Os Quatro e Meia: “A luta contra o tempo é absolutamente titânica”

Os Quatro e Meia lançam esta terça-feira ao vivo, em Coimbra, o seu novo disco O Tempo Vai Esperar, que estará nas lojas a partir de sexta-feira. É no Convento de São Francisco, já esgotado, às 21h30.

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Os Quatro e Meia ARLINDO CAMACHO

Foi sem intenção, mas o título do novo disco d’Os Quatro e Meia acabou por ser premonitório. Anunciado em Fevereiro para ser lançado em Abril, a covid-19 obrigou-o a uma espera de seis meses. O Tempo Vai Esperar chega às lojas dia 25, mas é estreado ao vivo esta terça-feira em Coimbra, a cidade que viu nascer o grupo. Será no Convento de São Francisco, às 21h30.

Quem são Os Quatro e Meia? Na verdade, são seis. Mas no dia 25 de Maio de 2013, quando actuaram pela primeira vez (a convite) num sarau no Teatro Académico Gil Vicente, em Coimbra, eram cinco. O nome Quatro e Meia deveu-se a uma piada com a baixa estatura de um deles, o contrabaixista. Pegou e ficou, mesmo quando pouco depois se lhes juntava um sexto elemento, na percussão. E assim se consolidou o grupo, que tem vindo a ganhar popularidade e a encher salas, onde quer que se apresente (mesmo nos coliseus): Ricardo Liz Almeida (guitarra e voz), Tiago Nogueira (guitarra e voz), Mário Correia Ferreira (acordeão e voz), João Cristóvão Rodrigues (violino e bandolim) — professor de música, Pedro Figueiredo (percussão) e Rui Marques (contrabaixo).

Um aliado e um inimigo

Em vésperas da estreia, Os Quatro e Meia explicaram ao PÚBLICO como chegaram até aqui. E como o título do novo disco remete para algo que é relevante para eles: “O tempo tem sido um elemento marcante nas nossas vidas. Para além de sermos músicos, temos outras profissões e a gestão do tempo tem tido um lugar muito crítico aí. O tempo tanto pode ser nosso aliado como nosso inimigo. E a nossa forma de ver as coisas varia um bocadinho com o nosso estado de espírito. Existem temas como O tempo vai esperar, com uma mensagem de esperança, e outros com um ponto de vista diferente. O tempo tem sido bastante pródigo a dar-nos ideias e letras.”

E as ideias nascem entre a música e as outras ocupações. “Nós já nos conhecíamos do tempo da faculdade. Na altura do sarau de 2013 uns já estavam a trabalhar e outros ainda a estudar.” Isso em Coimbra, embora só Tiago e João sejam daí naturais. Os outros vêm de lugares como a Sertã (Mário), Braga (Ricardo), Águeda (Pedro) e Carregal do Sal (Rui). “Coimbra é que nos uniu”. Com idades que vão dos 29 aos 34 anos, João é professor de música, Rui é engenheiro civil, Tiago é cirurgião torácico, Mário é informático (“dedica-se actualmente sobretudo à criação de conteúdos de vídeo”), Ricardo é médico pediatra e Pedro é médico de medicina geral e familiar.

A reboque dos concertos

Em Dezembro de 2018, o cantor e compositor portuense Miguel Araújo escreveu numa das suas crónicas na revista Visão: “Decore: Os Quatro e Meia. Agora esqueça este nome. Se forem tocar à sua terra, não faça caso, evite, tape os olhos e os ouvidos. Não vá, por algum azar, calhar de entrar e ficar arrepiado do princípio ao fim e, pior ainda, reconciliar-se com a infância que passou a adolescência toda a querer não ter tido.” Sabia do que falava. Em Janeiro desse mesmo ano, Miguel Araújo foi um dos músicos que se juntaram ao grupo, como convidado, para um concerto entusiástico no Convento de São Francisco, que pode ser visto na íntegra no YouTube. E lá estiveram também João Só, João Gil, Mendes e Tiago Nacarato, a acompanhar canções do disco de estreia do grupo (Pontos nos Is, 2017) e ouvindo já algumas do novo, como Bom rapaz (que veio a ser gravada em single com Carlão), O tempo vai esperar ou Se eu pudesse voltar.

“Na verdade, temos feito os discos quase a reboque daquilo que fazemos nos concertos. Com o João Só [produtor deste novo disco], a nossa relação é mais antiga, vem do início. Um dos nossos primeiros concertos foi em Alvaiázere, onde o João também estava, e nesse dia criámos uma relação que se mantém até hoje e ainda bem. E quando soubemos que ele tinha o seu próprio estúdio e estava a começar a produzir outros artistas, foi uma escolha natural decidirmos trabalhar com ele.” Com João, vieram outros músicos para colaborar no disco, como Carlão ou Tatanka.

Influências? Consoante as experiências de cada um, a música tradicional, o jazz, a clássica, a pop. “Não é raro as pessoas associaram-nos ao Miguel Araújo, ao António Zambujo, aos Trovante, até ao Sérgio Godinho, ao Fausto, ao Zeca Afonso. E de facto, se nós começarmos a fazer contas e a olhar para trás, reconhecemos que passamos anos a ouvir esses músicos e que provavelmente isso se reflecte na nossa música, ainda que não sejamos os primeiros a reconhecê-lo. Mas ouvimos muita música estrangeira, inglesa, espanhola, francesa, onde também vamos buscar ideias.”

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Moldados pelo tempo

A capa de O Tempo Vai Esperar tem, como num decalque da evolução da espécie, um desenho onde se alinham seis seres de diferentes idades, desde um bebé a um idoso com um megafone. “Nós gostamos muito da imagem do disco. Queríamos sobretudo que a capa espelhasse esta luta contra o tempo, que é absolutamente titânica, mas também mostrasse uma ideia de crescimento. Que o tempo nos enriquece, nos molda e nos faz melhores. E achámos importante mostrar desde o bebé até ao idoso, que de certa forma quase que grita para ser ouvido. E infelizmente é uma realidade: quando chegamos a esse patamar da vida, é preciso gritar para nos fazermos ouvir.”

No concerto desta terça-feira, o Convento de São Francisco vai ter uma lotação “muito abaixo do normal”, devido às directrizes da Direcção-Geral da Saúde [serão 470].” No fundo, o concerto é um prémio para as pessoas que compram o álbum previamente [o bilhete dá direito ao disco, CD ou LP, que depois será entregue em casa]. Mas não esperávamos que esgotasse tão rapidamente, até porque os tempos ainda são de algum medo e as pessoas podiam não se sentir à vontade a ir para um espaço fechado. Mas as coisas foram feitas de modo a que toda a gente se sinta segura.”

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