte Ambiental (DIA) do aeroporto no Montijo, mas, segundo o advogado do processo, a sentença “arrasa por completo a opção da localização”.

Em Dezembro de 2019, o grupo de cidadãos Negociata -- Ninguém Espera Grandes Oportunidades Com Investimentos Anti-Ambiente - interpôs uma providência cautelar para suspender a Avaliação de Impacto Ambiental relativa ao novo aeroporto do Montijo e requereu que não fosse emitida a Declaração de Impacte Ambiental (DIA).

A DIA seria emitida pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA) em Janeiro de 2020 e o mesmo grupo pediu que o procedimento cautelar fosse ampliado também à decisão da APA.

Agora, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada indeferiu a providência cautelar, mas, segundo o advogado do processo, Miguel Santos Pereira, a fundamentação da decisão “é uma verdadeira sentença de morte para a opção de localização”.

A providência cautelar, explicou, foi indeferida porque não existe especial urgência nem danos para a população, uma vez que o processo está parado, tendo o Governo anunciado a realização de uma avaliação ambiental estratégica.

Contudo, Miguel dos Santos Pereira considera que a decisão “arrasa por completo com a opção da localização no Montijo, entendendo o tribunal que a declaração de impacto ambiental nunca poderia ter sido favorável”.

“Pese embora o tribunal entenda que a declaração de impacto ambiental nunca poderia ter sido favorável, nós vamos analisar se faz ou não sentido recorrer, porque é manifesta a procedência na acção principal e o tribunal podia ter suspendido e acabado com o tema desde já”, disse.

Miguel dos Santos Pereira refere ainda que o grupo de cidadãos pode também optar por avançar com outro procedimento cautelar caso seja colocada a primeira pedra. “O que fica claro de uma vez por todas, e com a chancela do tribunal, é que a opção não cumpre os requisitos legais. Os que entenderam que a opção tinha viabilidade estão enganados e, como é o mesmo tribunal e a mesma juiz que vai decidir a acção principal, ficou claro que o aeroporto do Montijo não vai por diante”, frisou.

“Podem agora o Estado e a ANA pedir pareceres jurídicos, podem fazer o que quiserem, mas o aeroporto do Montijo, com esta decisão, fica claro que está sentenciado de morte e terá de ser colocado noutro sítio”, salientou.

Na sentença, a juíza escreve que “a escolha do local na Base Aérea do Montijo descura de modo evidente e manifesto os impactos ambientais, quer na fase de construção, quer na fase de exploração, nas áreas sensíveis legalmente protegidas, de importância nacional, comunitária e internacional, impactos esses que são, designadamente, a vasta destruição no local, na fase da construção e a sua afectação irremediável no futuro durante os cinquenta anos da fase de exploração, sem qualquer possibilidade de reconstituição ‘in natura’, desde que comece a fase de construção”.

Considera ainda a juíza que “o local escolhido com as implicações que apresenta em áreas sensíveis e legalmente protegidas, contraria a legislação ambiental invocada, relevando ainda a violação manifesta do Decreto-Lei nº 140/99, porquanto o EIA (Estudo de Impacto Ambiental) apresentado, apenas poderia fundamentar, naquele local, uma DIA desfavorável, de acordo com as leis de protecção dos locais, áreas protegidas, aves e habitats e o princípio da prevenção e da precaução”.

Ainda de acordo com a sentença agora proferida, “as 200 condicionantes exigidas, para remediar a situação, apenas demonstram a dificuldade ou mesmo a impossibilidade de cumprimento dos objectivos de protecção e conservação ambiental que devem ser prosseguidos pela Autoridade de AIA de cada Estado-Membro”.

No que se refere à extensão da pista para Sul, o tribunal refere que “o que está também em causa neste projecto com efeitos imprevisíveis e não estudados é a utilização diária da pista com uma extensão de 300 metros sobre o rio Tejo, o ruído diário dos aviões, a descolar e a aterrar, as luzes de presença no rio a indicar a pista, os gases de efeito estufa sobre as populações, ou seja, durante 50 anos a utilização intensiva do local”.

No entender da juíza, “a utilização pretendida difere da actual efectuada pela Base Militar, primeiro porque a pista actualmente utilizada é paralela ao rio no sentido Oeste/Este. No projecto em causa pretende-se a utilização no sentido Sul/Norte. Acresce ainda que o movimento de hoje efectuado na Base Aérea é incomparável com o que se perspectiva com o projecto”.

Segundo o tribunal, “a apreciação deste factor ambiental apenas reforça a desadequação do local e, consequentemente, da DIA favorável condicionada” e “a viabilidade ambiental do projecto”.

A 8 de Janeiro de 2019, a ANA e o Estado assinaram o acordo para a expansão da capacidade aeroportuária de Lisboa, com um investimento de 1,15 mil milhões de euros até 2028 para aumentar o actual aeroporto de Lisboa e transformar a base aérea do Montijo num novo aeroporto.

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