Apesar do intervalo na poluição, “a crise climática não meteu férias durante a crise pandémica”

Os partidos discutiram esta sexta-feira quais as metas e as respectivas medidas que estão a ser estudadas para reduzir a emissão de gases poluentes e construir uma economia mais verde.

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Esta sexta-feira assinala-se o Dia Mundial do Ambiente Daniel Rocha

O Governo quer antecipar os investimentos previstos para atingir a neutralidade carbónica, afirmou esta sexta-feira o ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, no debate de urgência agendado pelo BE sobre “justiça climática e saída para as crises”, na data em que se assinala o dia mundial do Ambiente. No encerramento do debate, o ministro Matos Fernandes assinalou que “a transição para a economia verde e digital pode ser um catalisador da recuperação económica”. Mas apesar de todas as bancadas concordarem com a urgência do tema, o ambiente também aqueceu dentro das paredes do Parlamento. A bancada do PS admirou-se com os “discursos fofinhos” da direita “depois de ter deixado os projectos ambientais na gaveta enquanto foi Governo” e a bancada do CDS devolveu a responsabilidade, lembrando que “nessa gaveta [herdada] não havia dinheiro”.

O ministro Matos Fernandes repetiu a narrativa de que o programa socialista “está em linha com as prioridades que a Comissão Europeia identificou” e que por isso é “o momento de transformar a crise em mudança e preparar em Portugal um choque de investimentos públicos sustentáveis, que permitam dinamizar a economia de imediato”.

A antecipação dos objectivos passará por um novo leilão da capacidade solar, pela rede de infra-estruturas de mobilidade e infra-estruturas ambientais com a compra de navios verdes e apostando nas ciclovias, enumerou o ministro. Matos Fernandes disse ainda que o Governo apostará no ordenamento florestal e em cidades e casas mais verdes, nomeadamente com o apoio à eficiência energética dos edifícios.

A harmonia com a Europa foi também assinalada pelo líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, que notou que Portugal e a União Europeia entraram “num debate chave para responder à crise climática”. O deputado bloquista avisou que “não há respostas desgarradas” e que são exigidas “alterações profundas”. “Não se pode pensar a industrialização da Europa ou do país sem pensar numa alteração do modelo produtivo que acautele as alterações climáticas”, exemplificou.

“Repetir os erros do passado é uma opção a que não nos podemos dar ao luxo”, vincou, numa crítica à construção do novo aeroporto do Montijo. “Os mercados não respondem quando as populações necessitam, vimos isso aqui e nos EUA. Essa é uma lição importante. Aprender com esta crise é não avançar com o aeroporto do Montijo”, disse o deputado do BE, que esta sexta-feira apresentou a sua proposta para uma lei de Bases do Clima.

A crise climática não meteu férias durante a crise pandémica”, afirmou Pedro Filipe Soares. “E o que essa crise pandémica nos mostrou foi que vários dos negacionistas, como Trump e Bolsonaro, foram desmascarados. Voltaram a negar a ciência no combate ao coronavírus, como negaram as alterações climáticas, e com isso sacrificaram vidas humanas”, condenou.

A bioeconomia e o novo normal

Do lado do PS, Ricardo Pinheiro, chamou a atenção para as responsabilidades políticas das instituições e para a necessidade de investimento científico nas áreas da bioeconomia, privilegiando a tecnologia nacional. “Descarbonizar a economia é descarbonizar o processo político”, afirmou.

Também Luís Leite Ramos, do PSD, disse que é tempo de “criar um novo normal, mais eficiente, sustentável, resiliente”, apostando em “políticas, processos e iniciativas que garantam maior eficácia” e diminuindo a dependência externa de energia, sobretudo fóssil. O ministro Matos Fernandes responderia que “aquilo que o PSD chama de estratégia é pôr o país em saldo e acreditar que vem aí uma Autoeuropa”, numa referência ao programa do PSD. “Nós não pensamos assim”, respondeu o governante, entre queixas da bancada social-democrata.

O bloquista Jorge Costa criticou os vínculos energéticos que não permitem, por exemplo, que uma comunidade de vizinhos se junte para usufruir de uma produção eléctrica solar comum. “É preciso criar instrumentos legais que permitam agregar consumos de energia fotovoltaica para que se torne rentável no contexto doméstico”, bem como criar parcerias com municípios para melhorar a eficácia energética das habitações ao nível de isolamento, pediu. O desafio lançado pelo BE é de aumentar a capacidade instalada em 2 gigawatts até 2030.

Alma Rivera, do PCP, lembrou que a proposta de limitar o uso e plástico das distribuidoras foi chumbada, quando em contrapartida não se hesitou em taxar os sacos de plástico que os portugueses usam para ir às compras e lembrou a preocupação dos comunistas em combater a obsolescência programada dos equipamentos. A deputada elogiou o apoio ao passe social, mas pediu mais qualidade para os transportes públicos, especialmente nesta fase de pandemia. Em resposta às acusações do PCP quanto ao princípio de que “quem tem dinheiro, pode poluir”, o ministro respondeu que não se trata de pagar para poluir, “mas pagar porque polui”. “A fiscalidade tem uma importância muito grande”, defendeu.

O CDS, através do deputado João Gonçalves Pereira, assinalou o acordo entre a ONU, governos e ambientalistas para acelerar a descarbonização e pediu uma política de incentivos à renovação do material industrial que baixe os consumos de energia, mas que ofereça mais eficiência. Em resposta às críticas da bancada socialista, João Gonçalves Pereira disse que se a direita não fez mais pelo ambiente em anos anteriores foi porque não tinha dinheiro.

André Silva, deputado e líder do PAN, insistiu em medidas estruturais, que não passem por “levar areia para as praias que depois o mar leva”, mas de arranjar soluções para as populações nas orlas costeiras, exemplificou.

Mariana Silva, do PEV, lembrou que o Governo afirmou que estava na linha da frente das políticas ambientais, mas que muitas dessas políticas ainda não foram aplicadas e condenou a construção de um aeroporto no Montijo, numa área de reserva natural do Tejo. A deputada ecologista criticou “o vírus do lucro e da ganância”. Matos Fernandes respondeu que o país reduziu 8,5% das emissões, quando a média europeia rondou os 4%. “Não fique incomodada com o sucesso ambiental do seu país”, disse.

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