Abram as portas da reunião no Infarmed

Uma reunião alargada sobre a nossa saúde não pode obedecer aos rituais da maçonaria ou de um grupo de conspiradores. Se tudo o que lá se diz e discute é de inegável interesse público, os portugueses têm direito a sabê-lo.

Organizar à porta fechada uma reunião entre políticos e cientistas para discutir um problema de saúde pública só se explica de duas formas: ou os políticos e os especialistas querem esconder algo ao país ou consideram que o que ali se diz não está ao alcance da inteligência média dos cidadãos. Seja por uma ou por outra razão, esse espírito de segredo digno de uma seita é lamentável, absurdo e errado. O que se passou esta semana no final de mais um desses solenes conclaves no Infarmed é a prova de que não faz sentido manter as portas fechadas. As avaliações contraditórias sobre o que lá foi dito, os rumores desencontrados sobre irritações, zangas ou puxões de orelhas e a suspeita de que o espírito de compromisso entre políticos e cientistas acabou exigem uma de duas respostas: ou as reuniões do Infarmed deixam de se fazer por se tornarem um perturbante factor de ruído; ou abrem-se as suas portas para que todos os cidadãos possam saber com transparência o que lá se disse e passou.

Uma reunião alargada sobre a nossa saúde não pode obedecer aos rituais da maçonaria ou de um grupo de conspiradores. Se tudo o que lá se diz e discute é de inegável interesse público, os portugueses têm direito a sabê-lo. Se nada do que lá se fala é segredo de Estado, se todos os participantes são homens livres para divulgar os seus estudos sobre a covid-19 ou a manifestar as suas opiniões sobre como a combater, não se entende que tenham de o fazer numa sala fechada. Se é consensual que uma sociedade informada tem mais meios para se defender das infecções, não se percebe o secretismo. Terão medo que o povaréu não entenda o Rt, as curvas, ou a dimensão dos surtos?

O absurdo tornou-se desde o primeiro momento óbvio porque, no final dos encontros, os jornalistas faziam o seu trabalho, contactavam os presentes e, sob a capa do anonimato, levaram aos cidadãos as informações que supostamente deviam ficar em segredo. Agora que os especialistas têm mais dúvidas do que respostas para explicar os surtos em Lisboa, com as tréguas partidárias acabadas, agora que ficou claro que a DGS falhou, que os transportes não deram a resposta necessária ou que o coordenador do Governo para a região, Duarte Cordeiro, não coordenou coisa nenhuma, as portas fechadas não só não servirão a verdade, a transparência e o direito de acesso à informação: vão também fomentar um clima venenoso de intriga. Abram, por isso, as portas. Ou fechem-nas de vez.

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