Senador chama Bolsonaro a depor na CPI sobre a covid-19

É improvável que um Presidente em funções venha a testemunhar perante uma comissão parlamentar. Foram também convocados vários governadores.

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Um senador chamou Bolsonaro a depor perante a CPI sobre a pandemia Jose Jacome / EPA

Um dos senadores que integra a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a conduta do Governo federal brasileiro na gestão da pandemia apresentou um pedido formal para que o Presidente Jair Bolsonaro seja chamado a depor. É, porém, muito difícil que o chefe de Estado venha a comparecer.

Numa sessão muito conturbada, como tem sido hábito desde o início dos trabalhos da CPI, esta quarta-feira, o senador oposicionista Randolfe Rodrigues apresentou um pedido para que Bolsonaro seja chamado a depor perante a comissão. O pedido foi feito durante uma reunião à porta fechada em que os senadores compunham uma nova lista de testemunhas para serem convocadas nas próximas semanas.

Quando a sessão foi retomada, o ambiente era tenso e houve uma troca azeda entre Rodrigues e o senador pró-governamental Marcos Rogério, que disse que a CPI se estava a tornar num “Tribunal de Nuremberga”. Rodrigues justificou a chamada de Bolsonaro pela abertura de “um precedente” com a convocatória de vários governadores e autarcas acordada entre os membros da CPI.

A chamada de Bolsonaro não foi votada esta quarta-feira e, mesmo que venha a ser aprovada pela maioria dos senadores da comissão, é improvável que o Presidente compareça. A possibilidade de se convocar o chefe do poder executivo por uma comissão parlamentar é uma matéria muito controversa no meio jurídico brasileiro.

Alguns juristas consideram que Bolsonaro poderia contestar judicialmente a convocatória, alegando uma violação do princípio da separação de poderes. No máximo, aquilo que estaria ao alcance dos poderes da CPI seria convidar o Presidente a comparecer, e não intimá-lo.

O que mereceu aprovação dos senadores foi a chamada de nove governadores estaduais e de um ex-titular, Wilson Witzel, do Rio de Janeiro, e novas convocatórias do ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, e do actual, Marcelo Queiroga.

A inclusão dos governadores no rol de testemunhas junto da CPI acaba por constituir uma vitória para Bolsonaro, que desde o início das investigações vinha pedindo que fossem averiguados alegados desvios de financiamento público nos estados. A presença dos governadores na comissão também vai retirar o Presidente brasileiro do centro das atenções.

“Capitã cloroquina”

As primeiras semanas da CPI ficaram marcadas pelos depoimentos dos antigos ministros da Saúde. Na semana passada, Pazuello, que esteve dez meses à frente da pasta, esteve em duas sessões em que protegeu Bolsonaro de qualquer possível conduta negligente na gestão do combate à pandemia.

Esta terça-feira, foi a vez de se ouvir o testemunho da ex-secretária do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, apelidada pela imprensa brasileira de “capitã cloroquina” por causa da defesa acérrima deste medicamento como tratamento contra a covid-19. Aos senadores, a médica voltou a defender a prescrição do medicamento, apesar de vários estudos científicos terem concluído não ter eficácia para tratar doentes com covid-19.

Pinheiro admitiu que o Ministério da Saúde forneceu orientações a médicos de todo o país para que a hidroxicloroquina fosse prescrita como tratamento contra a covid-19 e lamentou que a sua utilização não tivesse sido mais amplamente promovida. As declarações da ex-secretária ministerial levaram a Sociedade Brasileira de Infectologia a emitir um comunicado em que reforçava a sua posição e lembrava que os medicamentos referidos “têm a sua ineficácia comprovada para o tratamento da covid-19”.

Mayra Pinheiro também ofereceu versões diferentes sobre o papel do Ministério da Saúde durante o colapso do fornecimento de oxigénio hospitalar em Manaus, no início do ano, contradizendo Pazuello – ambos estão a ser investigados por suspeita de negligência na assistência ao estado do Amazonas. A ex-secretária disse que Pazuello teve conhecimento da escassez de botijas de oxigénio a 8 de Janeiro, e não dia 10, como disse o ex-ministro à CPI.

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