Covid-19: idosos nas pontas da mesa, não partilhar objectos e arejar os espaços — os conselhos para o Natal

O PÚBLICO reúne algumas das principais recomendações dos especialistas para celebrar o Natal com segurança em plena pandemia de covid-19.

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Daniel Rocha

Não há dúvidas de que este será um Natal diferente depois de o novo coronavírus ter virado o mundo do avesso e obrigado a que a quadra natalícia fosse repensada. A poucas horas da ceia e almoço de Natal, o PÚBLICO reúne alguns dos principais conselhos dos especialistas para celebrar a data com segurança.

O primeiro vem já a ser repetido há vários dias: minimizar o número de pessoas à mesa. Embora o Governo português não tenha estabelecido um limite de pessoas que se podem reunir neste Natal, o primeiro-ministro tem repetido que os festejos têm de acontecer “com o máximo cuidado”, de preferência sempre com máscara e estando à mesa “o mínimo de tempo possível”. “Se é habitual juntarem-se três ou quatro agregados [familiares] diferentes, juntem só dois. Dessa forma, não fica ninguém sozinho e evitam correr o risco de juntar muitas pessoas”, sublinha ao PÚBLICO o epidemiologista Manuel Carmo Gomes.

Celso Cunha, virologista e professor do Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Universidade Nova de Lisboa (IHMT-NOVA), apela também a que as pessoas procurem celebrar o Natal com o agregado familiar habitual, restrinjam o número de contactos e não tragam para suas casas “pessoas de fora, sejam elas parentes mais chegados ou mais afastados”. “Se nos mantivermos restringidos ao nosso agregado familiar, o risco é muito menor porque são pessoas com quem nós convivemos todos os dias e, independentemente de haver Natal ou não, o risco permanece o mesmo”, diz. Por outro lado, “mantendo-se a celebração de Natal dentro do agregado familiar não é necessário tomar mais medidas de precaução para além daquelas que são tomadas frequentemente no dia-a-dia”.

Idosos devem estar menos tempo à mesa e ficar nas pontas

Importa também “identificar se há na família alguma pessoa que seja de alto risco para hospitalização caso contraia a covid-19 — normalmente são pessoas mais idosas ou com doenças crónicas, como cardiopatias ou doenças pulmonares obstrutivas, que se sabe que estão associadas a quadros clínicos mais graves”, explica Manuel Carmo Gomes. Estas pessoas “devem ser protegidas”, sendo aconselhável tentar minimizar o tempo que elas passam num ambiente fechado com muita gente. “Em vez de estarem duas, três ou quatro horas — que normalmente é o tempo mínimo que demora uma ceia de Natal —, tentem que essas pessoas estejam menos tempo [no espaço de convívio], por exemplo apenas 20 minutos ou meia hora. Não impede que vejam os filhos e os netos, mas correm mais risco se estiverem fechadas tanto tempo com tanta gente”, afirma o epidemiologista. Isto porque, durante as horas em que as pessoas estão reunidas a falar, por vezes alto, “gera-se uma nuvem de aerossol e, se alguém estiver infectado, o vírus fica em suspensão no ar e pode ser inalado pelas pessoas que estão presentes”.

O presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública, Ricardo Mexia, também destaca a importância de “haver menos pessoas à mesa” este ano e reduzir o tempo que passamos à mesa, uma vez que durante este período “estamos mais próximos e tendencialmente sem máscara”. O médico de saúde pública salienta ainda que é importante “tentar preservar a distribuição dos agregados”: “Ou seja, tentar pôr as pessoas que vivem juntas de um lado e as pessoas que vivem noutro agregado noutra extremidade para manter alguma distância.”

Recomenda-se também sentar “as pessoas mais vulneráveis na ponta da mesa e mais próximas delas colocar os seus contactos que são habituais”, aconselha Bernardo Gomes, médico de saúde pública e professor na Faculdade de Medicina e no Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto. “Ao organizar as mesas de jantar ou de almoço de Natal, [aconselha-se] colocar as pessoas de maneira a que os agregados habituais fiquem juntos e eventualmente até separados por mesas, se assim for entendido. Isso é algo que se pode fazer para reduzir o risco”, diz, acrescentando que também se poderá organizar a distribuição da comida e as mesas por agregados familiares. “Se houver, por exemplo, a junção de dois agregados numerosos, é recomendável ter as coisas distribuídas para que a partilha de talheres [e travessas] seja feita, de alguma maneira, entre os agregados habituais”, nota.

Alguns especialistas ouvidos pelo PÚBLICO tinham também já aconselhado a que sejam feitas visitas ou reuniões familiares noutras alturas do dia em que não haja ajuntamentos à mesa, com distância e segurança.

Arejar os espaços e não partilhar utensílios nem toalhas

Bernardo Gomes destaca ainda que “não se consegue controlar o risco todo” no que diz respeito à utilização da máscara “porque, à medida que o tempo vai passando e as pessoas vão relaxando, esse controlo perde-se com facilidade”. “Portanto, a melhor forma de controlar é ter o mínimo de pessoas possível”, diz. Além disso, “é desejável que se areje os espaços, nomeadamente antes do início das refeições”. Porém, o especialista admite que “com o frio que vai estar, isso não é muito viável”, sendo “preferível optar por espaços mais amplos (se possível) em que as pessoas tenham mais distanciamento do que estar a depender da ventilação para manter a segurança”. Se o espaço for pequeno, “mais vale ter menos pessoas”.

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Guglielmo Mangiapane/REUTERS

Ricardo Mexia também sublinha a importância de manter uma boa renovação do ar e não partilhar talheres, copos nem outros utensílios. É também recomendável que as pessoas tentem não partilhar as toalhas da casa de banho, com as quais usualmente secam as mãos, optando, por exemplo, por toalhetes de papel descartável.

As recomendações são também partilhadas pela Direcção-Geral da Saúde, que apela às pessoas que cumpram todas as regras em vigor no seu concelho; não contactem com outras pessoas se estiverem em quarentena ou isolamento profiláctico; reduzam os convívios presenciais e o tempo de convívio; garantam o arejamento dos espaços e a desinfecção das superfícies; mantenham o distanciamento físico na preparação das refeições e evitem a partilha de objectos.

Teste não invalida manter “todas as outras cautelas”

Há também um apelo que é repetido pelos vários especialistas: se tiver sintomas compatíveis com a covid-19, não participe nas celebrações natalícias porque pode correr o risco de contagiar mais pessoas.

Dirigindo-se a quem fez um teste de diagnóstico à covid-19 antes da ceia de Natal, Ricardo Mexia salienta: “O facto de isso ter acontecido não é um factor para deixar de ter todas as outras cautelas.” “A questão dos testes é que se der positivo as pessoas naturalmente já não poderão interagir com outras, se der negativo devem ter exactamente os mesmos cuidados do que se não tivessem feito o teste”, reafirma.

À lista juntam-se as medidas “que já toda a gente sabe de cor e salteado”: distanciamento físico, utilização de máscara (quando não se está a comer), higiene das mãos e etiqueta respiratória. Manter a distância e utilizar máscara são também medidas recomendáveis durante a troca de presentes, explica o médico de saúde pública.

Um Natal “sem grandes abraços nem beijos”

Ricardo Mexia lembra também que é necessário evitar a proximidade entre os convivas, sem grandes abraços, beijos nem interacções. Já as pessoas mais vulneráveis, nomeadamente os idosos e aqueles que têm outras doenças associadas, “devem ter ainda mais cuidados”.

Outra recomendação passa por utilizar as plataformas digitais para manter o contacto com as pessoas que não estarão presentes no Natal este ano. É o caso de Celso Cunha, que vai recorrer à plataforma Zoom para “desejar bom Natal a todos e dar beijinhos à distância”. Caso não estejam acostumados com o uso destas plataformas e redes sociais, há sempre a opção das chamadas telefónicas para “partilhar alguns momentos na quadra natalícia mesmo à distância”. “Penso que fazer telefonemas para desejar um bom Natal a todos vai ser, com certeza, uma prática mais comum este ano”, salienta o especialista.

O último item da lista, destaca Ricardo Mexia, “é desejar que as pessoas percebam que este é, de facto, um ano excepcional”. “Estamos todos um bocado saturados, mas infelizmente a situação está muito complicada ainda e temos que adiar um pouco mais esta interacção de que todos temos saudades: os abraços, a proximidade.”

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