O adolescente, o psicólogo e os pais

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Em psicologia, a conversa com os adolescentes permite criar um espaço íntimo, reservado e de confiança para identificar as suas necessidades de apoio e construir a ajuda para a satisfação das mesmas, de modo a que se sintam bem nos espaços das suas relações com os pais, amigos e outros à sua volta. O artigo de hoje foi desenvolvido em conjunto com a Inês, uma adolescente que me pediu ajuda quando tinha 15 anos e que acompanhei durante um ano e meio, e que, agora, neste momento da nossa conversa, tem 20 anos.

Algumas vezes, a decisão de ir ao psicólogo/a é do adolescente, outras dos pais, outras de ambos, sendo, normalmente esta última a mais facilitadora da tomada de decisão para pedir ajuda. Quando perguntei à Inês quem tinha decidido que era importante ela vir às minhas consultas, ela respondeu-me: “Eu própria sentia que precisava de me ‘resolver’ em alguns assuntos... Os meus pais também abordaram o assunto e foi mais fácil de decidir”. Frequentemente, os jovens não sabem muito bem o que é ir ao psicólogo, ou se isso os vai ajudar. A Inês diz ter vindo porque “gostava de perceber como é que era a experiência”. O adolescente pode ir a uma primeira consulta, sem compromisso, e depois decidir se quer continuar, se se sentiu bem com o profissional, se era aquilo que esperava.

Muitas vezes, os pais têm uma boa relação com os filhos, mas é mais fácil para os adolescentes falarem com “alguém de fora” do que com os pais ou com os amigos, como a Inês, que procurou “ter essa ajuda por parte de alguém que estivesse fora” do seu círculo mais próximo.

O objetivo destas consultas é o de promover a participação ativa dos adolescentes na resolução dos seus próprios problemas, proporcionando-lhes a informação necessária para poderem tomar decisões, criar alternativas para a sua vida, atuando o psicólogo/a como consultor e facilitador, descobrindo as potencialidades do adolescente.

A primeira finalidade da consulta é identificar a queixa e o domínio do problema. Escutar o pedido de ajuda, ou como diz Inês: “Saber que podia pôr por palavras o que sentia, apesar de não ser tarefa fácil.” A ideia da escuta corresponde a ouvir o adolescente, dando-lhe espaço e tempo para que ele “desabafe”, o que a Inês reconheceu na nossa relação: “Ouvia. E não julgava. E isso é o que as pessoas procuram. Alguém que esteja disponível para as ouvir e tentar perceber a nossa perspetiva das coisas”. Escutar corresponde a ouvir os seus problemas, as suas inseguranças e amarguras, permitindo, sobretudo, “ter a sensação de ‘descarregar’ os pesos que na altura sentia”, o que a ajudava a sentir-se “mais leve de cada vez que saía de uma consulta”. O foco de alguém que tem problemas e sente que precisa de ajuda para os resolver é sempre aproveitar a pessoa que está disposta a ouvir.

Quando partilha os problemas, o adolescente sente-se menos sozinho: “Ir ao psicólogo é como se fosse libertar todos os pensamentos que ficam presos na nossa cabeça e a sensação é que os deixamos para trás de certa forma (...) Acho que a partilha de problemas com o psicólogo é exatamente aquilo que nos move a procurar um. Esta partilha é precisamente importante porque permite que as pessoas sintam que estes seus problemas estão a ser deixados de parte com a conversa, ou, pelo menos, é essa a sensação”.

Os problemas que levam os jovens a pedir ajuda são muito variados. No caso da Inês, ela sentia-se “em baixo” por achar “que não era valorizada” pelos amigos, pelo menos da forma como ela os valorizava. Muitas vezes o que desencadeia a ansiedade é um incidente na escola, em casa, ou como refere Inês: “Comecei a sentir-me assim depois de uma confusão que houve numa viagem com a escola. Na verdade, acho que esta viagem foi um ponto de partida para o que eu sentia, mas, ao longo do tempo, este sentimento foi prevalecendo e aqui acho que já não tinha propriamente a ver com esta situação específica, mas sim com a falta de confiança e overthink de tudo que acabou por se instalar na minha cabeça de forma mais constante”.

Depois de escutada e de se sentir mais leve, Inês reconheceu o valor de ir ao psicólogo/a, por ter tido acesso a “sugestões e dicas” acerca de como poderia lidar com as pessoas à sua volta. “Na verdade, estratégias de comunicação que me permitissem gerir os meus sentimentos face aos meus amigos/família da melhor forma, e sem me prejudicar, de forma saudável para mim.”

A escuta e aconselhamento têm que ser prolongadas no tempo, o “tempo” do adolescente: “Ao fim de cerca de meio ano de consultas, comecei a sentir-me melhor e mais ‘livre’ dos sentimentos que estava a ter e que, de certa forma, estavam a ser ‘pesos’ para mim”.

A partilha dos problemas com o psicólogo permite também salvaguardar os pais. Muitas vezes os filhos não lhes conseguem contar realmente os seus problemas, para não os preocupar. O testemunho de Inês: “Acho que às vezes podia ser uma estratégia de defesa. Falo por mim, eu até tenho uma relação relativamente próxima com os meus pais, mas às vezes sinto que não vale a pena estar a ir ao fundo de todas as questões com eles, e que se os ‘poupar’ de pormenores (por exemplo. como me senti com uma certa situação do meu dia) é melhor para ambos.”

A conversa entre os adolescentes e o psicólogo/a pode, de facto, ser uma ajuda grande para promover o seu bem-estar e, por via disso, da sua relação com os seus pais, amigos e outros à sua volta.

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