“Novo arranque geral da sociedade” pode acontecer em Setembro, diz Costa

Em entrevista ao JN, TSF e DN, António Costa afirma que Portugal está “numa fase de viragem”, mas diz não acreditar que este ano “o turismo seja uma grande alavanca da recuperação económica”. O primeiro-ministro mostra-se ainda confiante na negociação do próximo Orçamento do Estado e afasta um cenário de crise política. “Crise política só num grau de insanidade total.”

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“Crise política só num grau de insanidade total”, diz António Costa RODRIGO ANTUNES/LUSA

O primeiro-ministro, António Costa, acredita que o “novo arranque geral da sociedade” pode acontecer em Setembro, caso o novo coronavírus não traga “novas surpresas”. Em entrevista ao Jornal de Notícias, à TSF e ao Diário de Notícias, António Costa mostrou-se optimista quanto ao futuro da pandemia de covid-19 em Portugal, afirmando que “já sabemos que há luz do outro lado do túnel”.

“Estamos numa fase em que temos conseguido manter a pandemia controlada, não obstante já termos concluído as diversas fases de desconfinamento. Temos o processo de vacinação a ganhar uma tracção crescente. E temos, por outro lado, o plano de recuperação económica entregue em Bruxelas, e contamos que ele possa ser aprovado ainda na presidência portuguesa. Portanto, estamos aqui numa fase de viragem. Eu diria que o Verão completará essa viragem e, se não houver novas surpresas que o vírus nos provoque, podemos encarar a próxima reabertura do ano lectivo como um momento de novo arranque geral da sociedade”, afirmou.

Quanto ao plano de vacinação, António Costa destacou que este “prevê que até ao final do Verão atinjamos os 70% da imunidade de grupo” e que “há cenários mais optimistas que nos permitem admitir que consigamos chegar lá mais cedo”. Porém, alertou que “estamos hoje muito condicionados pelas vicissitudes que existem na produção e na distribuição de vacinas”.

O primeiro-ministro notou ainda que “no final desta semana conseguimos atingir a cobertura de toda a população com mais de 70 anos e no final do próximo mês atingiremos toda a população com mais de 60 anos”, o que permite “encarar com outra confiança os riscos subsequentes, designadamente a multiplicação das novas variantes que vão estar sempre a surgir”. “Esta é uma luta entre a velocidade da vacinação e a capacidade do risco de se ir multiplicando e fugindo à imunização que a vacina assegura”, explicou.

Turismo não será este ano “grande alavanca” da recuperação económica

Porém, António Costa mostrou-se menos optimista quanto à recuperação de sectores como o do turismo em Portugal. “Não acredito que este ano o turismo seja uma grande alavanca da recuperação económica. Em segundo lugar, as alavancas que temos previstas para a recuperação são as que estão no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e que passam, aliás, por outras actividades que não propriamente o turismo. Agora, o turismo é uma componente essencial da nossa base económica”, disse, destacando o peso que o turismo tem para a indústria do agro-alimentar.

Sobre o turismo a nível mundial, o primeiro-ministro foi ainda mais claro: “Eu acho que não haverá a normalização do turismo à escala global seguramente antes de 2022/2023. Vai ser uma retoma progressiva, as pessoas vão ter ainda receios, pois o nível de vacinação não é o mesmo em todas as zonas do mundo.” Contudo, deixou um sinal de esperança ao sublinhar que “um país que foi três anos consecutivos considerado o melhor destino turístico do mundo, só tem razão para estar confiante”.

Relativamente ao fim do estado de emergência, o primeiro-ministro assegurou que as medidas têm sido adequadas à gravidade da pandemia e que “o que tornou desnecessário manter o estado de emergência foi o entendimento de que nesta fase da pandemia as medidas mais constringentes e que poderiam não estar cobertas pela Lei de Bases da Protecção Civil e pela Lei de Saúde Pública já não eram necessárias”. Porém, explicou que medidas como a proibição da circulação entre concelhos ou a imposição de cercas sanitárias “são possíveis de implementar com base no quadro legislativo que está em vigor”.

António Costa alertou ainda para a possibilidade de surgir uma nova variante do SARS-CoV-2 que “nos surpreenda”, pelo que admite “puxar o travão de mão”, “tão pontualmente quanto possível, mas sempre que necessário”.

Quanto ao teletrabalho obrigatório até ao final do ano, disse esperar que a apreciação desta norma no Parlamento não ponha em causa a sua adopção “porque temos de manter uma regra fundamental que é diminuir o máximo possível a circulação e os contactos”.

Questionado sobre o êxito do processo de vacinação e aquisição de vacinas na União Europeia, o primeiro-ministro salientou que “se não tivesse havido a compra conjunta por parte da Comissão, hoje as dificuldades que estamos a viver estariam multiplicadas por 27” e que esta compra foi “uma grande garantia” para países pequenos e de média dimensão como Portugal. “Não podemos comparar o que aconteceu na Europa com o que aconteceu noutros países, porque os Estados Unidos e o Reino Unido, por exemplo, proibiram as exportações, e a Europa continua a exportar, designadamente a fornecer o mecanismo COVAX que é o que assegura o abastecimento de vacinas aos países em desenvolvimento”, explicou.

Orçamento rectificativo “continua a não estar no calendário"

António Costa afirmou ainda que “continua a não estar no calendário” submeter ao Parlamento um orçamento rectificativo. “No ano passado foi, como é sabido, porque o Orçamento do Estado que foi aprovado para 2020 não tinha este factor covid previsto. Este Orçamento para 2021 já foi preparado para um cenário covid. O primeiro trimestre consumiu muito dos recursos que estavam previstos no Orçamento, mas felizmente tudo se encaminha para que não vamos necessitar de mobilizar no resto do ano outros recursos”, explicou.

Sobre os apoios às empresas, Costa referiu que a estimativa aponta que “no ano passado houve uma quebra de 15 mil milhões de euros no produto, e o conjunto dos apoios concedidos às famílias e às empresas excedeu os 22 mil milhões de euros, ou seja, foi um apoio superior àquilo que foi a quebra do produto”. “Isto significa que temos mobilizado todos os recursos que nos são possíveis”, concluiu, destacando, porém, que Portugal não é um país rico e não tem “a capacidade de dar os apoios que um país como a Alemanha tem”.

Questionado sobre a possibilidade de a decisão do Tribunal Constitucional sobre os diplomas dos apoios sociais não ser favorável ao Governo e a eventual criação de precedentes de coligações negativas com efeitos orçamentais, Costa explicou que “o problema é uma questão de equilíbrio da separação de poderes entre a Assembleia da República e o Governo” e que “a existência da lei travão assegura a possibilidade de termos governos minoritários em Portugal”. O primeiro-ministro disse ainda que “ficaria muito surpreendido se a decisão não fosse favorável porque a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem sido muito clara sobre essa matéria, e este é um caso claríssimo onde há uma violação da lei travão”.

"Crise política só num grau de insanidade total"

António Costa mostrou-se ainda confiante na negociação do próximo Orçamento do Estado, afirmando que não receia uma crise política. “A única coisa que eu receio é mesmo o que possa acontecer com as variantes da covid”, colmatou, afirmando que, perante uma pandemia e “a maior crise económica que o país enfrentou nas últimas décadas”, “crise política só num grau de insanidade total”. O primeiro-ministro revelou, portanto, confiar na disponibilidade do PCP e do Bloco de Esquerda para negociar o próximo Orçamento do Estado, até porque “nem os divórcios às vezes são irreversíveis”.

“As melhores previsões económicas dizem que só em 2022 poderemos voltar ao ponto em que estávamos em 2019, ou seja, três anos atrasados. Portanto, há muito trabalho para fazer e muito pouco tempo para nos dedicarmos a crises políticas”, afirmou.

Sobre a relação com o Presidente da República depois do desentendimento sobre os diplomas dos apoios sociais, António Costa garantiu que não há nada para “normalizar” e que “a divergência, aliás, não é entre o Governo e o presidente da República, é entre o Governo e a Assembleia da República”.

Por fim, o primeiro-ministro não se mostrou receptivo à ideia de renovar algumas pastas após o Verão. “Essa ideia de que muda-se ministras e ministros e todos os problemas se resolvem, francamente não faz sentido. Eu orgulho-me muito de que um dos factores de estabilidade deste Governo seja traduzido também na durabilidade dos seus membros”, concluiu António Costa.

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