Nos apoios sociais, “o que está em causa é sobretudo o princípio”, avisa ministro das Finanças

João Leão mostra abertura para acomodar reforço dos apoios sociais no Orçamento mas está preocupado com precedente. Fernando Medina avança que António Costa fará esta quarta-feira “comunicação ao país” sobre o tema.

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João Leão, ministro das Finanças ANTóNIO PEDRO SANTOS/Lusa

O ministro de Estado e das Finanças disse terça-feira à noite que o envio para o Tribunal Constitucional dos diplomas promulgados pelo Presidente da República que reforçam os apoios sociais está “em ponderação” por parte do Governo. João Leão desdramatizou o impacto financeiro dos diplomas, mostrou abertura para os acomodar no Orçamento do Estado sem que seja necessário um rectificativo, pelo menos para já, mas avisou que o que está em causa é "sobretudo o princípio” que impede o Parlamento de interferir na execução orçamental. 

Questionado no programa Tudo é Economia, da RTP3, se o Governo vai enviar para o Tribunal Constitucional os diplomas aprovados por Belém, João Leão disse que a questão está “em ponderação”.

“O Governo está a avaliar qual é a decisão que vai tomar”, disse, depois de ter alertado que “estar a violar uma norma da Constituição e uma norma que serve para garantir a estabilidade financeira do país, em nosso entender é um precedente que pode ser muito grave”.

A questão do precedente será, aliás, aquela com que o Governo “estará mais preocupado em acautelar”, adiantou terça-feira à noite na TVI24 o socialista Fernando Medina, no seu espaço de comentário semanal, no qual adiantou que o primeiro-ministro fará esta quarta-feira uma “comunicação ao país sobre esta matéria”. 

No domingo, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, promulgou três diplomas aprovados pelo Parlamento de reforço de apoios no âmbito da pandemia por considerar que não existe uma violação indiscutível da Constituição e as medidas são urgentes – posição que contrariou frontalmente a interpretação do Governo.

“O que está aqui em causa não é tanto o impacto financeiro da medida, é sobretudo o princípio. Porque a Constituição é muito clara ao dizer que o parlamento não pode, durante a execução orçamental, aprovar medidas com impacto na despesa ou na receita”, disse o ministro das Finanças na RTP3.

João Leão vincou que a Constituição não especifica casos em que a medida em causa tenha “ou não enquadramento no Orçamento”, dizendo “de forma muito clara e taxativa” que tem uma aplicação geral.

“Esse é um entendimento não só seguido por muitos constitucionalistas mas também no Ministério das Finanças e nos serviços do Ministério das Finanças”, referiu.

Quanto ao impacto financeiro da medida, estimado em cerca de 40 milhões de euros mensais, João Leão disse que não será necessário elaborar um Orçamento Rectificativo por causa da aprovação das medidas.

“Vamos tentar enquadrar isso dentro do orçamento da Segurança Social que existe”, referiu, acrescentando que caso haja novos confinamentos a medida poderá ter um impacto duradouro nas contas públicas.

“Não antevemos para já a necessidade de fazer um Orçamento Rectificativo. Mas chamo à atenção que o mais importante aqui é a questão do precedente que é criado. As instituições do país são muito importantes, a sua Constituição é muito importante, e é com boas instituições que os países conseguem boas políticas e promover o seu crescimento”, concluiu João Leão.

Em relação à decisão do chefe de Estado de promulgar três diplomas aprovados apenas com a oposição do PS, o primeiro-ministro, António Costa, apontou na segunda-feira que “o senhor Presidente da República diz na sua mensagem que não há preto e branco, não há normas que violem a lei-travão e normas que não violem a lei-travão”.

“Diz expressamente que o Governo aplicará a lei na estrita medida do que está previsto no Orçamento. Ora, isso é algo bastante inovador do ponto de vista da ciência jurídica e o Governo tem o dever de meditar nesta mensagem antes de decidir o que fazer. Essa meditação terá o tempo que for necessário”, declarou.

“A mensagem é rica do ponto de vista de ser complexa, porque tem vários elementos e inovadora. É muito criativa, efectivamente”, acrescentou.

Em causa estão três diplomas: um alarga o universo e o âmbito dos apoios sociais previstos para trabalhadores independentes, gerentes e empresários em nome individual; outro aumenta os apoios para os pais em teletrabalho; e um terceiro que estende o âmbito das medidas excepcionais para os profissionais de saúde no âmbito da pandemia também à recuperação dos cuidados primários e hospitalares não relacionados com covid-19.

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