Sobreviver ao “grupo da morte” com um Ronaldo vintage

Sem os privilégios de muitos dos concorrentes, Portugal reagiu bem ao desastre de Munique e ganhou novas armas para os oitavos-de-final.

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Ronaldo é o primeiro jogador português a marcar nos três jogos da fase de grupos Reuters/LASZLO BALOGH

A 30 de Novembro de 2019, quando o antigo internacional alemão Philipp Lahm anunciou o nome da terceira equipa que integrava o Grupo F do Euro 2020, Fernando Santos e Didier Deschamps esboçaram um sorriso amarelo, enquanto Joachim Löw pareceu estupefacto. Sem se saber ainda que a Hungria seria o quarto elemento no “grupo da morte”, três dos seis primeiros classificados do ranking europeu (Portugal, França e Alemanha) estavam em confronto, no que podia ser perfeitamente a composição de dois terços do quadro das meias-finais da prova. Mais de um ano e meio depois, mesmo com um jogo falhado em Munique, a selecção portuguesa deu por duas vezes uma prova de força, em Budapeste, e manteve-se à tona, mas a defesa do título continuará a ser feita pela via mais difícil do Euro 2020. 

O capricho do sorteio do 16.º Campeonato da Europa de futebol serviu apenas para acentuar a formato muito pouco equitativo de uma competição condenada a ser irrepetível no seu desenho. Com sete selecções a terem o privilégio de disputarem a fase de grupos em casa, a primeira fase não foi jogada a velocidades iguais para todos os favoritos e outsiders. Elogiada por muitos pelo seu “futebol atractivo”, a Itália, por exemplo, fez três jogos em Roma contra adversários de uma segunda linha do futebol europeu: Turquia, Suíça e País de Gales. O mesmo se passou com a Espanha, que, mesmo no conforto de Sevilha, só à terceira, e contra a frágil Eslováquia, conseguiu convencer.

Sem os privilégios de muitos dos concorrentes, o campeão europeu e o campeão mundial não tiveram hipóteses de arrancar com rotações baixas e tiveram margem de erro quase nula. Tal como a França, Portugal teve que fazer na fase de grupos dois jogos na casa do adversário e, embora muitos tenham menosprezado a exibição e o resultado da estreia, o percurso da Hungria no Grupo F mostrou a competência da primeira partida portuguesa no Euro 2020.

Contra um rival que não perdeu contra franceses e alemães e que, desde o final de 2019, soma uma derrota em 14 jogos (o 0-3 contra Portugal), a equipa de Fernando Santos mostrou uma maturidade pouco habitual e o plano de jogo funcionou quase na perfeição. Durante mais de uma hora, os campeões europeus dominaram os magiares, que nunca conseguiram fazer mais do que meia-dúzia de passes consecutivos. Faltou que o último toque fosse perfeito numa das várias oportunidades que Portugal teve para marcar, mas quando, num golpe de fortuna, um ressalto impediu que Gulácsi continuasse a defender tudo, a Hungria rendeu-se e a vitória, mais do que justa, não fugiu à selecção nacional.

Quatro dias depois, tudo foi diferente. Após um confronto em que foi a única equipa que correu riscos e procurou vencer, Portugal defrontou uma Alemanha que estava ferida no seu orgulho pela derrota contra a França, com o mesmo “onze” e a mesma atitude com que se tinha estreado no Euro 2020. Mas, ao contrário dos húngaros, os alemães não entraram em campo para defender. 

Com uma atitude ofensiva desde o apito inicial, a Alemanha aproveitou-se de um adversário que não tinha mudado o chip e que demorou muito a reagir. O desfecho foi um descontrolo pouco habitual desde que Fernando Santos lidera a selecção nacional. Nada, no entanto, que a história não justifique: neste século, Portugal foi sempre derrotado pelos alemães em fases finais - Mundial 2006 e 2014; Euro 2008, 2012 e 2020.

Reconhecido o falhanço de Munique, o treinador português prometeu mudanças no decisivo reencontro com a França, mas, mais do que se limitar a trocar apenas um par de jogadores, Santos mostrou que estava preparado para a estratégia francesa. De forma previsível, Deschamps procurou repetir a fórmula de sucesso que tinha utilizado na Liga das Nações, em Novembro de 2020, no Estádio da Luz, colocando Griezmann no meio, como o jogador do Barcelona gosta, nas costas de Benzema. Porém, desta vez, Portugal tinha o antídoto para o 4x2x3x1 francês.

Mesmo com alguns desequilíbrios provocados na defesa portuguesa pela velocidade e talento de Mbappé, Griezmann quase desapareceu, no Puskas Arena, sempre que entrou no triângulo formado por Danilo (Palhinha na segunda parte), Moutinho e Renato Sanches. Com o seu joker neutralizado, a França, a quem interessava ganhar para ficar a salvo de uma viagem a Wembley para defrontar a Inglaterra, mostrou-se retraída e pouco autoritária, revelando conforto por estar a empatar com Portugal. 

Garantida a sobrevivência num grupo tremendamente exigente, a selecção portuguesa segue para a fase a eliminar com mais soluções a meio-campo (Sanches, Moutinho e Palhinha aproveitaram a oportunidade em Budapeste), mas na defesa a condição física de Nelson Semedo parece estar “por arames” e, no ataque, Bernardo Silva e Diogo Jota continuam longe do seu melhor nível. 

Há, no entanto, um Cristiano Ronaldo vintage. Com os cinco golos que marcou no Euro 2020, o capitão português já igualou Ali Daei e no domingo, em Sevilha, contra a Bélgica, motivação não faltará a Ronaldo para chegar ao 110.º golo por Portugal e tornar-se no melhor marcador de sempre de selecções. Ele, que marcou 48 golos nos últimos 45 jogos com a camisola da selecção.

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