Crianças sem documentos: MAI diz que práticas diferentes da lei “serão corrigidas pelo SEF”

O Ministério da Administração Interna respondeu à notícia do PÚBLICO sobre denuncia de regra que mudou no SEF: crianças nascidas em Portugal com menos de três anos, filhas de quem ainda não tem autorização de residência, já não podem regularizar-se e ficam sem direito a abono ou apoios sociais.

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PAULO PIMENTA

O Ministério da Administração Interna (MAI) afirma que “quaisquer práticas administrativas com interpretação diversa da lei serão corrigidas pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF)”. Em resposta a uma notícia do PÚBLICO na qual a Associação Olho Vivo denunciava que o SEF estava a impedir a regularização de crianças com menos de três nascidas em Portugal, filhas de pais em situação irregular, o MAI disse ainda que “eventuais situações concretas daí decorrentes serão reanalisadas de acordo com os critérios da Lei de Estrangeiros”.​ 

Antes, as crianças que nasciam em Portugal podiam regularizar-se mais cedo, mas neste momento só se pode fazer “o agendamento a partir do momento em que a criança tem três anos”, afirmou Flora Silva, a dirigente da Olho Vivo que há anos apoia imigrantes, nomeadamente nos processos de regularização. Por várias vezes Flora Silva tentou fazer agendamentos no SEF para estas situações e a resposta foi sempre a mesma: teria de esperar até aos três anos mas não explicaram o porquê da alteração.

O SEF, questionado pelo PÚBLICO, não deu resposta em tempo útil. O MAI clarifica agora que, tal como o PÚBLICO referia, a lei “não estabelece qualquer patamar etário para a concessão de autorização de residência a menores”, independentemente da situação dos pais.

Na lei de estrangeiros não há nada que imponha esta regra dos três anos. Segundo a lei, as crianças estrangeiras nascidas em Portugal, filhas de pais que ainda não estão regularizados, têm direito a pedir autorização de residência desde que estejam a frequentar o ensino pré-escolar e os pais apresentem prova de meios de subsistência.

Crianças que estavam na creche podiam fazer esse pedido, afirmou Flora Silva. Mas desde há pouco tempo — e Flora Silva não soube precisar a partir de quando — que foi introduzido um novo critério, “que não sabemos de onde vem”: a criança precisa de ter três anos para efectuar o pedido de residência. “Portanto, a criança fica durante este período sem abono de família, sem direitos mesmo estando os pais a trabalhar e a descontar… É um grande retrocesso”, critica. “Achamos que é uma grande injustiça a criança ficar indocumentada, e durante um período muito longo: é como se não existisse, numa altura em que as despesas com a educação são muito elevadas.”

 A lei de estrangeiros refere que os menores nascidos em Portugal beneficiam de estatuto de residente idêntico ao concedido a qualquer dos seus progenitores. Nas notas de comentários à lei no site do SEF diz-se que a regularização documental de uma criança “é desde logo importante para melhor usufruir de direitos básicos, como os que se referem à sua saúde e educação” e que mesmo em relação aos menores que estão no país de forma irregular o Estado deve “proporcionar o benefício desses direitos”, segundo a Convenção dos Direitos da Criança. Esta convenção estipula que os seus signatários, como Portugal, “comprometem-se a respeitar e a garantir os direitos previstos (…) a todas as crianças que se encontrem sujeitas à sua jurisdição, sem discriminação alguma, independentemente de qualquer consideração de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra da criança, de seus pais ou representantes legais, ou da sua origem nacional, étnica ou social, fortuna, incapacidade, nascimento ou de qualquer outra situação”.

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