Halterofilista Laurel Hubbard será a primeira atleta transgénero nos Jogos Olímpicos

A neozelandesa classificou-se na categoria acima de 87kg (super pesadas) do levantamento de peso. Laurel Hubbard já tinha competido em provas de levantamento de peso masculino antes da transição em 2013, com 35 anos.

Foto
Laurel Hubbard, atleta neozelandesa, será a primeira mulher trans a competir nos Jogos Olímpicos Reuters/PAUL CHILDS

A halterofilista Laurel Hubbard vai ser a primeira mulher transgénero a competir nos Jogos Olímpicos, depois de ter sido convocada esta segunda-feira pela Nova Zelândia para os Jogos de Tóquio 2020, adiados para este Verão.

Hubbard, de 43 anos, será também a halterofilista mais velha em prova, chegando ao ponto mais alto de uma carreira que inclui uma medalha de prata nos Mundiais de 2017 e o ouro nos Jogos do Pacífico de 2019. 

A neozelandesa classificou-se na categoria acima de 87kg feminina (super pesadas) do levantamento de peso. Hubbard já tinha competido em provas de levantamento de peso antes da transição em 2013, com 35 anos, mas nas provas masculinas.

“Estou agradecida e sensibilizada pela generosidade e apoio que recebi de tantos neozelandeses. Quando parti o braço há três anos, aconselharam-me a parar a carreira desportiva. (...) Os últimos 18 meses mostraram-nos a todos que há força na irmandade, na comunidade, e em trabalhar em conjunto para um objectivo comum”, declarou a atleta, citada em comunicado oficial do Comité Olímpico da Nova Zelândia (NZOC), esta segunda-feira.

A líder do NZOC, Kereyn Smith, considerou a presença de Hubbard como “um momento histórico para o desporto e para a selecção neozelandesa. É a nossa primeira atleta olímpica que fez a transição de homem para mulher”, disse aos jornalistas.

“Reconhecemos que a identidade de género no desporto é uma questão altamente sensível e complexa e que requer um equilíbrio entre os direitos humanos e a justiça no jogo”, expressou, salientando que a atleta preenche os requisitos necessários para participar na prova.

Hubbard tornou-se elegível para competir nos Jogos Olímpicos desde 2015, quando o Comité Olímpico Internacional (COI) emitiu directrizes que permitem a qualquer atleta transgénero competir como mulher, desde que os seus níveis de testosterona estejam abaixo de dez nanomoles por litro por pelo menos um ano antes da primeira competição.

Também o governo neozelandês se pronunciou, expressando o apoio à atleta. “A Laurel é um membro da equipa olímpica da Nova Zelândia. Estamos orgulhosos dela, como estamos de todos os nossos atletas”, disse o ministro do Desporto, Grant Robertson, em comunicado.

Justiça desportiva no centro de debate

O levantamento do peso fica assim centro do debate sobre a participação de atletas transgénero nos Jogos, nomeadamente nas competições de mulheres, e a presença de Hubbard em Tóquio pode gerar divisões.

Alguns cientistas defendem que as directrizes do Comité pouco fazem para mitigar as vantagens biológicas das pessoas trans que passaram pela puberdade como homens. Por outro lado, os activistas transgénero argumentam que o processo de transição diminui essa vantagem consideravelmente e que as diferenças físicas entre atletas significam que nunca existe uma competição verdadeiramente nivelada.

O grupo de pressão Save Women's Sports Australasia argumenta que a selecção da atleta só é possível devido a “uma política falhada do COI”. “Os homens têm uma vantagem de desempenho baseada no sexo biológico”, sustentou a co-fundadora do grupo, Katherine Deves, em declarações à Reuters. “Eles superam-nos em todas as métricas — velocidade, resistência, força. Escolher testosterona é uma pista falsa... Estamos a esquecer a anatomia, o músculo rápido e rico, os órgãos maiores.”

O COI tem afirmado consistentemente que está comprometido com a inclusão. Porém, a organização está também a rever as directrizes de forma a ter em consideração a “tensão percebida entre justiça/segurança e inclusão/não discriminação”.

A medalha de ouro de Hubbard nos Jogos do Pacífico 2019 em Samoa (Oceânia), onde liderou o pódio à frente da campeã dos Jogos da Commonwealth em Samoa, Feagaiga Stowers, fez crescer a indignação no país anfitrião.

Já a halterofilista belga Anna Vanbellinghen disse no mês passado que permitir que Hubbard competisse em Tóquio era injusto para as mulheres e “como que uma piada de mau gosto”.

A ex-halterofilista neozelandesa Tracey Lambrechs disse que teve de dar o lugar na categoria de super pesadas nos Jogos da Commonwealth a Hubbard. "Quando me disseram para abandonar a categoria porque a Laurel obviamente seria a super número um, foi de partir o coração”, disse a atleta olímpica à TVNZ.

“É uma pena que alguma mulher, em algum lugar, diga: ‘Bem, vou perder a oportunidade de ir aos Jogos Olímpicos, de realizar meu sonho, de representar meu país porque uma atleta transgénero pode competir.”

Outra atleta transgénero, Chelsea Wolfe, na modalidade BMX, irá até Tóquio na equipa dos Estados Unidos, mas está como suplente e poderá não chegar a competir.

Sugerir correcção
Ler 13 comentários