Trump pressionou republicano a alterar resultados na Georgia: “Só quero encontrar 11.780 votos”

Numa conversa de uma hora ao telefone, no sábado, o Presidente dos EUA confrontou o secretário de estado da Georgia com inúmeras teorias da conspiração sobre a eleição de 3 de Novembro. O responsável não cedeu à pressão.

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Donald Trump disse ao secretário de estado da Georgia que só precisava de 11.780 votos ERIK S LESSER, JIM LO SCALZO/EPA

O Presidente dos EUA, Donald Trump, telefonou ao responsável pela certificação dos resultados eleitorais no estado da Georgia, no sábado, e pressionou-o a “encontrar” votos suficientes para inverter o resultado da eleição de 3 de Novembro. Numa gravação áudio revelada pelo jornal The Washington Post, Trump é ouvido a confrontar o responsável com inúmeras teorias da conspiração e a ameaçá-lo com acusações criminais sem fundamento aparente.

“O povo da Georgia está furioso, o povo americano está furioso. E não há nada de errado em dizer que vocês fizeram novos cálculos”, disse o Presidente dos EUA durante a conversa.

Do outro lado da linha, o secretário de estado da Georgia, o republicano Brad Raffensperger, ia respondendo às queixas de Trump sem adiantar grandes explicações: “Bem, senhor Presidente, a informação que tem está errada.”

Num outro momento, Trump dá uma instrução mais específica: “Olhe, o que eu quero que você faça é isto. Só quero encontrar 11.780 votos, um voto a mais do que temos. Porque nós ganhámos.”

Na eleição de 3 de Novembro, Joe Biden foi o candidato mais votado na Georgia, com mais 11.779 votos do que Donald Trump.

Com vitórias na Georgia e noutros estados onde Trump venceu na eleição de 2016 (Pensilvânia, Michigan, Wisconsin, Arizona, Nevada), Biden somou 306 votos no Colégio Eleitoral – mais 36 do que os 270 necessários para a eleição.

Nos dois meses que se seguiram à eleição presidencial, Trump e os seus aliados lançaram uma ofensiva nos tribunais, assente em queixas de fraude generalizada nos seis estados decisivos. No final, os advogados de Trump tiveram mais de 50 derrotas nos tribunais, incluindo no Supremo Tribunal, e até hoje não conseguiram provar a existência de fraude numa dimensão suficiente para alterar os resultados em qualquer estado.

Dominion e “mortos”

Durante a conversa telefónica de sábado, o Presidente dos EUA confrontou o secretário de estado da Georgia com uma das várias teorias da conspiração, segundo a qual mais de 5000 votos na eleição de 3 de Novembro, na Georgia, foram submetidos em nome de eleitores mortos.

“O número verdadeiro é dois. Dois. Houve duas pessoas mortas que votaram”, respondeu Brad Raffensperger.

Trump também confrontou o advogado do secretário de estado da Georgia, Ryan Germany, com a queixa, nunca provada em tribunal, de que uma empresa de máquinas de votos adulterou os resultados a favor de Biden e destruiu boletins, em particular no condado de Fulton.

– É o que se diz por aí – disse o Presidente dos EUA. – E também se diz que a Dominion fez desaparecer máquinas. Sabe alguma coisa sobre isso? Porque isso é ilegal.

– Não, a Dominion não levou nenhuma máquina do condado de Fulton – respondeu o advogado.

– E não substituíram componentes de máquinas?

– Não.

– Tem a certeza, Ryan?

– Tenho a certeza, sr. Presidente.

Pressões constantes

Não é a primeira vez que o Presidente dos EUA pressiona responsáveis do Partido Republicano, na sua luta para se manter na Casa Branca apesar da derrota na eleição contra Joe Biden.

Ainda em Novembro, quando os resultados das eleições estavam em processo de serem certificados pelos vários estados, Trump chamou os líderes republicanos no Congresso do Michigan para uma reunião na Casa Branca. O objectivo era que o partido assumisse o controlo do processo de certificação, através de uma sessão extraordinária na Câmara dos Representantes do Michigan, onde o Partido Republicano está em maioria.

Os líderes republicanos não convocaram uma sessão extraordinária e permitiram que o processo seguisse em frente da forma habitual, aceitando a certificação da vitória de Joe Biden pelo secretário de estado e pelo governador da Georgia, Brian Kemp – também do Partido Republicano.

Para além da pressão sobre os líderes republicanos do Michigan e da Pensilvânia, em Novembro, e da pressão sobre Brad Raffensperger, no sábado, a vantagem de Biden na eleição na Georgia também resistiu a três contagens – a primeira, feita a partir dos resultados das máquinas; uma auditoria a pedido do secretário de estado, feita à mão, e que confirmou a vitória de Biden; e uma terceira contagem, feita a pedido da campanha eleitoral de Donald Trump.

Depois disso, a 14 de Dezembro, o Colégio Eleitoral votou e confirmou a vitória de Biden na Georgia e nos outros estados onde Trump ganhou em 2016, confirmando também a sua eleição como 46.º Presidente dos EUA.

Ted Cruz lidera último esforço

O derradeiro esforço no sentido de alterar o resultado da eleição presidencial vai acontecer na quarta-feira, durante a cerimónia de contagem dos votos do Colégio Eleitoral no Congresso dos EUA – o último passo antes da tomada de posse, a 20 de Janeiro.

Na quarta-feira, um grupo de senadores republicanos vai juntar-se aos seus colegas da Câmara dos Representantes para contestarem votos do Colégio Eleitoral em Joe Biden.

A cerimónia de 6 de Janeiro costuma ser uma mera formalidade, mas a insistência do Presidente Trump em pôr em causa os resultados – e o desejo de algumas figuras do Partido Republicano, como o senador Ted Cruz, de se manterem relevantes como potenciais candidatos à Casa Branca em 2024 vão provocar uma pequena revolução nos trabalhos.

Com o apoio imprescindível dos senadores e dos membros da Câmara dos Representantes, é provável que a contagem de votos seja interrompida por uma ou mais vezes. Se isso acontecer, a sessão é suspensa e as duas câmaras dão início a duas sessões de duas horas, separadamente, para votarem sobre as contestações.

Como o Partido Democrata está em maioria na Câmara dos Representantes, está garantida, à partida, a derrota de qualquer contestação a votos do Colégio Eleitoral em Joe Biden.

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