Junta de Belém chama “fantasia urbanística” às novas torres do Restelo

Autarquia diz que a Câmara de Lisboa devia preocupar-se em reabilitar o seu património antes de construir mais.

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Perspectiva de como poderá ser o empreendimento. A arquitectura dos edifícios ainda não está definida CML/ESTÚDIO 18:25

A Junta de Freguesia de Belém emitiu um parecer preliminar sobre as novas torres do Restelo em que considera que o projecto é “uma completa descaracterização” do bairro e “uma fantasia urbanística que ninguém quer”. O parecer ainda não é definitivo e vai ser discutido numa reunião virtual na próxima segunda-feira.

Depois da sessão de apresentação do projecto no início desta semana, em que a Câmara de Lisboa procurou justificar porque optou pela construção em altura, a junta divulgou um parecer de sete páginas em que manifesta a sua discordância quanto aos usos, ao número de pisos, à densidade populacional e às alterações viárias propostas.

“Perante a gritante falta de equipamentos sociais na Freguesia de Belém, afigura-se como prioritário a construção nos terrenos em causa de berçários e creches, residências seniores com pendor comunitário, equipamentos desportivos ao ar livre, um corredor verde que ligue o Parque dos Moinhos de Santana a Monsanto, zona comercial”, lê-se na conclusão do parecer.

A junta, liderada por Fernando Ribeiro Rosa (PSD), diz que se a câmara “insistir na construção de edifícios de habitação” terá de haver várias alterações às duas operações de loteamento actualmente em discussão pública, como a redução do número de pisos, a inclusão de mais equipamentos sociais e comércio e a adequação do estacionamento às necessidades da zona.

O plano camarário é que em dois terrenos no Alto do Restelo sejam construídos 11 edifícios, cinco dos quais com 12 a 15 pisos à superfície, para a criação de 629 fogos de habitação, uma creche, um centro de convívio, um supermercado e um equipamento de ensino superior ainda não especificado. O projecto está a gerar muita inquietação aos moradores das redondezas, como ficou patente na sessão de segunda-feira.

No parecer, a junta começa por dizer que a câmara tem primeiro que cuidar do seu património imobiliário antes de construir novo. “Quando uma entidade pública como a CML propõe a construção de centenas de fogos novos, mantendo dezenas dos fogos dos quais é proprietária vazios ou em estado de ruína – ou, ainda pior, em estado absolutamente degradado mas ocupado com os seus inquilinos muitas vezes idosos ou sem voz – é algo incongruente e até imoral”, pode ler-se.

Quanto à proposta, a junta diz que a justificação dada pela câmara para a altura dos novos edifícios – a transição entre a Av. Ilha da Madeira e as Torres do Restelo – “não colhe” e que corresponde à perpetuação de um erro. “O excesso de pisos propostos é uma completa descaracterização da linha urbanística de todo o bairro onde se insere” e “fere, em toda a linha, as vistas seja de que perspectiva for”, diz a junta.

Além disso, a autarquia estima que “haverá um aumento populacional entre as 1271 e as 2542 pessoas”, contrariando o que disse o vereador do Urbanismo, segundo o qual seriam 950 a 1000 novos moradores. “Estamos a falar num aumento populacional que representa entre 7,7% e 19,3%, conforme os cenários de ocupação das habitações”, opina a junta, tendo por base os últimos Censos, de 2011, que apontavam para uma população de 16561 pessoas em Belém. “Uma completa transfiguração social, ainda para mais concentrada num único bairro.”

Por outro lado, a autarquia também critica a transformação da rotunda de S. Francisco Xavier em cruzamento e a criação de uma rotunda na Av. Dr. Mário Moutinho: “É criar problemas de tráfego onde eles não existem, agravando-os com os veículos de mais de 700 famílias.” A junta põe em causa o estudo de mobilidade e afirma que o estacionamento previsto não é suficiente, argumentando ainda que este é um território em “isolamento em relação ao resto da cidade” no que aos transportes públicos diz respeito.

O parecer, que foi divulgado na quarta-feira, estará em debate numa reunião via Zoom na próxima segunda-feira à noite, exactamente uma semana depois da sessão promovida pela câmara. Nessa ocasião, o vereador do Urbanismo afirmou ser sensível aos argumentos da população e mostrou-se disponível para integrar as sugestões que surgirem na consulta pública.

A aprovação das operações de loteamento é apenas o primeiro passo de um longo caminho. Como está inserida na vertente público-privada do Programa de Renda Acessível (PRA), a câmara terá de lançar um concurso público para encontrar uma empresa privada que construa e gira o empreendimento. Em seis anos de PRA, apenas dois destes concursos chegaram ao fim. As obras não começaram em nenhum dos casos.

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