Emagrecimento da Altice pode resultar em “800 a 900” saídas até Maio

Empresa queixa-se dos reguladores, da queda do negócio empresarial e do aumento das moratórias sobre as facturas de telecomunicações.

Foto
A Altice Portugal é presidida por Alexandre Fonseca Nuno Ferreira Santos

As queixas contra a “regulação hostil” da Anacom e da Autoridade da Concorrência (AdC) que, “segundo a gestão [da Altice Portugal], tem prejudicado deliberadamente a Meo e retirado à empresa milhões de euros” foram apenas parte dos argumentos que foram usados para explicar aos representantes dos trabalhadores a necessidade de emagrecer a empresa.

Segundo a Comissão de Trabalhadores (CT) da Meo, na reunião desta quarta-feira em que foi anunciado o novo programa de saídas do grupo Altice, a equipa de gestão liderada por Alexandre Fonseca também se mostrou preocupada com o facto de o segmento empresarial estar “em crise” e de haver “um aumento exponencial de pedidos de moratórias” no pagamento das facturas de telecomunicações.

Para a CT, a quem a gestão executiva da Altice pediu um parecer não vinculativo sobre o programa de saídas antecipadas através de pré-reformas e rescisões por mútuo acordo (a que a empresa chama a fase dois do Programa Pessoa), há “uma pergunta que fica sem resposta”. Trata-se de saber se “a sustentabilidade e a operacionalidade do negócio, a qualidade de serviço, a agilidade e a simplificação de processos são compatíveis com mais este esvaziamento de postos de trabalho”, já que “o potencial de saídas até Maio deverá ser de 800/900 trabalhadores”, refere a CT, em comunicado.

É uma dimensão em linha com o que sucedeu na fase um deste programa de redução de efectivos. Em 2019, houve cerca de 850 trabalhadores a deixar a empresa ao abrigo do Programa Pessoa (apesar de as manifestações de interesse terem superado as 2000), de um total de quase 1200 pessoas que saíram da Meo nesse ano.

Desde que a Altice chegou à antiga PT Portugal, percebeu-se que a redução do quadro de pessoal seria um tema sensível, quando o antigo presidente da empresa (e accionista do grupo Altice) Armando Pereira afirmou numa das primeiras reuniões com os sindicatos, em 2015, que a empresa tinha cerca de quatro mil trabalhadores a mais. Desde então, o número tem vindo a cair, mas não o suficiente, de acordo com o administrador responsável pelos recursos humanos, João Zúquete.

“Se compararmos o número de colaboradores directos da Altice Portugal com os operadores concorrentes, estamos a falar de discrepâncias relevantes: a Altice Portugal tem cerca de oito mil, ou seja, o dobro dos nossos concorrentes somados”, afirmou o gestor, em entrevista publicada no Diário de Notícias, nesta quinta-feira. De acordo com João Zúquete, há ainda a contabilizar 20 mil trabalhadores indirectos.

O administrador da Altice disse esperar um nível de adesão às pré-reformas superior ao de 2019, eventualmente na casa das mil adesões.

O programa de saídas, que produzirá efeitos em Maio, abarca a Meo SA, a Meo ST, a Altice Labs, a Altice ACS, a PT Contact, a PT Sales, a PT Data Center e a Mcall Contact Center. Não estão incluídos os trabalhadores das participadas Fastfiber, Intelcia, Sudtel e Tnord.

De acordo com informação recolhida pelo PÚBLICO, o plano de pré-reformas para trabalhadores com idade igual ou superior a 55 anos estabelece que só poderão candidatar-se aqueles que tiverem mais de 15 anos de casa cumpridos até 30 de Abril.

Estes trabalhadores poderão garantir 80% do vencimento-base e diuturnidades, acrescidos de 40% de outras rubricas remuneratórias mensais, como a isenção de horário de trabalho, por exemplo, mas o subsídio de alimentação não será considerado. Os trabalhadores podem desistir até “dez dias após a data de efeitos do acordo”.

A empresa garante ainda a quem aderir ao programa que os planos de saúde continuam válidos, “para quem deles beneficia” e que, no caso do plano de comunicações, quem sair em pré-reforma mantém “os benefícios telefónicos aplicáveis, a cada momento, ao seu caso particular” (os trabalhadores têm a possibilidade de manter telefones e números, mas deverão subscrever tarifários pré-pagos em lojas Meo).

Quem aderir ao programa de pré-reformas fica obrigado a requerer a reforma logo que reúna os requisitos legais (caso contrário, a empresa deixará de pagar a prestação mensal acordada) e também poderá “celebrar outro contrato de trabalho”, desde que não o faça com “uma entidade que exerça actividades que possam ser consideradas concorrentes”.

Para as rescisões negociadas ou rescisões por mútuo acordo, que a empresa também está a lançar em paralelo, não há limite de idade e a única promessa é a de que serão condições melhoradas em relação ao valor de referência para o despedimento colectivo. Aqui, haverá uma negociação caso a caso, atendendo à situação de cada trabalhador, e um prazo mais alargado, que ainda não se conhece.

A adesão ao Programa Pessoa “não é vinculativa e está sujeita validação superior”, pelo que após a manifestação de interesse dos trabalhadores, “será analisada superiormente”, sendo-lhes depois comunicada “a decisão final da empresa”.

Numa comunicação interna, a empresa chama a esta iniciativa um “Plano Organizacional Integrado de saídas voluntárias” destinado a “garantir a sustentabilidade da Altice Portugal num mercado concorrencial cada vez mais agressivo, dinâmico, imprevisível e com clientes mais exigentes”.

Essa sustentabilidade apenas será possível “com uma estrutura cada vez mais ágil e flexível”, refere a empresa.

A CT da Meo diz não desvalorizar “o enquadramento pandémico” que se vive e fala na “angústia e incerteza que sentem muitos trabalhadores da empresa em relação ao futuro”.

A estrutura representativa dos trabalhadores sublinha ainda que “a Altice Portugal está em mudança e iniciou um novo ciclo (2021/2023) com objectivos impostos pela casa-mãe” que são “muito exigentes” e “têm um sentido único: aumento das margens e maximização do lucro para os ‘donos’”.

A “estratégia gizada pelo Sr. Patrick Drahi com o lançamento da OPA [oferta pública de aquisição] sobre a Altice Europa [dona da Altice Portugal]”, que permitiu retirar a empresa da bolsa de Amesterdão, serviu para eliminar o “escrutínio dos accionistas minoritários e dos reguladores de mercado”, frisa ainda a CT.

Sugerir correcção
Comentar