O desafio do mundo do trabalho para os jovens

É penoso e exaustivo chegar ao final de um processo de recrutamento, composto por três ou quatro fases, dois meses de ansiedade, e ser rejeitado. Pior ainda é trilhar esse caminho, chegar à última entrevista e descobrir que o salário oferecido é o salário mínimo.

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Tim Gouw/Unsplash

Com o final da faculdade vem uma tarefa árdua: procurar trabalho. Isto requer um enorme esforço de procura de empresas, sociedades, aliar os nossos valores aos valores de um possível futuro empregador. Perpassa por processos de recrutamento longos, esgotantes, e fingir que está tudo perfeito na nossa vida, intuir que sempre quisemos trabalhar para aquela empresa em questão, sendo o corolário do nosso sonho de infância. 

O que acaba por ser penoso e exaustivo é chegar ao final de um processo de recrutamento, composto por três ou quatro fases, dois meses de ansiedade, e ser rejeitado. Pior ainda é trilhar esse caminho, chegar à última entrevista e descobrir que o salário oferecido é o salário mínimo. Por isso, saber ab initio o intervalo salarial ou o salário concreto pouparia, a qualquer candidato, muitos processos de recrutamento inúteis.

Actualmente, existe um manifesto aproveitamento das grandes empresas multinacionais dos estágios IEFP, nos quais os estagiários recebem menos de 1000 euros brutos, pagos pelo Estado, com o intuito de ajudar as pequenas e médias empresas. A finalidade intrínseca deste projecto foi desvirtuada porque quem recorre são as grandes entidades corporativas que se aproveitam de trabalhadores a um custo parco e precários.

Por outro lado, vivemos num mundo em que as empresas não divulgam os salários e, portanto, o salário para uma determinada vaga aberta é uma incógnita quando o candidato inicia o longo perorar do processo de recrutamento.

É importante analisar este tema do ponto de vista das partes intervenientes: o candidato ao trabalho e a entidade empregadora.

Em regra, quem estabelece as condições contratuais é a parte que oferece a oportunidade de trabalho, por esta razão existe uma debilidade contratual do trabalhador, desvalorizando a sua vontade no processo de formação do contrato. O contrato de trabalho é caracterizado pela disparidade originária das partes. Por esta razão, o empregador opta por não divulgar o salário a oferecer ao trabalho em questão.

Do ponto de vista do candidato ao trabalho, este inicia a relação pré-contratual em clara desvantagem, não tendo acesso a todas as informações. Portanto, uma pessoa que se candidate para uma vaga, e apenas no final do processo de recrutamento é apresentada a contraprestação concreta, correspondendo a um valor muito inferior ao expectável, uma frustração das expectativas salariais, ao candidato. Poderia, este, ter evitado perder o seu precioso tempo com um processo de recrutamento que, a priori, não cumpria os seus pré-requisitos. Torna-se um processo de recrutamento debalde.

Razão pela qual, quando saímos da faculdade e encetamos a procurar o primeiro trabalho, não temos noção do preço de mercado da nossa prestação. Na maioria dos casos, a entidade empregadora, aproveitando-se desta ingenuidade, coloca a pergunta sobre a nossa expectativa salarial. Por vezes, caímos no erro de dizer um número muito baixo ou um número demasiado elevado. Consequentemente, podemos conseguir o trabalho, mas o salário que obtemos é inferior ao salário médio de mercado para a posição e experiência do trabalhador, ou acabamos por não almejar o emprego.

Contudo, convém aflorar que subsiste uma vantagem para o trabalhador. O facto de o salário não ser divulgado aquando da candidatura é que lhe permite ter um leque mais vasto de oportunidades, conferindo ao candidato a hipótese de se interessar por empresas que de outra forma excluiria. Obviamente que o salário é relevante na escolha de um trabalho, mas não é tudo, e a empresa per si pode fascinar, cativar, motivar o trabalhador, independentemente do valor monetário que irá receber.

Do lado do empregador, a não divulgação do salário na oferta de emprego é-lhe vantajosa. Por um lado, não exclui candidatos, e pode agilizar e negociar o salário com o trabalhador concreto. Por outro lado, é uma estratégia negocial, colocando a entidade empregadora numa posição de vantagem face ao candidato. Ou seja, a entidade empregadora que à partida já tem todas as vantagens na relação contratual, ainda logra acentuar mais as divergências entre as partes.

Vem à colação referir que o empregador tem concomitantemente desvantagens com esta opção, uma vez que um processo de recrutamento requer esforço e dedicação de ambas as partes. Portanto, talvez fosse um valor acrescentado divulgar o salário na proposta laboral. Assim, quem se candidatasse estaria efectivamente interessado na oportunidade.

Neste enquadramento, temos uma situação de conflito de interesses, analisando os dois lados do espectro. Compensa ao empregador o sigilo na informação relativa ao salário, até ao final do processo de recrutamento, mas tal situação prejudica em muito o trabalhador, e ainda mais os jovens trabalhadores que culminam em entrar no mercado de trabalho.

No meu ponto de vista, estritamente pessoal, esta talvez seja uma questão a ponderar numa futura alteração legislativa do Código do Trabalho. Não estou a pugnar para se pôr em causa a liberdade do empregador, mas, ao invés, haver mais transparência entre as partes, evitar desigualdades entre trabalhadores. Seria vantajoso para o reequilíbrio das partes, o candidato ao trabalho ter acesso a um mínimo da expectativa salarial que a entidade empregadora está disposta a pagar.

Quiçá, nesta ótica, seria susceptível tornar o mercado de trabalho mais produtivo e competitivo. O salário, quer queiramos quer não, é o factor mais importante na escolha do posto de trabalho, e a sociedade não pode negar este facto e viver na utopia de que o trabalhador celebra o contrato de trabalho porque é o seu “sonho” onírico de trabalhar para aquela entidade empregadora. É irrealista, uma vez que só aceitando o trabalho e executando o trabalho, de forma exequível descobrimos a tramitação da empresa, em termos de concretizar ou não a nossa vocação ou frustração.

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