Pandemia não demove estudantes portugueses de procurar universidades estrangeiras

Embora número total de estudantes portugueses a escolher estudar no estrangeiro se mantenha face a anos passados, isso deve-se em parte ao final do programa governamental britânico que facilitava o financiamento das propinas no país.

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Reino Unido tem sido o principal destino escolhido pelos estudantes portugueses LUSA/FERNANDO VILLAR

Os receios relacionados com a pandemia não são suficientes para abrandar a procura dos estudantes portugueses por universidades estrangeiras. É o que reportam empresas como a OK Estudante e a Information Planet, agências educativas internacionais que se dedicam a apoiar estudantes e famílias no processo de estudar fora do país

Embora tenha havido uma redução na procura destes serviços durante os meses de Março, Abril e Maio, “essa situação já se inverteu” e neste momento existe “uma procura acima do normal para a época”, conta ao PÚBLICO Miguel Covas, director da Information Planet em Portugal. Isso significa que a agência está a ultimar os preparativos para mais de mil estudantes portugueses ingressarem em universidades em cerca de 20 países, embora a maioria das questões feitas pelas famílias já não seja sobre o alojamento, mas sobre a pandemia.

A mesma tendência reporta a OK Estudante. Embora trabalhe apenas com o Reino Unido enquanto destino, até ao momento são mais de 1800 os estudantes que têm tudo acertado para seguir viagem, afirma o director de operações, João Cacelas. De facto, o Reino Unido é o destino mais escolhido pelos alunos portugueses - só no ano lectivo 2019/20, mais de 2500 estudantes nacionais escolheram universidades britânicas, segundo os dados da Universities and Colleges Admissions Service.​  Mas há outras opções como Alemanha, Dinamarca ou Países Baixos. Trata-se de “países de top mundial a nível de qualidade de ensino”, defende Miguel Covas.

Além disso, o “destronar” do Reino Unido pode estar para breve, já que o Brexit vai ditar o fim do programa governamental britânico Student Finance a partir do próximo ano lectivo. Este, entre outras regalias que trazia aos estudantes da União Europeia, garantia um empréstimo para financiamento do valor total das propinas — que podem chegar às dez mil libras anuais (mais de 11 mil euros) —, sendo pagas mais tarde pelos estudantes “mediante condições manifestamente boas”, informa Miguel Covas.

Com a mudança “é óbvio que muitas famílias não terão as condições financeiras” para suportar esses custos, sublinha João Cacelas. Essa terá sido uma das razões que levou a um “grande aumento” da procura pelo Reino Unido este ano e que ajuda a contrabalançar o número de estudantes que poderia ter desistido de estudar no estrangeiro devido à pandemia.

“Os estudantes vêem agora esta como a última oportunidade”, analisa Miguel Covas, da Information Planet. Serviu de empurrão motivacional, conta ao PÚBLICO Diogo Lopes, representante da De Montfort University para a Information Planet, em Leicester, onde, de um total de 28 mil alunos, cerca de oito mil são estrangeiros e o número de portugueses ronda os 300.

Uma vez que as regalias associadas ao programa se mantêm ao longo de todo o percurso académico, isso significa que há alunos do 11.º ano a preparar já as malas. Optam por um ano zero e assim “garantem uma continuidade a todos os benefícios de financiamento, residência permanente, acesso à segurança social e saúde”, explica Pedro Costa Mano, consultor da Information Planet.

Aulas online ou presenciais?

Aos 18 anos, Tomás Figueiredo já tem o processo pronto junto da Information Planet. O ensino secundário está concluído em Lisboa e o superior deverá ser feito na Universidade de Bristol, no curso de Engenharia Aeroespacial. A escolha deve-se “à qualidade do ensino e renome da universidade”, justifica. Segundo a mãe, Fernanda Figueiredo, “hoje em dia os estudantes não são de cá, são do mundo” e, por isso, “queria que ele tivesse oportunidade de escolher e não estar limitado a esta caixinha [Portugal]”.

Mas, e o medo da pandemia? “Tenho os meus receios e penso neles, mas expresso-os de uma forma contida”, revela. Já o filho diz que sente “um pouco de insegurança”, mas acredita que “esta é uma fase” que irá ultrapassar e que se vai “habituar” à realidade que se vive no Reino Unido.

O regime de aulas ainda é desconhecido. “Nem sei se vou ter aulas online, presenciais ou um misto”, confessa o estudante. Embora não haja uma data oficial para o início das aulas, aponta-se para final de Setembro ou início de Outubro. Caso sejam online, o jovem admite ficar em Portugal até que a situação seja alterada. “Isso faz com que não tenha aquela interacção social com os colegas para criar amizades e entrar em grupos, o que seria bastante importante, mas seriam só uns mesinhos a ser prejudicados”, aponta.

Ainda assim, Tomás está a fazer os exames nacionais que, embora não sejam obrigatórios para a universidade britânica, vão servir para se candidatar ao ensino superior em Portugal. A decisão foi tomada antes da pandemia, por aconselhamento dos pais, mas revela-se “ainda mais importante nesta fase”. “É uma rede de segurança”, admite.

O medo da pandemia também não desfez os planos de Maria Pereira. Aos 16 anos, termina agora o 11.º ano, e, através da OK Estudante, planeia ingressar na Brunel University, em Londres, ou na Algia Ruskin University, em Cambridge para fazer o “foundation year” (ano zero) num curso de gestão. “Já estou a pensar nisto há muito tempo”, revela, motivada pelas experiências do irmão que estuda em Espanha e da irmã que recentemente foi estudar também para o Reino Unido. O facto de este ano lectivo ser o último em que pode usufruir do student finance “está relacionado” com a sua decisão de nem acabar o ensino secundário em Portugal, mas revela que já estava a planear tudo “mesmo antes de ser conhecida essa decisão”.

Perante a pandemia, “a vida tem de continuar”, afirma Maria Pereira. Essa também “não é uma grande preocupação” para os pais, revela, até porque “está a acontecer em todo o mundo, pelo que é algo a que todos temos de nos adaptar”. A jovem também não sabe com que regime de aulas vai contar. “Acho que só vou saber quase quando as aulas começarem” e, caso se siga a via online, confessa que isso pode tornar a sua experiência “diferente, pelo menos no início”.

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