A sustentabilidade como linguagem comum

O que falta fazer é aferir com rigor e adequar com eficácia o que uns produzem ao que os outros consomem. Só assim se evitará o desperdício e se garantirá a sustentabilidade como linguagem verdadeiramente comum e partilhada por todos.

A mudança climática induzida pelo Homem está a provocar muitos e preocupantes acontecimentos extremos climáticos em todas as regiões do globo. Esse é um dos alertas do mais recente relatório do IPCC - Intergovernmental Panel on Climate Change, denominado The Physical Science Basis e que veio trazer à luz do dia muito do que estamos a verificar neste Verão incaracterístico de 2021. Os efeitos são evidentes nos extremos que ocorrem enquanto ondas de calor, fortes precipitações, secas e ciclones tropicais.

A temperatura da superfície do globo continuará a aumentar até pelo menos meados do século sob todos os cenários de emissões considerados e, como tal, as metas do Acordo de Paris de aquecimento global entre 1,5 ° C e 2 ° C serão excedidas ainda durante o século 21, a menos que profundas reduções de dióxido de carbono e de outras emissões de gases de efeito estufa ocorram nas próximas décadas.

Do ponto de vista da física, limitar o aquecimento global induzido pela Humanidade até um nível aceitável requer a limitação das emissões cumulativas de carbono, atingindo pelo menos Net Zero de emissões. O que diminuiria o efeito de aquecimento resultante e melhoraria a qualidade do ar. Mas é esse um objetivo verdadeiramente possível?

Para o atingir, a ultrapassagem destes desafios estará obrigatoriamente ligada à concretização efetiva de uma regulação política global, corporizada na Convenção contra a Alterações Climáticas das Nações Unidas. E, também, associada à capacidade de adotarmos modos de vida e de consumo mais sustentáveis, enquanto sociedade e enquanto cidadãos.

Existe hoje um movimento crescente de tomada de consciência da necessidade de transformação, tanto pelas empresas, como pelos cidadãos. Esta tendência tem-se corporizado numa resposta efetiva de produção sustentável pelas empresas e de comportamento sustentável pelos consumidores. Contudo, esta resposta não é uniforme e nem sempre a procura encontra uma oferta adequada. Ou, pelo contrário, a oferta de produtos e serviços sustentáveis nem sempre encontra uma procura consistente.

Conhecemos os cenários de alterações climáticas desenvolvidos para os impactos em Portugal e grandes disrupções são esperadas. Contudo desconhecemos o que, enquanto cidadãos e consumidores, queremos ou desejamos. Sobretudo não conhecemos o que pensamos em relação à adaptação dos estilos de vida e hábitos de consumo que contribuam positivamente para ultrapassar este grande desafio.

Por isso mesmo é objetivo do Healthy & Sustainability Survey, cujos resultados serão divulgados em Outubro, integrar pela primeira vez Portugal num inquérito global que, num comparativo com 30 outros países, identifique as tendências e preferências existentes entre os consumidores e também quais as barreiras existentes que obstam a que este mercado de produtos e serviços sustentáveis prospere.

Existe uma dissociação entre a aspiração dos consumidores e a sua concretização. Esta dissociação tem por base um conjunto vasto e complexo de fatores, sendo que dois dos mais importantes são a acessibilidade e o preço. Assim, em face de uma decisão de mudança nos hábitos e tendências de consumo, o consumidor depara-se com a dificuldade de encontrar no mercado os produtos com as características desejadas ou, quando o encontra, estes estão disponíveis mas com preços fora do seu orçamento.

Grandes oportunidades abrem-se atualmente ao fornecimento de produtos e serviços sustentáveis procurados e desejados pelos consumidores, por parte de empresas que desejem alinhar os seus modelos de negócio com os grandes desafios societais que enfrentamos. E como é sempre bom recordar, nada acaba por resultar mais caro do que uma oportunidade perdida. Para o evitar, o que falta fazer é aferir com rigor e adequar com eficácia o que uns produzem ao que os outros consomem. Só assim se evitará o desperdício e se garantirá a sustentabilidade como linguagem verdadeiramente comum e partilhada por todos.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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