Nos Açores, Em Busca do Sol: “A covid-19 roubou-me a liberdade, mas não a esperança”

O cantautor açoriano Luís Alberto Bettencourt lança esta sexta-feira o seu 11.º álbum a solo, Em Busca do Sol, criado num “tempo de cativeiro”, mas sem perder a esperança no futuro.

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Luís Alberto Bettencourt PAULO MEDEIROS

Foi nascendo aos poucos. E sendo divulgado aos poucos, também. Em Busca do Sol, o mais recente álbum do cantautor açoriano Luís Alberto Bettencourt nasceu durante a pandemia e foi durante o confinamento por ela ditado que foi vendo, aos poucos, a luz do dia, em singles. O primeiro, Não leves a mal, foi publicado em Julho de 2020 e o mais recente, Chá de alecrim, em Janeiro de 2021. Agora chegou a vez do álbum, Em Busca do Sol, o seu 11.º em nome próprio, chegar às plataformas digitais e também em CD, esta sexta-feira.

“Neste espaço de cativeiro, tenho vindo a apresentar faixa por faixa”, diz ao PÚBLICO Luís Alberto Bettencourt. Nascido em Ponta Delgada, no dia 22 de Fevereiro de 1948, além de cantautor e compositor tem também trabalhado nos Açores como operador de câmara, com Zeca Medeiros, para várias séries que este realizou para a RTP. A solo, até Em Busca do Sol, tinha já dez álbuns gravados: Há Qualquer Coisa (1982), No Vapor da Madrugada (1986), Chuva dos Meus Sentidos (1987), Cruzeiro (1992), Contemplações (1997), Há Qualquer Coisa (2000), D’Azul e Negro (2003), O Silêncio das Horas (2007), Perfume das Ilhas (2010) e Acústico (2015). Isto além de uma colectânea de canções, em CD duplo (2017).

Electismo, cansaço e memórias

O disco, nas suas nove canções, confirma o electismo do autor, misturando rock (em Não leves a mal) bossa nova (em Jobim), fado e morna (Amores sofridos) e até xote brasileiro (Ultramar). “Como cantautor e compositor sou um bocadinho ecléctico. Posso passar pelo rock, pela bossa nova, é assim que fico tranquilo com a minha maneira de ser. Durante este espaço de cativeiro tive oportunidade de reflectir – mas sem desânimo, porque o desânimo é o cansaço da alma – e fazer uma abordagem à minha própria consciência, analisar o que é que me apetecia fazer. E fui compondo música por música, sem a preocupação estética de ser fiel a determinada corrente.”

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Não leves a mal, a abrir, diz: “Deixa-me só, não quero barulho, preciso pensar. Já não quero ouvir notícias do mercado financeiro”. Para Luís Bettencourt foi a forma certa de começar: “O resultado deste tempo de cativeiro reflecte todo este cansaço e esta incógnita, a redescobrir ou pensar um futuro não muito sombrio. A covid-19 roubou-me a liberdade, mas não a esperança”. Já Ultramar, o último tema do disco, ecoa os tempos em que esteve na Guiné-Bissau, como militar (1970-72): “São raízes que vão germinando e ficam. A minha passagem pela Guiné foi de obrigação, mas curiosamente tive tempo para aí desempenhar a minha função de músico. Fiz muitos amigos e ainda tenho uma saudade afectiva dos bons tempos que lá passei, mas dos maus tempos não. Por isso é que essas raízes ficam eternamente cá dentro: do bom e do mau.”

Mais pontes, menos fronteiras

Ainda assim, a temática do amor é a que marca maior presença nas suas canções. E este disco não foge à regra: “É a temática com que mais me identifico, em termos de composição. Quando se parte para a construção de uma música, a temática abordada pode ser uma cidade, uma ilha ou a desigualdade social, que também muito me preocupa, mas é no amor que encontro o bálsamo para escrever. Por isso é natural que a maior parte das minhas canções sejam fotografias da alma relacionadas com o amor. É o único calmante sem efeitos colaterais. E vale a pena retratá-lo, porque cada vez necessitamos de construir mais pontes e menos fronteiras.”

Para este disco, Luís Alberto Bettencourt (voz e guitarras) contou com os músicos Paulo Bettencourt (guitarras e cavaquinho), Eduardo Botelho (baixo, guitarras e produção), Mário Raposo (teclas), Cristovão Ferreira (teclas) e Ruben Torres (cavaquinho brasileiro). E ainda com duas vozes convidadas: Marisa Oliveira (Em busca do sol) e Cacau Cruz (Labirinto). Marisa Oliveira é açoriana como ele. Natural de Bretanha, concelho de Ponta Delgada, na Ilha de São Miguel, tem 31 anos, é vocalista da banda The Code e participou no programa The Voice Portugal em 2019. Quanto a Cacau Cruz, Luís Bettencourt descobriu-a no espaço virtual: “É uma personagem muito engraçada. É uma brasileira que decidiu fazer a sua vida na Ilha Terceira. Além de cantora, está integrada num projecto de bossa nova em Angra do Heroísmo e tem desempenhado uma actividade cultural interessante no teatro e em áreas sociais.”

Agora que o álbum chega ao mercado, a sua apresentação ao vivo continua dependente das contingências da pandemia: “Os Açores estão praticamente limpos, com excepção da minha ilha, que é São Miguel. Já tive três concertos programados e adiados. O último que tinha era no Coliseu Micaelense, em Ponta Delgada, que é a maior sala de cá. Estava previsto para 17 de Abril e já foi novamente adiado. Tenho o concerto pronto a ser apresentado, mas pelo menos aqui na ilha estou à espera. Depois veremos nas outras ilhas e também no espaço nacional.”

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