Conselho de Arbitragem admite abrir comunicações com o VAR em tempo real

Fontelas Gomes, presidente do CA, considerou, porém, que a divulgação das comunicações em tempo real levaria as pessoas a criticar “a forma como o árbitro e o VAR falaram e não a decisão”.

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Graham Scott, árbitro inglês, consulta as imagens num jogo da Premier League Reuters/ALEX PANTLING

O presidente do Conselho de Arbitragem (CA) da Federação Portuguesa de Futebol admitiu nesta segunda-feira abrir as comunicações entre árbitro e videoárbitro (VAR), em tempo real, mas sublinhou que é preciso “tempo, treino e aprendizagem” para dar esse passo.

Durante a conferência “VAR Future Challenges”, organizada pelo Sporting, José Fontelas Gomes frisou que “neste momento é muito difícil colocar em prática as comunicações em tempo real”, apesar de assumir que “no futuro, esta é a forma de dar maior transparência e credibilidade ao VAR”.

“Precisamos de tempo, treino e aprendizagem. No início, colocámos uns clips nos media para os adeptos perceberem que não havia ali quaisquer segredos, para as pessoas perceberem como trabalhámos com o VAR”, admitiu Fontelas Gomes, reconhecendo haver “muito trabalho para fazer nesta área”, admitiu Fontelas Gomes.

O presidente do CA considerou, porém, que a divulgação das comunicações em tempo real levaria as pessoas a criticar “a forma como o árbitro e o VAR falaram e não a decisão” em si e assumiu que “no futuro podemos fazer mais do que agora”. “A nossa opinião, neste momento, é de que precisamos de muitas horas de treino antes de podermos dar este passo”, sublinhou.

O exemplo do râguebi

A divulgação das comunicações entre árbitro e VAR foi o foco da discussão na conferência, depois de o antigo árbitro internacional de râguebi, Nigel Owens, referir que o que lhe causa maior transtorno ao assistir a um jogo de futebol é não perceber os motivos das decisões tomadas pelo VAR.

“Os treinadores, os jogadores e os espectadores não entendem o porquê da decisão. No râguebi, o árbitro explica, as pessoas vêem no ecrã e percebem, mas no futebol é difícil, porque o árbitro não explica. O que têm de fazer é que os árbitros possam explicar porque tomam ou mudam uma decisão. Isso vai fazer as pessoas perceberem e retira muita pressão”, aconselhou o árbitro galês.

O juiz frisou que se o árbitro tiver a oportunidade de explicar a sua decisão as pessoas “podem não concordar, mas percebem” os motivos e aconselhou a utilização do VAR apenas em situações claras e óbvias.

“Se existe a mínima dúvida, a decisão do árbitro deve prevalecer”, afirmou Owens, que defendeu também que a pressão das decisões deve ser colocada sobre o árbitro de campo que, desta forma, toma melhores decisões, enquanto tende a ser “preguiçoso” quando tem o apoio da tecnologia.

Imediatamente a seguir a Owens, o antigo árbitro internacional inglês de futebol, Keith Hackett, apoiou as palavras do seu congénere do râguebi e sublinhou que passar um slide nos ecrãs gigantes a dizer que o VAR está a analisar uma possível grande penalidade ou fora-de-jogo “não é suficiente”.

“Toda a gente deve poder ver e ouvir a decisão nos ecrãs gigantes. Eu quero ver as imagens que o VAR está a ver, quero ouvir o que o árbitro e o VAR estão a discutir. Funciona no râguebi”, exigiu o antigo diretor-geral do quadro de árbitros profissionais da Premier League.

"Abrir comunicações pode ser perigoso"

Hackett defendeu também que o árbitro de campo “toma melhores decisões quando a pressão está sobre os seus ombros” e socorreu-se de uma afirmação recente de David Ellearay, director-técnico do IFAB, o organismo que analisa e implementa as regras do futebol, para defender uma menor intervenção do VAR. “A questão que o VAR e o árbitro devem colocar-se não é se a decisão foi correcta, é se foi claramente incorrecta”, citou.

O contraditório foi lançado por Greg Barkey, árbitro da Liga norte-americana de futebol, que explicou que, à imagem de todos os desportos nos Estados Unidos, o futebol tem a preocupação de colocar os interesses dos adeptos no topo das prioridades, mas admitiu que ainda é cedo para “abrir o microfone”.

“Neste momento, os árbitros não estão habituados a falar nem com a comunicação social. Pedir-lhes que abram o microfone num momento de stress e pressão máxima de tomada de decisão pode ser perigoso e é injusto colocá-los nessa situação. Antes de acontecer, têm de ser treinados sobre como conduzir essa conversação, para assegurar que é clara”, sustentou Barkey.

A conferência “VAR Future Challenges”, organizada pelo Sporting, decorreu nesta segunda-feira numa plataforma digital e contou também com as intervenções de Helena Pires, directora-executiva da Liga Portugal, Paddy O'Brien, antigo presidente do quadro internacional de árbitros de râguebi, Gigs de Jong, director do Euro 2020, e Alexander Ernst, dirigente da Federação alemã.

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