Moçambique não descarta pedir apoio internacional para o combate ao terrorismo

O Presidente de Moçambique diz que está a avaliar a possibilidade de aceitar ajuda militar internacional, mas continua a preferir que não haja botas estrangeiras no terreno, por questões de soberania.

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Os refugiados de Cabo Delgado estão quase a atingir um milhão. LUÍS MIGUEL FONSECA/EPA

Moçambique está a ponderar recorrer ao auxílio militar internacional no combate aos grupos armados, revelou o Presidente Filipe Nyusi em comunicado à nação, nesta quarta-feira. 

“O nosso Governo já manifestou perante a comunidade internacional as necessidades para o combate ao terrorismo, e estas necessidades estão a ser avaliadas”, afirmou Nyusi, mas deixando claro que prefere que não haja um envolvimento militar internacional em nome do “sentido de soberania” do país.

Foi precisamente há duas semanas que a vila de Palma, na província nortenha de Cabo Delgado, foi atacada por grupos armados que dizimaram dezenas de pessoas e obrigaram milhares de outras a fugir. Aos deslocados o Presidente promete que “a situação é transitária” e que “juntos e unidos" acabarão por vencer “o terrorismo”.

Já diversos países têm oferecido o seu apoio militar para combater os insurgentes, mas até agora Moçambique não se mostrou aberto a aceitar as ofertas.

Em declarações à Lusa, o especialista em questões do extremismo islâmico em África, Bulama Bukarti, censurou a reticência do Presidente moçambicano em chamar a intervenção militar internacional e considera que estas forças já lá deveriam estar na linha da frente para conter a violência.

“É óbvio que o Governo moçambicano está a ter dificuldades para controlar a situação”, refere o analista, alertando para que quanto mais tempo o Governo demorar a reagir, maior é o perigo de os grupos continuarem a mobilizar apoiantes.

Se olharmos para este ataque [de Palma], eles atacaram bancos para roubar dinheiro e armazéns para roubar comida para tentar aumentar a capacidade”, aponta Bukarti. “Foi um ataque em três frentes, o que mostra a sofisticação e a crescente ameaça do grupo.”

É “urgente” a ajuda militar internacional de países vizinhos como a África do Sul, bem como dos EUA, para oferecer uma “ofensiva maciça e sustentada” que acabaria com os grupos armados “em três ou seis meses”, segundo o especialista. Como exemplo dá o combate ao Daesh em 2019 e subsequente eliminação do califado no norte da Síria e no Iraque, que contou com a colaboração exterior de países como os EUA e o Reino Unido.

No seu comunicado à nação, o Presidente moçambicano salientou os esforços de modernização e formação nas Forças de Defesa e Segurança nacionais de forma a colmatar a “falta de um investimento sólido” nas últimas décadas. Os esforços também incluem uma formação ética e moral para chamar os seus soldados à atenção de que têm uma “missão de protecção dos cidadãos”, porque “nenhuma vitória será alcançada sem total confiança e entreajuda com a população local”, frisou Felipe Nyusi.

A Amnistia Internacional pediu investigações sobre eventuais abusos de direitos humanos que têm vindo a ocorrer na região de Cabo Delgado. A crise humanitária já atingiu cerca de 700 mil pessoas no total, desde que o conflito começou há três anos e do qual os membros das forças governamentais não saem inocentes.

Pedro Neto, director executivo da AI em Portugal, acusa o Governo moçambicano de tentar encobrir as violações dos direitos humanos. “Nós estávamos no terreno, sofremos ameaças, os jornalistas foram presos em Cabo Delgado por causa de denunciarem a situação, o próprio bispo, Luiz Fernando Lisboa, que era o bispo de Pemba teve de sair há alguns meses de Pemba, não por sua vontade, mas porque foi ameaçado de morte inúmeras vezes.”

“As violações dos direitos humanos não são nem serão toleradas em Moçambique”, afirmou Nyusi, acrescentando que as denúncias “serão investigadas exaustivamente e serão tomadas medidas adequadas”.

O Presidente ressaltou, ainda, que o combate ao terrorismo não se faz apenas através da mobilização militar. É necessário haver uma intervenção preventiva para agarrar os jovens que se sintam impulsionados para aderir aos grupos armados, por exemplo através da promoção de emprego.

Os grupos jihadistas voltaram a reivindicar o controlo de Palma na semana passada, mas o Presidente confirmou as já divulgadas declarações do Ministério da Defesa Nacional de que as Forças de Defesa e Segurança já se reapoderaram do controlo da vila.

A capital moçambicana vai receber, na quinta-feira, uma cimeira com os chefes de Estado da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral a fim de se definirem meios de prevenção e combate ao terrorismo.

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