A dexametasona já salvou um milhão de vidas da covid-19 em todo o mundo

Esteróide barato, usado há décadas, reduz um terço o risco de morte para quem precisa de ser ligado a um ventilador mecânico e cerca de um quinto para os que precisam de oxigénio. Cálculos são feitos pelo Serviço Nacional de Saúde britânico.

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O medicamento pode ser administrado por via oral ou venosa YVES HERMAN/Reuters

A dexametasona, um medicamento esteróide barato, disponível há décadas, já salvou um milhão de vidas em todo o mundo desde que se descobriu, no ano passado, que é um tratamento eficaz para a covid-19.A contabilidade é feita pelo Serviço Nacional de Saúde (NHS, na sigla em inglês) britânico, que salienta o facto de a sua descoberta para este fim ter sido feita num estudo britânico e em 175 hospitais do Reino Unido.

Os cálculos são feitos com base num estudo publicado no mês passado na revista Nature Communications, que apontava para que cerca de 12 mil vidas tivessem sido salvas no Reino Unido entre Julho e Dezembro de 2020 – o que se traduziria em 650 mil vidas salvas em todo o mundo no mesmo período. Actualizados pelo NHS, esses números dão agora 22 mil vidas salvas no Reino Unido e cerca de um milhão globalmente.

Este medicamento, disponível como genérico, é usado há décadas para tratar doenças auto-imunes, como lúpus, formas graves de alergia, enjoos e inflamação ocular, segundo informação no site do NHS. O medicamento é ainda utilizado como anti-inflamatório.

Foi um dos incluídos no estudo RECOVERY, organizado por Peter Horby, um especialista em doenças infecciosas da Universidade de Oxford, e Martin Landray, professor de medicina e epidemiologia da mesma universidade. O objectivo do estudo é pegar em medicamentos já existentes, e com indicações para outros fins, e verificar como se comportam contra a covid-19.

Menos de 100 dias depois de o programa ter começado, a equipa obteve o resultado mais marcante, recordou Peter Horby em declarações ao Guardian. Na dexametasona os cientistas encontraram um medicamento que melhorava claramente as hipóteses de sobrevivência dos doentes mais graves, aqueles que têm de ser ligados a um ventilador invasivo – normalmente pessoas mais velhas, ou com comorbilidades como obesidade, por exemplo.

Nos pacientes entubados e ligados a um ventilador invasivo, 29% dos que foram tratados com dexametasona morreram passados 28 dias, relataram na revista médica New England Journal of Medicine. Mas isso foi um grande avanço, porque 41% dos que foram tratados da forma habitual até então, sem dexametasona, morreram.

As pessoas com covid-19 que tinham de receber oxigénio, embora sem serem ligadas a um ventilador, também beneficiam deste medicamento, ainda que os resultados não sejam tão espectaculares: morreram 26% dos que não usaram o medicamento, e 23% dos que tomaram dexametasona e houve uma redução de 20% da necessidade de ventilação, sumarizava a Agência Europeia do Medicamento (EMA) em Setembro do ano passado, no comunicado em que dava o seu apoio ao uso deste medicamento para tratar doentes graves de covid-19.

Porque é mesmo para doentes graves: não foi verificada nenhuma redução no risco de morte em pacientes que não precisavam de oxigénio ou de ventilação mecânica, frisava a EMA – e estes resultados foram posteriormente confirmados pela Organização Mundial da Saúde e outras entidades. Para os doentes ligados a ventiladores, a dexametasona cortava em um terço o risco de morte para as pessoas que precisam de ventilação mecânica, e cerca de um quinto para os que precisam de oxigénio.

Pode ser usada para pessoas a partir dos 12 anos, que pesem pelo menos 40 quilos, diz o Infarmed, por via oral ou por perfusão numa veia.

O estudo em que se baseiam estes cálculos frisa, no entanto, que para avaliar “o verdadeiro potencial da dexametasona na luta global contra a covid-19 é essencial fazer investigação clínica em locais com acesso limitado a oxigénio e/ou ventiladores, por exemplo em países de baixos/médios rendimentos”. Os cientistas avançam a hipótese de se fazerem estudos para verificar se o uso apenas da dexametasona, nesses países com fraco acesso a terapias de oxigénio, poderá trazer algum benefício.

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