A obra de Rogério Azevedo que marcou o Porto não se esgota numa garagem

A Garagem d’ O Comércio do Porto talvez seja a obra mais famosa do arquitecto portuense (1898-1983), mas Ana Alves Costa foi procurar traços de coerência na diversidade do seu trabalho e reuniu-os em livro.

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Garagem do Comércio do Porto Nelson Garrido

É impossível “tirar” Rogério Azevedo da garagem d’O Comércio do Porto. O seu rasgo modernista que pontua a esquina da Rua de Elísio de Melo com a Rua do Almada, na Praça Filipa de Lencastre, não escapa a olhos mais atentos à arquitectura daquele lugar. Mas nem é preciso um carro para, com meia dúzia de passos, ali em volta dos Aliados, perceber a diversidade do seu trabalho. No décimo aniversário da classificação da garagem mais famosa do Porto como imóvel de interesse público, o actual concessionário deste equipamento edita a investigação de Ana Alves Costa sobre um arquitecto que marcou o século XX, na cidade e não só. 

"Projecto e circunstância. A coerência na diversidade na obra de Rogério de Azevedo”, a tese de doutoramento, de 2013, da Arquitecta Ana Alves Costa, professora da FAUP – Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, ganha forma de livro numa edição da Fundação Marques da Silva e Edições Afrontamento. A apresentação decorre esta segunda-feira, às 17h, mas para este aniversário a Saba conta também com uma exposição de carros clássicos dos anos trinta, época de inauguração da garagem, promovida pelo ACP Clássicos. 

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Em simultâneo, é inaugurada também uma exposição de plantas e fotografias desta obra de Rogério de Azevedo e de capas do jornal O Comércio do Porto. Um diário que vivia então tempos áureos – viria a ser encerrado em 2005 – e cujo dono, Bento Carqueja, encomendara já ao arquitecto a nova sede da empresa, ali ao lado, com porta para os Aliados. Uma obra muito distinta, na qual são notórias as influências Beaux Arts que Azevedo aprendera nas Belas Artes do Porto com Marques da Silva, seu professor, com quem estagiou, ainda. Esta exposição é organizada pela empresa municipal de Cultura do Porto, a Ágora.

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Rogério de Azevedo, que começara a frequentar o curso de arquitectura aos 14 anos, exercitou múltiplas influências, mais clássicas e tradicionais, num longo acervo de obras projectadas principalmente no Norte do País. Naquela mesma praça da garagem, quase década e meia separam este edifício, aparentemente dissonante, do Hotel Infante de Sagres. O país mudara. O trabalho de Rogério de Azevedo também, como já se percebera no Casino da Póvoa de Varzim, no Grande Hotel desta cidade, nas escolas primárias do Plano dos Centenários, nas pousadas de Portugal que desenhou, ou noutras obras dessas décadas seguintes

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“A diversidade na obra de Rogério de Azevedo é, claramente, traduzida, antes de mais, pelas diferentes expressões formais e plásticas visíveis nos edifícios que projecta. Deste ponto de vista, podemos constatar o eclectismo do autor no conjunto de trabalhos que assina”, assinala Ana Alves Costa na sua tese. “A razão que determina a escolha não se explica (...) com base numa lógica sequencial cronológica, mas, sim, por factores variáveis como o lugar, o programa, o cliente, ou, até, condicionamentos gerados no processo de aprovação dos projectos.”

A autora recorda, por exemplo, a relação que parece estabelecer com o Hospital de Santo António quando utiliza referências dos modelos clássicos no exterior do edifício que propõe para a Faculdade de Medicina do Porto ou, ao contrário, a “imagem de grande modernidade que desenvolve no edifício da Garagem do Comércio, quando confrontado com um programa estimulante e um cliente que o liberta de condicionantes”.

Por isso, argumenta, “o problema da coerência de cada obra não decorre da sua expressão formal, já que esta vai variando no caso a caso de cada situação. A coerência na diversidade da obra de Rogério de Azevedo resulta da qualidade particular de cada projecto numa correcta interpretação das circunstâncias que normalmente o condicionam”.

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A iniciativa desta segunda-feira é um bom motivo para conhecer melhor ou recordar o trabalho deste arquitecto nascido nesta altura do ano, a um 25 de Junho, há 123 anos. As obras de renovação realizadas pela Saba na garagem estão prontas, “com destaque para a sinalética que recuperou o néon vertical e pela colocação da identificação da Garagem Comércio do Porto na fachada”, explica a empresa que explora este equipamento.

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