O cancro do colo do útero não pode esperar

A nível nacional, o programa de rastreio do cancro do colo do útero destina-se a mulheres entre os 25 e os 60 anos, com realização de citologia cervico-vaginal para identificação da presença do Vírus do Papiloma Humano (HPV), intimamente relacionado com o desenvolvimento deste cancro.

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"Todas as doenças importam e a doença oncológica não espera!" National Cancer Institute/Unsplash

A propósito do mês de sensibilização para o cancro do colo do útero importa alertar para a necessidade de um diagnóstico atempado e da continuidade de tratamentos oncológicos. Em Portugal são diagnosticados, anualmente, cerca de 860 novos casos de cancro do colo do útero, que ocupa o sétimo lugar em termos de frequência e o quinto em mortalidade por cancro na mulher, de acordo com dados de 2020 do Globocan - Observatório Global do Cancro da OMS.

Neste contexto de pandemia temos assistido a uma redução dos exames de rastreio que permitem detectar o cancro e a doença pré-maligna. O cancro do colo do útero é um exemplo paradigmático em que a diminuição do número de casos a que assistimos não significa que não existam, significa que não foram “travados” pelo rastreio e só serão identificados numa fase mais tardia.

A nível nacional, o programa de rastreio do cancro do colo do útero destina-se a mulheres entre os 25 e os 60 anos, com realização de citologia cervico-vaginal para identificação da presença do Vírus do Papiloma Humano (HPV), intimamente relacionado com o desenvolvimento deste cancro.

O objectivo do rastreio é diminuir a mortalidade associada a um determinado tipo de cancro e, no caso específico do colo do útero, estima-se uma descida da mortalidade em cerca de 80%! O impacto na saúde pública é indiscutível: além de uma diminuição da mortalidade permite estabelecer diagnósticos em fases mais precoces potencialmente curáveis o que contribui para menor necessidade de tratamento ou tratamento menos agressivo.

O adiamento ou a suspensão deste rastreio irá repercutir-se necessariamente num maior número de diagnósticos em fase avançada, necessidade de tratamentos mais agressivos com maior impacto na qualidade de vida da mulher, previsivelmente menos eficazes, e inevitável aumento da mortalidade.

Após anos de investimento na melhoria dos cuidados de saúde na doença oncológica, com progressivas melhorias e preciosos sucessos, não podemos permitir que se recue no tempo para número de casos e de mortalidade por cancro muito acima dos expectáveis.

Todas as doenças importam e a doença oncológica não espera! O “controlo” do cancro do colo do útero está dependente do rastreio, mas também — à semelhança das restantes doenças oncológicas — do tratamento atempado após o diagnóstico. Não há justificação para que, mesmo em tempo de pandemia como a que vivemos, sejam adiados os tratamentos oncológicos. É importante garantir que os doentes iniciam e mantêm o tratamento dentro do tempo preconizado para garantir maior possibilidade de sucesso no tratamento.

Há que manter as equipas dedicadas à oncologia activas e com meios necessários, para chegarem a todos os doentes que delas necessitem.

Existem soluções, ao nível dos tratamentos, que são possíveis para adaptação ao tempo de pandemia, sem impacto negativo na evolução da doença. Para apoiar estas decisões foram estabelecidas recomendações de sociedades nacionais e europeias, que apoiam a reorganização da abordagem ao tratamento oncológico neste contexto de pandemia. As unidades de saúde reforçaram as medidas implementadas para garantir a segurança do doente oncológico, seja para tratamento, realização de exames, de consulta ou até em situação de urgência.

O acompanhamento regular do doente oncológico é essencial e, como complemento, pode recorrer-se a teleconsultas, uma forma de contacto simples, imediato, para orientação e esclarecimento. Recordo o caso de uma pessoa que estava fora de Portugal e foi diagnosticada com cancro. Foi através de teleconsulta que nos conhecemos e acompanhei a evolução da situação até ao início da quimioterapia num país distante. Quando nos encontramos em Portugal para prosseguir o tratamento referiu como tinha sido reconfortante poder ser acompanhada ainda que à distância.

A doença oncológica não vai ficar “suspensa” durante a pandemia, não vai esperar que a covid-19 desista, pelo contrário vai evoluindo e deixando menos margem para o seu controlo. É urgente combater esta doença. Não adie os tratamentos!

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