Governo pressionado a desistir da nomeação de Vítor Fernandes para o Banco de Fomento

A investigação do Ministério Público aponta o ex-gestor do Novo Banco como um ajudante de Vieira em operações lesivas para o Fundo de Resolução. BE e IL tentam travar nomeação de Fernandes para o Banco de Fomento.

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Catarina Martins apresentou os candidatos do BE em Vila do Conde LUSA/MANUEL FERNANDO ARAÚJO

A escolha de Vítor Fernandes para o Banco de Fomento está a gerar críticas por parte do Bloco de Esquerda, Iniciativa Liberal e Chega, depois de a investigação do Ministério Público ter identificado o ex-gestor do Novo Banco como ajudante de Luís Filipe Vieira em operações que lesaram o Estado. Os partidos tentam travar a nomeação do antigo administrador do banco que nasceu da queda do BES, depois de o Banco de Portugal ter admitido reavaliar a sua idoneidade perante informações novas vindas a público no âmbito da Operação Cartão Vermelho.

A coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), Catarina Martins, criticou, este domingo, o Governo por nomear Vítor Fernandes para a liderança do Banco do Fomento, lembrando as alegadas ligações do responsável ao presidente suspenso do Benfica. Fernandes foi escolhido pelo executivo mas a sua nomeação aguarda ainda o parecer da CRESAP, tendo já recebido luz verde do Banco de Portugal.

“Estava na administração do Novo Banco quando Luís Filipe Vieira recomprou dívida de mais de 50 milhões, por apenas nove milhões, num negócio tão mal explicado que agora uma das medidas [de coacção] a que Luís Filipe Vieira está sujeito é não poder estar em contacto com Vítor Fernandes”, disse Catarina Martins.

A líder do BE, que esteve em Vila do Conde, no distrito do Porto, na apresentação dos candidatos autárquicos locais, estranhou a entrega de um mecanismo para a recuperação da economia e do emprego do país – o Banco do Fomento – “a alguém que está ligado aos escândalos bancários sucessivos” vividos nos últimos anos.

“Podem dizer que não sabiam desta ligação entre Vítor Fernandes e Luís Filipe Vieira, mas o Bloco de Esquerda já tinha dito no Parlamento que era muito estranho nomear-se para o Banco do Fomento alguém que esteve nas administrações da Caixa Geral de Depósitos, com [Carlos] Santos Ferreira, com empréstimos nunca explicados para que se comprassem acções do BCP a Joe Berardo”, acrescentou.

Catarina Martins referiu que são “escândalos financeiros como estes e uma economia de casino e especulação imobiliária que afundam país”, classificando a nomeação de Vítor Fernandes como “inaceitável”.

“Nunca vamos recuperar da crise desta pandemia se acharmos que a solução estará no investimento igual ao que foi feito até agora, em que o sistema financeiro se dirige a estes grandes negócios imobiliários e bolhas especulativas, que fazem alguns muito ricos, para depois de deixar dívidas de milhões aos contribuintes e negar o direito à habitação da população”, acrescentou.

Nesse âmbito, defendeu a criação de “um parque público habitacional que garanta que todos no país tenham direito a tecto digno”, lançando um repto ao Governo e às autarquias para mais medidas nesse sentido, e criticando que “se estourem milhões na bolsa da especulação imobiliária”.

“Quem vive da sua pensão ou do seu salário paga a renda no fim do mês. Não vai a uma comissão de inquérito parlamentar dizer que não se lembra do que fez com os milhões que andou a roubar aos contribuintes”, afirmou a líder do BE.

Também a Iniciativa Liberal diz que Vítor Fernandes não tem condições para assumir a liderança de uma nova instituição pública. “Face aos desenvolvimentos das últimas semanas, a Iniciativa Liberal considera que não existem quaisquer condições para que o chairman [presidente do conselho de administração] escolhido pelo Governo para o recém-criado Banco de Fomento possa desempenhar tais funções”, diz a IL em comunicado.

A IL lembra a passagem anterior de Fernandes pela CGD e as ligações conhecidas agora pelas investigações do Ministério Público ao segundo maior devedor do Novo Banco. “O facto de aparecer agora associado, no processo Cartão Vermelho, a relações de grande proximidade com Luís Filipe Vieira, fragiliza irremediavelmente a sua posição e compromete qualquer possibilidade de continuidade”, acrescenta o partido, lembrando que Vieira está impedido de o contactar no âmbito das medidas de coação a que está sujeito. A IL defende o papel do Banco de Fomento na gestão de fundos europeus impõe um “perfil de absoluta idoneidade” na sua liderança.

Também o Chega diz, em comunicado, que Vítor Fernandes “não tem condições” para liderar o Banco de Fomento, lembrando as ligações a Luís Filipe Vieira e a Armando Vara e o “interesse público” desta entidade financeira.

“Para além das ligações à operação Cartão Vermelho, são notórias as conexões a Armando Vara, também elas altamente desaconselhadas”, acrescenta o partido de André Ventura, que defende que o banqueiro não chegue a ocupar o cargo para o qual foi proposto pelo Executivo.

“Por tudo isto, o Chega reitera ao Governo a imperiosa necessidade de assegurar que Vítor Fernandes cessa de imediato qualquer função executiva no Banco de Fomento ou em qualquer instituição bancária, sendo esta a única forma de garantir que não assistiremos no futuro próximo a uma desestabilização ainda maior do sistema bancário e financeiro”, diz a nota à comunicação social.

Vieira proibido de falar com gestores do Novo Banco

As ligações entre Vieira e Fernandes levaram o Banco de Portugal a admitir reavaliar a idoneidade de Fernandes, mesmo depois de já ter dado aval ao gestor para o conselho de administração do Banco de Fomento. 

Luís Filipe Vieira foi detido esta semana no âmbito do processo Cartão Vermelho. Segundo o Departamento Central de Investigação e Acção Penal, os quatro detidos no caso são suspeitos de estarem envolvidos em “negócios e financiamentos em montante total superior a 100 milhões de euros, que poderão ter acarretado elevados prejuízos para o Estado e para algumas das sociedades”.

Em causa estão “factos ocorridos, essencialmente, a partir de 2014 e até ao presente”, e susceptíveis de configurar “crimes de abuso de confiança, burla qualificada, falsificação, fraude fiscal e branqueamento”.

Entre as medidas de coacção aplicadas neste fim-de-semana ao presidente suspenso do Benfica está a proibição de contactos com dirigentes do clube (e sua SAD) e actuais ou antigos gestores do Novo Banco, inclusive Vítor Fernandes.

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