Presidente da Câmara de Castelo Branco perde mandato

Depois de ter sido alvo de três decisões condenatórias, Luís Correia, eleito pelo PS, vê o Tribunal Constitucional negar-lhe apreciação do recurso que entregou numa derradeira tentativa de evitar a perda de mandato.

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Luís Correia tem dez dias para abandonar o cargo de presidente da Câmara de Castelo Branco ANTONIO JOSE

A pouco mais de um ano das eleições locais, o presidente da Câmara de Castelo Branco perde o mandato autárquico para o qual foi eleito (pela segunda vez) nas listas do PS. O seu advogado, Artur Marques, afirma que Luís Correia poderá ser de novo candidato em 2021, mas isso pode não acontecer porque o autarca é alvo de um processo-crime que aguarda julgamento e que pode resultar na sua ineligibilidade.

O Tribunal Constitucional julgou improcedente o último recurso decidido pela conferência de juízes apresentado por Artur Marques. A decisão do TC foi tomada no dia 14 de Julho, mas só esta terça-feira foi conhecida.

De acordo com o que o advogado disse ao PÚBLICO, Luís Correia tem até ao dia 30 de Julho para abandonar a presidência da Câmara de Castelo Branco, mas o autarca já tornou público que sai no dia 27. José Augusto Alves, actual vice-presidente do executivo municipal, irá substituí-lo no cargo.

Perante a decisão de perda de mandato pelo TC, Luís Correia informa, em comunicado, que sai de “consciência tranquila”. “Ver um erro administrativo punido como se de um crime grave ou gravoso se tivesse tratado é lamentável e injusto. Reafirmo que nunca, em qualquer momento, prejudiquei Castelo Branco, a autarquia ou os albicastrenses”, sublinha o autarca em comunicado.

Luís Correia repudia a “campanha difamatória e demagógica” de que diz ter sido alvo e acrescenta: “Não pode valer tudo pela sede de poder. Este tem sido um processo altamente desgastante. Para mim, em termos pessoais, profissionais e institucionais, mas também para a minha família, que, lamentavelmente, se viu arrastada para uma situação que não criou e que não merece”.

 Em Abril deste ano, o Ministério Público do Departamento Regional de Investigação e Acção Penal de Coimbra deduziu também acusação contra o autarca do PS, a quem imputa a prática de crime de prevaricação de titular de cargo político. Em causa está a intervenção de Luís Correia, enquanto líder da autarquia, na “contratação e aquisição de serviços por parte do município, em violação de impedimentos legais”, alegou o Ministério Público (MP) requerendo, em caso de condenação definitiva, “a perda do mandato político” do autarca socialista.

Casado com a deputada PS, Hortense Martins, o autarca albicastrense já havido sido condenado à perda do mandato pelos mesmos factos por outras instâncias, nomeadamente pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA), de cuja decisão recorreu para o Tribunal Constitucional. Acontece que, agora, com um processo-crime a juntar-se ao processo administrativo, o autarca e ex-presidente da concelhia socialista de Castelo Branco vê em jogo na justiça não apenas a perda de um mandato já conquistado, mas a própria elegibilidade para um ulterior terceiro mandato.

Alega o MP - como já sucedeu no processo administrativo - que Luís Correia, “valendo-se do seu cargo para satisfação de interesses de natureza meramente privada, actuou em grave violação dos deveres inerentes às suas funções, quebrando, deste modo, a confiança, que nele foi depositada para o seu adequado exercício”. Assim “deverá ser declarada perda de mandato político que o arguido Luís Manuel dos Santos Correia vem exercendo actualmente (ou que venha a exercer) o que ora se requer”.

Neste processo-crime, além do autarca, também foram acusados dois empresários: Alfredo da Silva Correia, pai do presidente da câmara; e Eugénio Martins Camelo. Os dois empresários têm ligações à empresa Strualbi, Estruturas de Alumínio, Lda, uma sociedade por quotas que fez vários contratos e ajustes directos com a Câmara de Castelo Branco, antes e depois de Luís Correia ter assumido a presidência do município. Alfredo da Silva Correia é sócio da Strualbi, “tendo sido igualmente gerente da mesma pelo menos no período de 2010 a 2106. Eugénio Martins Camelo é sócio da firma.

A investigação incide sobre factos ocorridos entre 2013 (ano em que Luís Correia foi eleito pela primeira vez presidente) e 2016. De acordo com a acusação, “Luís Correia, enquanto presidente de câmara, estava impedido de contratualizar com a Strualbi, não podendo intervir em contrato de direito público ou privado com esta uma vez que da mesma eram sócios o seu pai (sócio gerente entre 2010-2016) e Eugénio Martins Camelo (que é sócio e gerente da firma).

“A Strualbi, por força da qualidade do presidente da câmara, estava impedida de participar me concurso de fornecimento e bens ou serviços, no exercício da actividade de comércio ou indústria, em contrato com o Estado e demais pessoas colectivas públicas, designadamente com a Câmara de Castelo Branco, uma vez que o arguido Alfredo Correia era sócio e gerente, detendo uma participação na sociedade superior a 10% e é pai de Luís Correia”, esclarece o MP.

Para o Ministério Público, Luís Correia decidiu “ignorar” os impedimentos legais e continuou a contratar a sociedade Strualbi ao longo dos mandatos autárquicos. Enquanto presidente da câmara, o socialista teve “intervenção directa” em vários procedimentos contratuais encetados pela autarquia, “autorizando a despesa, conduzindo, decidindo o procedimento e, quando necessário, outorgando no respectivo contrato”.

Na acusação, o MP aponta vários exemplos que provam a intervenção directa do autarca do PS num conjunto de adjudicações e revela que o município “pagou à Strualbi o montante de 160.199,03 euros que, em condições de observância legal das normas e dos princípios da contratação pública, designadamente isenção, imparcialidade, transparência e boa gestão dos dinheiros públicos, a mesma não auferiria”.

Sucede que a Strualbi não é a única empresa com ligações familiares ao autarca com a qual a Câmara de Castelo Branco contratualizou serviços. A Investel, Investimento Hoteleiros, Lda, uma sociedade por quotas, da qual faz parte a mulher do presidente da Câmara de Castelo Branco, a deputada Hortense Martins (PS), e o pai desta, Joaquim Martins, contratualizou serviços com o município e com Luís Correia como presidente. Contas feitas, diz o MP que os vários serviços prestados pela Investel custaram aos cofres da Câmara de Castelo Branco 2370,00 euros.

Refira-se que, além deste processo-crime, que aguarda julgamento, Luís Correia é alvo do já mencionado processo administrativo, cujos factos são os mesmos. Três tribunais já se tinham pronunciado pela perda do mandato.

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