Cultura empregava mais de 160 mil portugueses em 2018, um quarto dos quais por conta própria

Segundo os dados estatísticos compilados pelo GEPAC, o trabalho no sector cultural cresceu 23,8% em apenas cinco anos, mas mesmo assim Portugal era o quarto país da União Europeia em que tem menor peso no total do emprego. A proporção de trabalhadores independentes, por sua vez, é “significativamente superior” à média.

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Nuno Ferreira Santos

Em 2018, o sector cultural empregava 160.600 pessoas em Portugal e um em cada quatro destes trabalhadores exercia a sua actividade por conta própria, segundo dados divulgados esta quarta-feira pelo Governo. As estatísticas foram compiladas pelo Gabinete de Estratégia, Planeamento e Avaliação Culturais (GEPAC), reportando-se ao emprego no sector cultural e incluindo dados comparativos com os outros países da União Europeia (UE).

Segundo o GEPAC, em 2018 o sector cultural representava 3,3% do total do emprego em Portugal. No contexto da UE, e ainda segundo estes dados, Portugal era então o quarto país com o menor peso de emprego cultural no total de emprego: abaixo, estavam apenas a Roménia, a Bulgária e a Eslováquia. No entanto, analisando o período entre 2013 e 2018, verifica-se que o número de trabalhadores portugueses nesta área aumentou 23,8%, ou seja, em cinco anos mais 30,9 mil pessoas passaram a trabalhar em actividades culturais e criativas.

Traçando o perfil-tipo do trabalhador do sector cultural em Portugal, o GEPAC descreve que é “homem, detentor de um nível de ensino superior, e que exerce a sua actividade em regime de trabalho por conta de outrem, a tempo completo e sendo esse o seu único emprego”. Uma em cada quatro pessoas, porém, trabalha em actividades culturais por conta própria, de forma independente, proporção [que] é significativamente superior à que se verifica para o total do emprego”.

No que toca a igualdade de género, em Portugal, as mulheres representavam 43,6% desta força de trabalho. No contexto da União Europeia, três países bálticos (Letónia, Lituânia e Estónia) registavam as percentagens mais elevadas de emprego cultural feminino, superior a 50%. Há ainda a salientar que em Portugal uma em cada cinco pessoas que trabalham na cultura tem menos de 30 anos.

De acordo com os critérios do Inquérito ao Emprego, do Instituto Nacional de Estatística, as profissões do sector cultural abrangem, entre outras, arquitectura, cinema, teatro, música, dança e outras artes de palco, actividades de rádio, televisão, edição de jornais, bibliotecas ou fabrico de instrumentos.

A reivindicação de um estatuto laboral e contributivo mais adequado à natureza tendencialmente intermitente e independente do trabalho artístico e cultural é uma reivindicação antiga que se tem intensificado nos últimos meses, dada a generalizada paralisação do sector forçada pela covid-19. O Ministério da Cultura anunciou entretanto a criação de um grupo de trabalho interministerial que, prometeu, deverá produzir resultados ainda este ano, para que o estatuto da intermitência possa entrar em vigor em 2021.

Precisamente para protestar contra a actual desprotecção de uma parte significativa desta mão-de-obra e exigir “medidas de emergência e de fundo”, o Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos, do Audiovisual e dos Músicos (Cena-STE), convocou para a próxima quinta-feira, 4 de Junho, uma dupla manifestação, no Porto e em Lisboa, que arrancará, respectivamente, da Avenida dos Aliados e do Terreiro de Paço, às 18h.

No comunicado em que anunciou o protesto, o sindicato recordava que “passaram-se quase três meses desde que a pandemia mudou a vida de todos e de forma muito violenta a dos músicos, trabalhadores de espectáculos e do audiovisual”. “Num sector em que domina a precariedade, os efeitos são catastróficos, e, à medida que os tempos passam, sem que sejam tomadas medidas de emergência e de fundo, as consequências são cada vez mais devastadoras e auguram um efeito prolongado sobre a vida dos profissionais e sobre a Cultura”, acrescentava.

No início de Março, começaram a ser adiados ou cancelados espectáculos na sequência das medidas de contingência definidas pelas autoridades para tentar travar a propagação do novo coronavírus. Segundo um inquérito promovido pelo Cena-STE, e cujos resultados foram anunciados no início de Abril, 98% dos trabalhadores do sector viram trabalhos cancelados, dos quais um terço por mais de 30 dias. Em termos financeiros, para os 1.300 inquiridos, as perdas representavam dois milhões de euros.

O inquérito, realizado na segunda quinzena de Março, já no contexto de confinamento, em resposta à pandemia, indicava ainda que 85% dos trabalhadores questionados são independentes e não têm qualquer protecção laboral. Com estes dados “desactualizados”, a organização irá agora promover um outro inquérito, “porque a situação só piorou”. “As pessoas que estavam numa situação dramática no dia 13 de Março estão numa situação muito mais dramática agora”, referia no passado dia 28 o dirigente sindical Rui Galveias.

Com o questionário, o Cena-STE encontrou, “como antevia, um sector precário, empobrecido e indefeso, que carece há muito tempo de um enquadramento legislativo adequado, que tenha em conta as suas características”. Por isso, além de exigirem de medidas de emergência, os profissionais da cultura defendem há décadas uma alteração no seu estatuto laboral.

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