Lisboa acaba com desconto de IMI para todos os senhorios e só dá isenção às rendas acessíveis

Orçamento municipal para 2021 prevê uma quebra de receitas a rondar os 48 milhões de euros.

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rui Gaudencio

A Câmara de Lisboa prepara-se para isentar do pagamento de IMI os proprietários que coloquem os seus imóveis em programas públicos de arrendamento acessível e para o agravar àqueles que tenham prédios devolutos. O novo regime municipal de benefícios fiscais vai ser discutido nas próximas semanas e, de acordo com o vice-presidente da autarquia, visa alinhar os incentivos às políticas de habitação do executivo socialista.

“Nós tínhamos consagrado, de há muito tempo a esta parte, um desconto de 20% para todas as fracções arrendadas na cidade”, disse João Paulo Saraiva esta sexta-feira. Agora, esse desconto vai terminar e, em vez disso, “quem praticar rendas acessíveis, nomeadamente através dos programas municipais, deixará de pagar IMI”. O autarca argumentou que o benefício até agora em vigor não distinguia os senhorios pelas rendas praticadas, que até podiam ser “especulativas”, mas que agora a política de incentivos ficará “completamente alinhada com a política municipal”.

No âmbito do seu programa Renda Segura, que pretende arrendar para subarrendar a preços mais baixos do que os do mercado, a câmara já tinha concedido uma isenção de IMI (e de IRS ou IRC) aos proprietários que aderissem. Acabando com o actual desconto de 20%, a expectativa da autarquia é que mais senhorios adiram a esse programa ou ao Programa de Arrendamento Acessível, gerido pelo Estado central.

Outra medida anunciada esta sexta-feira, durante a apresentação do orçamento municipal para 2021, diz respeito ao agravamento do IMI para os prédios devolutos em zonas de pressão urbanística. O imposto já podia ser até seis vezes superior ao normal em freguesias como Santa Maria Maior e São Vicente, mas a câmara vai alargar a regra a toda a cidade.

“Vamos propor que toda a cidade seja considerada zona de pressão urbanística. Já existia um agravamento e o que temos verificado é que os devolutos são reintegrados no mercado. Estamos convictos que, se nós ainda forçarmos um pouco mais o agravamento, a pressão para os fogos voltarem ao mercado vai ser ainda maior”, disse João Paulo Saraiva. A directora municipal de Finanças, Paula Costa, detalhou que existirão “vários escalões [de agravamento] de acordo com os anos de existência da situação de devoluto”.

Rombo de 200 milhões

Depois de ter ultrapassado os mil milhões em 2020, o orçamento municipal para 2021 fica-se pelos 900 milhões, em grande parte por causa de uma queda de 48 milhões esperada para a coluna das receitas. A taxa turística, por exemplo, só deverá render 14,5 milhões, quando o que se orçamentou para este ano foram 33 milhões – e só se cobraram 12.

Até agora, disse o vice-presidente e vereador das Finanças, a pandemia de covid-19 traduziu-se num impacto de 200 milhões de euros para os cofres municipais – 100 milhões de receita perdida e 100 milhões de despesa a mais. A autarquia teve mesmo de recorrer ao pé-de-meia que estava a amealhar há vários anos para fazer face a eventuais decisões judiciais, como a que se espera do caso Bragaparques, para acudir às necessidades causadas pela doença.

Só na Carris, que agora está a funcionar ligeiramente acima dos níveis normais para a época mas ainda com quebras significativas de passageiros, o impacto negativo foi até agora de 22 milhões de euros. Ainda assim, João Paulo Saraiva afirmou que as contas municipais estão saudáveis, que existe uma reserva de contingência de 85 milhões e que podem ser contraídos empréstimos junto do Estado.

“O orçamento reflecte a prioridade máxima que demos, e vamos continuar a dar, à emergência, ao apoio para aqueles que mais precisam”, garantiu, reconhecendo que “o impacto social desta pandemia vai continuar a ser muitíssimo extenso e profundo”.

O Fundo de Emergência Social, que em Abril recebera uma dotação extraordinária de 25 milhões de euros, terá no próximo ano 6,8 milhões para as famílias mais carenciadas, enquanto para apoio ao comércio e restauração estão destinados 20 milhões e para os agentes culturais há 7 milhões.

Trata-se de “sectores essenciais à economia da cidade”, disse Saraiva. “Precisámos deles para crescer, temos de fazer tudo para não os deixar morrer nem os deixar à sua sorte. Tanto nos deram no desenvolvimento da cidade nos últimos anos. Se não for a nossa ajuda e a nossa solidariedade, terão dificuldade em sobreviver.”

SRU com 79 milhões

Num ano atípico em tudo, João Paulo Saraiva não mostrou os habituais gráficos com a política fiscal dos municípios da área metropolitana nem com a evolução da dívida, mas disse que “há uma preocupação de sustentabilidade no orçamento” e que o município tem uma margem de endividamento confortável. “Investiremos o que for necessário para fazer face a esta pandemia e às suas consequências.”

Em 2021, ano eleitoral, o documento privilegia as prioridades políticas do executivo de Fernando Medina, com destaque para o Programa de Renda Acessível, que está lentamente a sair do papel – ainda muito longe, contudo, das 6000 casas prometidas – e para a mobilidade. Neste âmbito, estão prometidos mais 52,2 milhões de euros para a Carris e mais 18 milhões para a EMEL.

Do universo de empresas municipais, a Sociedade de Reabilitação Urbana (SRU) é a que mais vê crescer a sua dotação, dos 37 para os 79 milhões de euros. Esta empresa está desde há dois anos vocacionada para a gestão de grandes empreitadas, estando-lhe entregues a construção ou reabilitação de centros de saúde, escolas e creches, bem como toda a habitação e até as intervenções em espaço público.

No capítulo das grandes empreitadas, é em 2021 que devem arrancar as obras de construção dos dois grandes túneis de drenagem. A adjudicação deverá ser feita em Dezembro, revelou João Paulo Saraiva, e o peso orçamental para o próximo ano é de 35 milhões (de um total de 140 milhões).

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