“Acordem”: o Relógio do Apocalipse está a 100 segundos do fim

O simbólico relógio que avisa a humanidade sobre a proximidade do fim foi acertado esta quarta-feira.

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Leah Millis/Reuters

O Relógio do Apocalipse não mexeu os ponteiros desde o ano passado: continua assim a 100 segundos do fim, anunciaram esta quarta-feira os especialistas da revista Bulletin of the Atomic Scientists. Este relógio é uma metáfora que alerta a humanidade sobre se está mais perto ou mais longe de se autodestruir com as suas decisões e tecnologias. No ano passado, em Janeiro, ainda antes ter sido declarada a pandemia de covid-19, tinha ficado a 100 segundos da meia-noite, nunca estando tão perto do fim. Ao manter-se em 2021 a menos de dois minutos da meia-noite, este acerto é mais uma chamada de atenção para acordarmos, pedem os especialistas.

Os principais motivos apontados pelos cientistas durante a conferência de imprensa desta tarde (às 15 horas de Lisboa) transmitida online para esta decisão foram a pandemia de covid-19 e como ela nos mostrou como não estamos preparados para lidar com uma situação deste género, bem como ameaças como as alterações climáticas e as armas nucleares. Por esta “falta de progressos” relativamente a 2020, os ponteiros do relógio não se moveram.

A cerimónia deste ano foi adequada aos tempos de pandemia. Rachel Bronson, presidente da Bulletin, fez o anúncio por Zoom e, da Escola de Políticas Pública Harris da Universidade de Chicago, mostrava-se o famoso relógio. “Os ponteiros do Relógio do Apocalipse permanecem a 100 segundos da meia-noite, tão perto da meia-noite como nunca”, referiu Rachel Bronson. Antes, explicava que a hora deste relógio representa a apreciação de cientistas proeminentes e especialistas de segurança sobre as ameaças à existência humana com um foco no risco nuclear, nas alterações climáticas e nas novas tecnologias revolucionárias.

Se em 2020, mesmo antes de pandemia ter sido declarada e ainda sem os milhões de casos no mundo como agora, o relógio ficou mais perto do fim do que nunca, esperava-se que em 2021 os ponteiros avançassem uns segundos mais perto do fim. Muitos dos que viam o anúncio online estavam a comentar ao mesmo tempo e apostavam em valores como 90 ou 75 segundos. Também antes do anúncio Rachel Bronson não fazia um bom retrato do último ano: “A letal e assustadora pandemia de covid-19 serve como um alerta histórico e uma ilustração vívida de que os governos e as organizações internacionais não estão preparados para gerir a ameaça das armas nucleares e das alterações climáticas que realmente podem acabar com a civilização.”

No fundo, podemos encarar a permanência dos ponteiros do relógio como um aviso e uma oportunidade para acordar e mudar. No anúncio, Ellen Johnson Sirleaf (antiga Presidente da Libéria e co-presidente do Painel para a Preparação e Resposta Pandémica da Organização Mundial da Saúde), disse mesmo: “A covid-19 é um terrível aviso contra a complacência face a ameaças globais para todas as vidas humanas.” Alertou ainda que a nova presidência de Joe Biden tem a oportunidade de reafirmar os compromissos dos Estados Unidos com certos valores.

Alterações climáticas e ameaça nuclear

Já Jerry Brown, antigo governador da Califórnia, fez um alerta quanto à ameaça nuclear. “Os Estados Unidos, a Rússia e as potências nucleares mundiais devem parar de berrar uns com os outros. É tempo de eliminar as armas nucleares.” Quanto às alterações climáticas também foi bastante directo: a China, os Estados Unidos e outros grandes países devem levar mais a sério o corte nas emissões dos gases com efeito de estufa. “Estamos a 100 segundos da meia-noite. Acordem!”

Por sua vez, Susan Solomon, professora de estudos ambientais no Instituto de Tecnologia do Massachusetts (nos EUA), lembrou que a desaceleração da economia causada pela pandemia fez reduzir temporariamente as emissões de dióxido de carbono. Acrescentou que na próxima década o uso de combustíveis fósseis tem de descer de forma acentuada para que se evitem os piores efeitos nas alterações climáticas, mas as projecções relativas ao uso de combustíveis fósseis vão no sentido do aumento. Este ano foi sintomático: além de ter sido dos dois anos mais quentes de que há registo, grandes incêndios e furacões tropicais provocaram grande devastação. “[Esses fenómenos] irão aumentar se os governos não investirem rápida e significativamente os seus esforços para levar basicamente a zero as emissões de gases com efeito de estufa”, avisou.

Nas tradicionais recomendações da Bulletin listadas num comunicado, aconselha-se por exemplo que os Estados Unidos, agora que anunciaram que se irão juntar ao Acordo de Paris de 2015 sobre as alterações climáticas, deverão acelerar o seu compromisso de descarbonização; que os presidentes da Rússia e dos EUA podem e devem prolongar o tratado New START (que impõe limites ao arsenal nuclear de ambos os países e expira em Fevereiro) pelo maior prazo possível; ou que os governos, as grandes empresas de tecnologia e comunicações, os especialistas e as organizações de comunicação social deverão cooperar para encontrar formas práticas e éticas de combate à desinformação na Internet.

Quando este relógio foi criado em 1947, o maior perigo para a humanidade estava nas armas nucleares. Em 2007, as alterações climáticas entraram pela primeira vez na decisão que é tomada todos os anos. Se em 2020 foi o ano em que esteve mais perto do fim, em 1991, com o fim da Guerra Fria, foi o que esteve mais longe da meia-noite, ficando então a 17 minutos do fim.

E quem decide se os ponteiros avançam ou recuam? Especialistas de várias áreas, como energia nuclear ou alterações climáticas, que, geralmente, também aconselham governos e agências internacionais. Há ainda um painel de cientistas (que inclui cientistas galardoados com o Prémio Nobel) que aconselha o primeiro grupo.

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