Ai Weiwei em entrevista exclusiva esta sexta-feira ao Ípsilon: “A China é como um vírus”

O artista chinês, autor do filme Coronation, filmado numa cidade de Wuhan em confinamento, dispara críticas a Pequim e ao Ocidente.

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Diogo Ventura

À beira de uma piscina, numa propriedade no Alentejo, o artista e opositor ao regime chinês Ai Weiwei deixa um aviso, em entrevista exclusiva para o Ípsilon (a ler na íntegra na edição desta sexta-feira): a China, tal como um vírus, está a alastrar pelo mundo e o Ocidente ainda não percebeu até que ponto já foi infectado.

Exilado – e ultimamente a passar algum tempo em Portugal, onde tem um projecto que ainda não quer revelar –, Ai Weiwei conseguiu, apesar disso, lançar um filme, Coronation, com imagens captadas em Wuhan, o centro inicial da pandemia de covid-19. Aí vemos os tempos iniciais do confinamento na cidade, entramos nos hospitais e assistimos à entrega das cinzas dos mortos por covid aos familiares.

O filme, feito com uma equipa de pessoas que habitualmente trabalha com Weiwei e que estava em Wuhan desde o início da pandemia, mostra ao mesmo tempo a eficácia da máquina chinesa e a forma como os direitos dos indivíduos acabam triturados em nome dessa mesma eficácia. À distância, o artista foi orientando as filmagens e posteriormente montou o filme com todo o material que foi recebendo – muitas horas de cenas, que, em alguns casos, manteve propositadamente longas.

Na conversa com o Ípsilon, Weiwei não poupa ninguém: a China nunca disse a verdade, denuncia o artista. Mas a Organização Mundial de Saúde foi cúmplice nesse silenciamento, sublinha. Tal como a Administração Trump, inicialmente mais interessada em assinar um acordo comercial com Pequim do que em conter a pandemia.

Denuncia as práticas do regime chinês, mas ataca igualmente o sistema capitalista, que classifica como “uma filosofia muito egoísta”, avisando que o exercício da “verdade selectiva” poderá um dia levar o Ocidente ao colapso.

Fala também sobre o que o move, o que o faz, mesmo a partir do exílio, continuar a usar a sua arte e a atenção mediática que conquistou para denunciar o que considera ser o perigo de uma China cada vez mais poderosa e pronta a dominar o mundo. Descreve-se como “muito egoísta” e recusa a ideia de que o seu trabalho se destina a despertar consciências. Não receia o perigo, diz – é o que o “mantém desperto”.

No final da conversa, quando chegou o momento da sessão fotográfica, dispôs-se a fazer dois tipos de fotografias: umas “secas” e outras “molhadas”. Ficou claro que estava disponível para entrar na piscina para ser fotografado. Inicialmente, encostou-se a um pilar, deixou-se fotografar sem particular entusiasmo, e guardou todo o seu empenho para o momento seguinte.

Calmamente, despiu a t-shirt, ficou em calções de banho, e mergulhou. Atravessou a piscina três vezes debaixo de água. Percebemos, ao vir acima, que estivera de olhos abertos para acompanhar o trabalho do fotógrafo. Ficou claro – se ainda não o era, para quem conhece a sua obra – que Ai Weiwei tem a absoluta noção da força de uma imagem.

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