Estado pagou indemnização a família de Ihor. Amnistia preocupada com abusos do SEF

Organização não-governamental defende criação de um órgão externo que não seja a IGAI e tenha a capacidade “de escrutínio para perceber quem são os maus agentes e garantir que se entrarem nas forças de segurança não ficam muito tempo a prestar um mau serviço ao país”. MAI diz que já procedeu a pagamento de indemnização de 712.950 euros a família de Ihor Homenyuk.

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LUSA/MÁRIO CRUZ

O Ministério da Administração Interna (MAI) enviou um comunicado a dizer que tinha procedido ao pagamento da indemnização extra-judicial à família de Ihor Homenyuk, o cidadão ucraniano morto nas instalações do SEF no aeroporto de Lisboa, — a mulher, dois filhos menores e o pai — no valor de 712.950 euros.

O MAI refere ainda que “o direito de regresso contra os responsáveis pelos danos será exercido nos termos que resultarem da responsabilidade individual judicialmente provada”. Como o PÚBLICO tinha noticiado, os três inspectores acusados de homicídio de Ihor Homenyuk a 12 de Março, no centro de instalação temporária do SEF do aeroporto, se forem condenados, poderão vir a ter de pagar os valores ao Estado. Àquele valor acrescenta-se cerca de 87 mil euros, segundo contas do advogado da família, que poderão ser entregues aos filhos depois dos 18 anos enquanto estudarem ou estiverem a fazer formação profissional.

Entretanto, a Amnistia Internacional (AI) manifestou ao MAI a sua preocupação com “queixas de uso excessivo de força e maus tratos” a imigrantes por parte de agentes do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. À AI preocupa aquilo que considera ser “a existência de um problema sistémico”.

Aquela organização não-governamental diz ter recebido queixas com mais de 20 anos e “tem vindo a acompanhar os vários relatos de abusos de direitos humanos cometidos por profissionais” do SEF nos centros de instalação temporária dos aeroportos portugueses, “sendo o mais grave o assassinato” do cidadão ucraniano Ihor Homenyuk a 12 de Março de 2020. O julgamento dos três inspectores acusados de homicídio qualificado — Luís Silva, Duarte Laja e Bruno Sousa —  está previsto começar a 2 de Fevereiro. 

Na sequência destes acontecimentos, a AI sugeriu ao MAI que criasse um órgão inspectivo externo, que acredita que não pode ser a Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI); isto porque, na sua opinião, “não tem verdadeira independência, dado ser dependente do mesmo ministério que tutela as polícias”. Este órgão deve ter capacidade “de escrutínio para perceber quem são os maus agentes e garantir que se entrarem nas forças de segurança não ficam muito tempo a prestar um mau serviço ao país”, defendem. Esta é, de resto, a recomendação de outras organizações internacionais; há quem defenda que a IGAI deveria ter mais meios e poderes de investigação mais amplos, como o Conselho da Europa. 

De quatro sugestões feitas pela AI destaca-se ainda a videovigilância: a organização acredita que devem existir câmaras nos espaços, instalações, carros e uniformes dos agentes das forças de segurança. “Nos EUA esta experiência já foi testada em alguns locais com sucesso. Os bons agentes não terão medo desta medida. Pelo contrário, irão agradecer esta transparência que permitirá separar o trigo do joio, ajudando-nos a perceber quem são os bons agentes e quem são os que não merecem servir o país e os direitos humanos nessa profissão”, argumenta.

Uma formação alicerçada em direitos humanos para todos os agentes nas várias polícias e guardas, o exercício de profiling não baseado no género, etnia ou outras características físicas ou ideológicas, melhores condições de trabalho para os agentes e escrutínio no recrutamento “para que pessoas xenófobas, racistas ou misóginas não consigam ser recrutadas e infiltrar-se nestas forças” foram outros dos pontos debatidos. “No presente sabemos que são uma minoria, mas é quanto basta para mancharem o bom nome das suas instituições”, defende a AI.

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