Governo prepara proposta para adaptar teletrabalho no público e no privado

Equipas das ministras do Trabalho e Administração Pública vão estudar regulamentação em conjunto. Quadros Técnicos do Estado defendem que teletrabalho deve ser aceite se um trabalhador com um filho até aos 12 anos o pedir.

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As regras do teletrabalho do Código do Trabalho aplicam-se supletivamente na administração pública Adriano Miranda

Depois de três reuniões técnicas com os sindicatos da administração pública, o Governo vai preparar uma proposta com ajustes às regras do teletrabalho, a aplicar tanto aos trabalhadores do sector público, como aos do sector privado.

“Apesar das especificidades de cada um, há questões inerentes ao teletrabalho que são comuns” e que “devem ser trabalhadas conjuntamente”, indica o gabinete da ministra da Modernização do Estado e Administração Pública numa nota enviada às redacções no final das reuniões desta sexta-feira.

O Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado e Entidades com Fins Públicos (STE) já tinha revelado a meio da manhã que a área governativa da Administração Pública iria reunir-se com a área do Trabalho “para preparar uma proposta de alteração legislativa aplicável a todos os trabalhadores, quer da Administração Pública quer do sector privado”.

O Governo não indica quando o fará, mas entre as estruturas sindicais há a expectativa de que isso acontecerá em breve, ainda antes de Setembro ou no início desse mês.

Entre 2008 e 2014, o teletrabalho na função pública chegou a estar consagrado especificamente no Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, mas depois disso passou a seguir supletivamente as normas gerais previstas no Código do Trabalho (artigo 166.º).

Com a pandemia, a realidade mudou, a necessidade de revisitar a lei também, e as conversas com os sindicatos começaram.

Entretanto, o Governo recebeu “contributos escritos” do STE e da Federação de Sindicatos da Administração Pública (Fesap) e irá agora analisá-los antes de concluir a proposta.

STE defende regulamentação idêntica

A presidente do STE, Helena Rodrigues, considera que a regulamentação detalhada deve ser feita de forma idêntica para os trabalhadores públicos e privados, sendo que, no caso da administração pública, deve aplicar-se a todas as carreiras e às administrações central, local e regional.

O documento que o STE preparou inclui algumas sugestões e reivindicações específicas, designadamente para que o empregador não possa recusar aplicar o teletrabalho se essa modalidade for pedida por um trabalhador “com deficiência, com grau de incapacidade igual ou superior a 60%” ou por um trabalhador com um filho menor de 12 anos.

“Sempre que as funções sejam compatíveis, entendemos que deve existir [essa possibilidade]”, afirma Helena Rodrigues, defendendo que os objectivos do teletrabalho devem ter em conta a estratégia verde, incluindo a necessidade de o país “aliviar as cidades do tráfego”.

Do ponto de vista legal, Helena Rodrigues diz que uma das questões mais importantes que o Governo deve ter em conta é a de definir que o teletrabalho deve ser encarado como uma forma de prestação subordinada, isto é, que depende da existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado, para salvaguardar a posição laboral dos trabalhadores, havendo a possibilidade de ser revertida (isto é, a pessoa passar para a modalidade presencial nos serviços ou numa empresa).

Da mesma forma, o STE defende como princípio que o teletrabalho aconteça “sempre por iniciativa do trabalhador e nunca pode ser imposto unilateralmente pelo empregador”, com a possibilidade de haver teletrabalho total ou parcial. E entende que deve ficar garantido de forma efectiva, apesar de o Código do Trabalho já prever esse princípio, que os trabalhadores “gozam dos mesmos direitos dos restantes trabalhadores em regime presencial (nomeadamente, acidentes de trabalho, formação, e de representação sindical)”.

Relativamente a outras questões, a frente sindical pede que fique regulamentado que as “reuniões ou teleconferências devem ser previamente agendadas, para salvaguarda da privacidade do trabalhador e da sua família”; e que todas as ferramentas de trabalho (como os computadores, os telefones fixos ou os telemóveis de trabalho, o hardware associado à subscrição de telecomunicações, as impressoras) “devem ser fornecidas pela entidade empregadora”.

O Governo tem como meta ter em teletrabalho, até 2023, pelo menos 25% dos trabalhadores da administração pública, o que corresponde a um universo de cerca de 17 mil funcionários públicos.

Fesap apela à clarificação de responsabilidades

A Fesap tem chamado a atenção para a necessidade de ficar salvaguardada a conciliação entre a vida profissional e pessoal (impedindo que haja uma desregulamentação do tempo de trabalho) e a consagração do “direito a desligar”, algo que a ministra da Administração Pública, Alexandra Leitão, desde o início considerou necessário atender.

Também defende ser necessário compensar os trabalhadores pelo eventual acréscimo de custos com o teletrabalho.

O secretário-geral, José Abraão, admite que, além de se olhar para o Código do Trabalho, seja também preciso “densificar” a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, nomeadamente para valorizar a negociação colectiva no processo de definição do teletrabalho, dadas as “várias realidades” e vínculos que existem na administração pública. Abraão diz ser preciso “evitar o que já está a acontecer hoje, em que há empregadores a apresentar contratos que transferem responsabilidades dos serviços para os trabalhadores”.

Na reunião desta sexta-feira, o Governo esteve representado pelo secretário de Estado da Administração Pública, José Couto.

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