PS remete despesas com teletrabalho para acordo entre trabalhador e empregador

Proposta do PS prevê que iniciativa do teletrabalho pode partir tanto do trabalhador com do empregador. Mas no caso de partir do trabalhador, a empresa será obrigada a justificar por escrito a recusa. Direito a desligar também será tratado por acordo.

Foto
Ana Catarina Mendes, líder parlamentar do PS, apresentou a proposta dos socialistas para o teletrabalho Nuno Ferreira Santos

O PS apresentou nesta sexta-feira a sua proposta para regulamentar o teletrabalho em Portugal, deixando para o acordo entre trabalhador e empregador, ou para a negociação colectiva, a polémica questão sobre o cálculo das despesas com o teletrabalho.

Os socialistas optaram por entregar no Parlamento um projecto de lei complementar ao Código do Trabalho, que foi apresentado em conferência de imprensa pela presidente do grupo parlamentar do PS, Ana Catarina Mendes, ao contrário do que fizeram o Bloco de Esquerda, o PCP e o PEV que propõem alterações à legislação laboral em vigor.

A proposta socialista prevê que o regime de teletrabalho dependa sempre de acordo escrito (que pode constar do contrato de trabalho inicial ou ser autónomo em relação a ele) e é aí que se deve especificar se os equipamentos e sistemas necessários à realização do trabalho e à interacção entre trabalhador e empregador são fornecidos directamente ou adquiridos pelo trabalhador.

A proposta estipula que “todas as despesas adicionais que, comprovadamente, e com o acordo do empregador, o trabalhador suporte como directa consequência da aquisição ou do uso dos equipamentos e sistemas informáticos ou telemáticos na realização do trabalho, incluindo os acréscimos de custos de energia e da rede instalada no local de trabalho em condições de velocidade compatível com as necessidades de comunicação de serviço, assim como os de manutenção dos mesmos equipamentos e sistemas, são compensadas pelo empregador”.

Já quanto ao cálculo da compensação a dar ao trabalhador, o PS remete essa questão para o acordo as partes ou para a contratação colectiva. “A compensação a que se refere o número anterior pode consistir numa importância certa, fixada no acordo de teletrabalho ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, e ajustável ao longo da vigência do acordo conforme a evolução comprovada das despesas adicionais”, lê-se na proposta que seguirá esta tarde para os parceiros sociais, como anunciou Ana Catarina Mendes.

“Não podemos obrigar ao pagamento do A ou do X, o que dizemos é que tem de haver acordo das partes para o teletrabalho”, justificou a líder parlamentar socialista.

“Não faz sentido legislar aqui o que tem de ser pago, excepto os equipamentos. Tudo o resto tem a ver com o que está no contrato e no acordo de teletrabalho”, acrescentou, frisando que “o legislador não deve impor”, mas “garantir condições de equidade entre todos e garantindo com isso que não há penalizações salariais”.

Também o direito a desligar é tratado pelo PS, remetendo-o para o acordo de implementação do teletrabalho.

Assim, estipula-se que, “com observância das regras legais, convencionais e da regulamentação interna do empregador, cabe ao trabalhador organizar os tempos de trabalho fora da disponibilidade obrigatória, do modo mais adequado à realização dos objectivos da actividade contratada”.

Além disso, o acordo de implementação do teletrabalho tem de fixar o horário dentro do qual o trabalhador terá o direito de desligar todos os sistemas de comunicação com o empregador, sem que possa daí resultar qualquer desvantagem ou sanção.

PEV e PCP querem empregador a pagar entre 200 e 220 euros mensais

Tanto o PCP como o PEV querem que o Código do Trabalho fixe o valor mínimo de despesas com o teletrabalho que deve ser pago pelo empregador. Os comunistas têm uma proposta que se traduz em cerca de 220 euros mensais, enquanto o PEV define um valor mensal próximo de 200 euros.

Na iniciativa legislativa que entregou no Parlamento a 26 de Março, o PCP propõe o pagamento de 10,97 euros por dia.

Nesse sentido, os comunistas propõem uma nova redacção do artigo 168.º do Código do Trabalho, que prevê que “os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação, economato e qualquer instrumento ou mobiliário eventualmente necessário, pertencem ao empregador e são por este cedidos, devendo ainda assegurar a instalação e manutenção dos mesmos e o pagamento das inerentes despesas”.

Ainda nesse artigo passa a ficar claro que a entidade empregadora assegura o pagamento do acréscimo de despesas [com o teletrabalho], nomeadamente, com os consumos de água, electricidade, internet e telefone cujo valor diário não poderá ser inferior ao correspondente a 2,5% do valor do Indexante dos Apoios Sociais, sem prejuízo da aplicação de disposições mais favoráveis ao trabalhador em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho”.

Caso a proposta venha a ser aprovada, significaria o pagamento de 10,97 euros por dia ao trabalhador, o que se traduziria em cerca de 220 euros mensais.

Na proposta passa a ficar expresso que em teletrabalho, o horário não se pode iniciar antes das 8h e terminar depois das 19h e a realização de trabalho suplementar tem de ser solicitado por escrito pela entidade empregadora.

Também o PEV quer que fique claro na lei o valor mínimo pago ao trabalhador. No projecto que entregou na quarta-feira, prevê-se que o acordo de teletrabalho deve identificar o valor a pagar ao trabalhador, mensalmente, pela entidade empregadora “a título de abono de ajudas de custo por conta do acréscimo de despesas realizadas ou a realizar, nomeadamente, com os consumos de água, electricidade, internet, telefone e comunicações em geral”.

E nesse sentido, o PEV estipula que o valro mínimo a pagar pela entidade empregadora deve corresponder a 1,5% do salário mínimo nacional, por cada dia de trabalho prestado. Isto traduz-se em 9,98 euros diários e cerca 200 euros mensais.

Em caso de necessidade de o trabalhador recorrer à utilização de espaço e serviços externos, tal como o coworking, a entidade empregadora deve pagar os valores inerentes à utilização do espaço e dos serviços em causa.

O PEV quer ainda que fique clara a periodicidade das deslocações presenciais do trabalhador às instalações da empresa, que deverão ocorrer, no mínimo, mensalmente, e estipula

Em relação ao tempo de trabalho, o PEV estipula que o horário não se pode iniciar antes das 8h e não pode terminar depois das 19h e findo o horário, a entidade empregadora só volta a estabelecer comunicação após o reinício do horário de trabalho.

Bloco de Esquerda deixa em aberto cálculo das despesas

O primeiro partido a apresentar propostas foi o Bloco de Esquerda. No caso específico das despesas com o teletrabalho, este partido deixa em aberto o modo como os custos devem ser calculados.

A proposta dos bloquistas pretende clarificar no Código do Trabalho o princípio de que é responsabilidade do empregador fornecer os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação necessários ao teletrabalho e que cabe à empresa o pagamento das despesas, “nomeadamente os custos fixos gerados pelo uso de telecomunicações, água, energia, incluindo climatização, e outros conexos com o exercício das funções”.

José Soeiro, deputado do Bloco, justifica esta opção lembrando que o contrato de teletrabalho deve indicar “o modo de instalação e manutenção dos instrumentos de trabalho e o modo de pagamento das inerentes despesas de consumo e de utilização”. Além disso, acrescenta, o cálculo das despesas e o modo de pagamento pode estar previsto em instrumentos de regulamentação colectiva, nos regulamentos das empresas ou por acordo entre as partes.

No projecto legislativo, o Bloco clarifica ainda os conceitos de “tempo de trabalho” e de “tempo de descanso”, passando a prever que “o período de descanso [do trabalhador] deve corresponder a um tempo de desconexão profissional”. A forma como isso se garante pode ser definido na contratação colectiva, sendo que a violação reiterada deste direito por parte do empregador pode constituir assédio.

Ao mesmo tempo que os partidos apresentam propostas para alterar as normais relativas ao teletrabalho previstas no Código do Trabalho, está em curso o processo de apreciação parlamentar do diploma do Governo que estende a obrigatoriedade do teletrabalho até ao fim deste ano, num regime semelhante ao que vigorou até meados de Janeiro e que dependia do avanço da pandemia nos concelhos do país.

O PSD primeiro, e o PCP logo a seguir, pediram a apreciação parlamentar do decreto-lei.

Sugerir correcção
Ler 10 comentários