Falha nas entregas deixa mais de um milhão de portugueses sem vacina até final de Março

Meta inicial não vai poder ser cumprida por falta de vacinas. Inoculação em massa deverá concentrar-se nos três meses de Verão, período em que poderão ser administradas oito milhões de doses da vacina contra a covid-19, o que vai dificultar trabalho do Governo.

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O grosso da operação de vacinação deverá concentrar-se nos meses de Verão Daniel Rocha

A falha nas entregas de vacinas contra a covid-19 vai atrasar a vacinação de mais um milhão de portugueses, cuja inoculação estava inicialmente prevista até ao final de Março. O primeiro-ministro, António Costa, informou nesta quinta-feira em conferência de imprensa que estava contratualizada a entrega de 4,4 milhões de vacinas contra o novo coronavírus no primeiro trimestre, mas que Portugal só receberá 1.980.000 nesse período. Como são necessárias duas doses de cada uma das três vacinas actualmente autorizadas (a da BioNTech/Pfizer, a da Moderna e a da AstraZeneca/Oxford), tal só permitirá vacinar por completo um milhão de pessoas.

No anúncio do plano de vacinação, feito no início de Dezembro passado, referia-se que nos primeiros três meses do ano estava prevista a entrega de mais de quatro milhões de doses, o que permitiria inocular mais de dois milhões de pessoas em Portugal até final de Março. No entanto, duas semanas mais tarde, o então coordenador da task force criada pelo Governo para gerir o plano de vacinação, Francisco Ramos, admitia numa entrevista ao PÚBLICO que as doses que iríamos receber no primeiro trimestre dificilmente ultrapassariam os 2,5 milhões. “E, mesmo isso, é num cenário optimista, que implica que a aprovação da vacina da AstraZeneca ocorra muito depressa. Muito provavelmente será menos do que isso, seguramente um milhão e meio, entre a vacina da Pfizer e a da Moderna”, afirmava então Francisco Ramos.

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No final de Janeiro, quando apresentou o balanço do primeiro mês de vacinação, a task force estimava receber até ao final do primeiro trimestre 2,2 milhões de doses, o que permitiria vacinar com as duas tomas 811 mil pessoas e mais 520 mil só com uma. O número real não deve chegar a tanto, já que, confrontando estes dados com os disponibilizados esta quinta-feira por António Costa, vão chegar a Portugal menos 234 mil doses do que se previa há 15 dias.

A maior parte das vacinas administradas no primeiro trimestre serão da BioNTech/Pfizer (perto de 1,3 milhões), estando prevista a chegada de 227 mil doses da Moderna, segundo o balanço da task force feito a 28 de Janeiro. As restantes devem ser da AstraZeneca/Oxford, que apenas foi autorizada pela Agência Europeia do Medicamento no dia seguinte ao balanço do primeiro mês de vacinação e cujo primeiro lote, composto por 43.200 vacinas, chegou no domingo passado. Até esta quarta-feira, segundo dados oficiais da Direcção-Geral da Saúde, tinham sido administradas 415.283 vacinas contra a covid-19, tendo mais de 116 mil pessoas recebido as duas doses e perto de 300 mil apenas uma dose.

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No balanço do primeiro mês de vacinação, foi apresentado um gráfico que estimava que no segundo trimestre deste ano, entre 1 de Abril e 30 de Junho, deveriam chegar um pouco mais de cinco milhões de doses da BioNTech/Pfizer e da Moderna, não estando nessa altura calendarizada a entrega das mais de 6,8 milhões de doses que Portugal deveria receber da vacina da AstraZeneca/Oxford. No entanto, segundo o PÚBLICO apurou junto de um responsável envolvido no processo de distribuição da vacina, as entregas deverão atrasar-se até ao final do segundo trimestre, o que deverá concentrar nos três meses de Verão o grosso da vacinação da população residente em Portugal.

O fim da primeira fase de vacinação, que inicialmente previa a vacinação de 950 mil pessoas entre profissionais de saúde, residentes em lares e respectivos funcionários e pessoas com mais de 50 anos com determinadas patologias, só deve terminar já em Abril. Em final de Janeiro, a task force que gere o processo de vacinação anunciou que nesta fase iriam ser integradas as pessoas a partir dos 80 anos, mesmo sem doenças, um grupo estimado de 670 mil cidadãos que começou a ser vacinado no início deste mês, com excepção dos que viviam em lares, que foram vacinados antes. A prioridade foi, contudo, para os idosos a partir dos 80 anos com doenças associadas.

O mesmo responsável adiantou que o Governo espera concluir a segunda fase de vacinação, que inclui cidadãos a partir dos 65 anos com ou sem doenças e pessoas entre os 50 e os 64 anos com determinadas patologias no segundo trimestre. Neste momento, a expectativa é que ainda antes do final de Junho seja possível começar a vacinar a restante população, que, numa primeira etapa, não deve integrar crianças nem as mais de 750 mil pessoas que já estiveram infectadas com o novo coronavírus.

Mesmo assim, é possível que se concentre nos meses de Verão a vacinação de mais de quatro milhões de pessoas, um desafio complexo já que obrigará a administrar em três meses pelo menos oito milhões de doses. A ser assim, será necessário vacinar em média cerca de 87 mil pessoas por dia, incluindo fins-de-semana, uma capacidade que excede a que existe no Serviço Nacional de Saúde. Tal deverá obrigar a criar estruturas de vacinação rápida, como drive-thrus ou pavilhões desportivos. E, se tal não for suficiente, a vacinação poderá ser alargada às farmácias.

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