Partidos já estão a preparar as alterações à lei da eutanásia depois de chumbo do TC

A maioria dos partidos considera que há espaço para melhorar o diploma e que o chumbo poderá contribuir para um maior aprofundamento do debate sobre a matéria.

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LUSA/MIGUEL A. LOPES

As reacções dos partidos à decisão do Tribunal Constitucional (TC) em declarar a lei da eutanásia inconstitucional dividiram-se, mas a maioria concordou que o diploma actual pode ser melhorado, expurgando as inconstitucionalidades e garantindo, assim, a sua viabilização. Foi esse o compromisso assumido por PS, PSD, BE, PEV, PAN e IL nesta segunda-feira, pouco depois de ser conhecida a decisão. Já o PCP é mais pessimista e crê que será “difícil” encontrar uma solução que supere o “chumbo” da lei.​ O CDS considera que “foi um cartão vermelho” à lei e o Chega entende que este não é momento de legislar sobre esta matéria.

Horas depois de a decisão ter sido tornada pública, a socialista Isabel Moreira afirmou que “ficou claro que não há qualquer incompatibilidade entre a despenalização da eutanásia e a protecção dada pela Constituição à vida humana”. Apesar do sentido do acórdão, Isabel Moreira sublinha que o veredicto não coloca entraves a uma das normas invocadas no pedido de fiscalização preventiva do Presidente da República relativa à “indeterminabilidade do sofrimento insuportável”. “Para aqueles que diziam que iriam recorrer à fiscalização sucessiva, ficou claríssimo que não há essa incompatibilidade”, afirmou a socialista.

O PSD considerou a decisão “positiva” porque “não fecha a porta” a alterações. O dirigente do PSD e antigo juiz do TC Paulo Mota Pinto lembrou que o que está em causa é a vida humana pelo que “é preciso que os conceitos sejam determinados, sejam seguros”. Nesse sentido, a decisão do TC poderá “contribuir para um maior aprofundamento do debate e da matéria”.

Também o BE considerou que não há “uma situação insanável”, mas “parâmetros da avaliação que precisam de ser redigidos com mais rigor, com mais pormenor, para que a indeterminação não possa ser um problema”. O deputado José Manuel Pureza sublinha que é “muito claro” que o que é dito “é que não há uma incompatibilidade de princípio entre o princípio da inviolabilidade da vida humana e uma despenalização da morte assistida em casos absolutamente tipificados” e que é preciso “dar maior concretização, densificação a um aspecto muito específico que diz respeito às situações de lesão definitiva”.

Pelo PEV, José Luís Ferreira, sublinhou que esta foi uma questão que dividiu o Constitucional “praticamente a meio” (sete votos contra cinco), o que mostra que “a questão não é pacífica”. Apesar de não concordar com o veredicto, o deputado ecologista destaca que o acórdão diz que “o direito a viver não pode transfigurar-se num dever de viver em quaisquer circunstâncias”, o que significa que “o direito a viver e a liberdade de autonomia pessoal são susceptíveis de terem soluções legislativas para poderem ser compatibilizadas, o que significa que o conceito não é em si inconstitucional”, acredita. 

O PAN também se mostrou disponível para uma proposta conjunta “para que toda a restante lei possa ser considerada constitucional e ser promulgada”. Apesar do chumbo, André Silva destaca que a porta continua aberta e isso foi um “marco importante”.

Além de também se disponibilizar para o debate, a Iniciativa Liberal lembrou o acórdão confirma a ideia já defendia pelos liberais de que “é possível enquadrar constitucionalmente legislação relativa à antecipação da morte medicamente assistida a pedido da própria pessoa”.

Menos optimistas estão os comunistas, que consideram que será “difícil” encontrar uma solução que supere o “chumbo” da lei. "O PCP nunca colocou no debate parlamentar a questão da constitucionalidade, sabíamos que era uma questão divisiva”, afirmou o deputado do PCP António Filipe. Ao contrário do PS e do BE, os comunistas, que votaram contra o diploma, não irão tomar nenhuma iniciativa de alteração à lei.

CDS fala em “cartão vermelho” à discussão leviana

As maiores críticas chegaram do CDS que considerou que este foi “um cartão vermelho” à forma “leviana” com que a maioria parlamentar tratou a questão. Francisco Rodrigues dos Santos propôs, em alternativa, "uma ampla e profunda discussão”, que coloque os programas eleitorais dos partidos a definição de uma lei para a eutanásia. Para o líder do CDS, esse seria um debate “mais sério, mais participativo, mais esclarecedor e mais livre”. O centrista não escondeu as suas preocupações com “os conceitos indeterminados” e os perigos de se tornarem “uma verdadeira rampa deslizante”, lembrando que "70% dos portugueses” não têm acesso a cuidados paliativos.

Já André Ventura, do Chega, defendeu que este não é o momento de legislar. Para Ventura, “a lei, tal como foi aprovada, tinha uma demasiada amplitude, que permitia que houvesse excessos e abusos na sua aplicação que podiam significar morte e um cenário muito negro para a sociedade portuguesa”.

O diploma foi já vetado nesta segunda-feira ao fim da tarde por Marcelo Rebelo de Sousa e será devolvido ao Parlamento.

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