Responsável do Governo brasileiro pediu suborno para comprar vacinas

Por cada dose da vacina AstraZeneca, o director de Logística do Ministério da Saúde pediu que se acrescentasse um dólar ao preço para beneficiar “um grupo” dentro do Governo. Dirigente foi demitido.

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Jair Bolsonaro ao lado do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga Reuters/ADRIANO MACHADO

Um dirigente do Ministério da Saúde brasileiro tentou subornar um representante de uma empresa que estava interessada em mediar a aquisição de vacinas contra a covid-19, revelou esta quarta-feira o jornal Folha de S.Paulo. O responsável já foi demitido, mas o caso aumenta a pressão sobre o Governo de Jair Bolsonaro, que já se tinha visto envolvido noutro negócio suspeito.

A denúncia foi revelada por Luiz Paulo Dominguetti, que representava a empresa de fornecimento clínico Davati Medical Supply, e que em Fevereiro entrou em contacto com o Ministério da Saúde para propor a aquisição de vacinas da AstraZeneca. Foi proposta, inicialmente, a venda de 400 milhões de doses da vacina a 3,5 dólares (três euros) cada.

O interlocutor de Dominguetti no Ministério foi o director de Logística, Roberto Dias, com quem se encontrou a 25 de Fevereiro num restaurante de um centro comercial em Brasília. Nessa reunião, Dias pediu-lhe que acrescentasse um dólar ao preço de cada dose sob a forma de um suborno.

“Aí ele me disse que não avançava dentro do ministério se a gente não compusesse com o grupo, que existe um grupo que só trabalhava dentro do ministério, se a gente conseguisse algo a mais, tinha que majorar o valor da vacina, que a vacina teria que ter um valor diferente do que a proposta que a gente estava propondo”, contou Dominguetti à Folha.

O empresário disse não saber quem integra o grupo referido por Dias que iria beneficiar com o suborno. O negócio acabaria por não se concretizar.

Esta quarta-feira, o Ministério da Saúde anunciou a demissão de Dias, mas não foi dada qualquer justificação. Segundo a Folha, o ex-director de Logística chegou ao Ministério como o apadrinhamento do líder da bancada parlamentar que apoia o Governo, Ricardo Barros, mas essa informação foi negada pelo próprio Barros, que disse que a sua nomeação aconteceu antes de ter integrado a base de apoio governamental no Congresso.

Barros é o pivô de outro caso que envolve a aquisição de vacinas e que está sob investigação. Trata-se do negócio para a compra de vacinas Covaxin, de fabrico indiano, cujos contornos mostram alguns indícios de irregularidades.

Esta semana, três senadores pediram à Procuradoria-Geral da República a abertura de um inquérito para apurar se Bolsonaro cometeu um crime ao não ter pedido a intervenção da Polícia Federal quando teve conhecimento de acções suspeitas nessas negociações. A PGR pediu para que se aguarde a conclusão dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a acção do Governo no combate à pandemia.

Foi na CPI que o deputado federal Luís Miranda disse na semana passada ter falado em Março com Bolsonaro a propósito de potenciais irregularidades no negócio – sobretudo a pressão sobre o seu irmão que é funcionário do Ministério da Saúde para apressar o andamento do contrato – mas que o Presidente nada fez. Segundo Miranda, a inacção de Bolsonaro foi justificada pelo próprio para não irritar Ricardo Barros, que estaria envolvido no potencial desvio de verbas públicas.

Na terça-feira, o Ministério da Saúde anunciou a suspensão do contrato de compra da Covaxin. O negócio tornou-se na peça central da CPI e nos próximos dias serão ouvidas testemunhas importantes, como um dos fundadores da empresa que intermediou o contrato. Esta quarta-feira, os senadores que integram a CPI decidiram convocar o ex-director do departamento de Logística e também Ricardo Barros para depor.

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