A casa que Coltrane construiu

Impulse!, editora histórica norte-americana, foi um abrigo para muito do jazz mais ousado e seminal da década de 1960. A ela ficou ligado, para sempre, John Coltrane. Agora, que comemora os 60 anos à sombra do movimento Black Lives Matter, a história é retomada.

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Em Dezembro de 1963, num episódio do programa televisivo Jazz Casual, na National Educational Television, John Coltrane e o seu mítico quarteto estreavam um tema de uma intensidade e uma densidade emocional difíceis de qualificar — até para aqueles quatro que, juntos, nada faziam aquém do prodigioso. Era música que parecia chorar a cada compasso, cada nota de Coltrane num copioso lamento em andamento fúnebre, piano, contrabaixo e bateria pesarosos, lentos, arrancando depois para uma pequena aceleração que nem por isso se permitia transportar qualquer luz. Não era um tema de raiva, mas de dor colectiva, baptizado Alabama e inspirado por um discurso de Martin Luther King, o saxofone a farejar a inflexões e os maneirismos da voz do pastor e activista. Não se tratava, no entanto, do famoso discurso em que King anunciava o seu sonho de igualdade, mas antes um outro, menos disseminado e proferido numa igreja do Alabama onde, três dias antes, quatro membros do Ku Klux Klan tinham deflagrado uma série de barras de dinamite. A explosão na escadaria desse lugar de devoção havia de ceifar a vida de quatro raparigas e ferir dezenas. Alabama, a composição de Coltrane, só surgiria em disco alguns meses mais tarde, no álbum Live at Birdland, a tempo ainda de se tornar um dos mais emblemáticos hinos associados ao movimento dos Direitos Civis norte-americanos.

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