Pacto Ecológico Europeu: transformar um desafio numa oportunidade histórica

A comemoração, hoje, do Dia Internacional da Energia apresenta-se como um momento oportuno para uma reflexão sobre este desafio. Um desafio que implica uma acção concertada, estratégica, coerente e, acima de tudo, conjunta, que envolva a comunidade científica, os actores políticos, a indústria, o sector financeiro e, muito importante, a sociedade civil e os consumidores.

A correlação entre a actividade humana – expressa de forma exuberante nos consumos energéticos assentes em combustíveis fósseis a ela associados – e os níveis de concentração de dióxido de carbono na atmosfera é no presente incontroversa e assente em evidências que reúnem um alargado consenso científico e político à escala global.

O aumento da temperatura superficial global média decorrente dos actuais níveis de concentração de dióxido de carbono atmosférico – acima das 410 ppm, com precedentes que remontam a mais de três milhões de anos, quando a temperatura global média superava em 2ºC a 3ºC o valor registado na era pré-industrial (antes de 1850) e o nível médio dos oceanos estava 15 a 25 metros acima do actual – cifra-se em 0,98ºC acima da média registada no período base: 1951-1980.

Aos impactos já evidentes deste aumento de temperatura no que passou a designar-se como “Alterações Climáticas” – destruição de recifes de coral, degelo na região do Árctico, aumento das ocorrências de inundação costeira – somam-se ainda outros que, em função do contínuo aumento da temperatura média, incluem a destruição e deslocalização de ecossistemas terrestres e marinhos, inundações pluviais, reduções na produção agrícola ou mesmo aumento das taxas de morbilidade e mortalidade relacionadas com o calor.

A resposta necessária à mitigação destes efeitos é não só urgente e global, como coloca um desafio humano sem precedentes e que abarca a forma como nos deslocamos, os nossos hábitos de consumo, a forma como produzimos ou até como ocupamos e utilizamos o solo: a transição energética. Um processo delicado e complexo, que visa a mudança estrutural dos sistemas energéticos e que deverá conduzir ao aumento da quota de energias renováveis, redução das emissões de gases com efeitos de estufa (GEE) e aumento da eficiência energética.

O Pacto Ecológico Europeu (PEE), comunicado em Dezembro último pela Comissão Europeia, constitui-se como a resposta a este desafio e estabelece uma estratégia de crescimento para a Europa assente numa economia sustentável. Tendo por base as ambiciosas metas de descarbonização existentes nas directivas da política energética europeia (Energy Roadmap 2050), de redução de 80% a 95% das emissões de gases com efeito de estufa, transpostas para o quadro nacional num objectivo de redução de 93% a 100% das emissões até 2050 (Plano Nacional Energia e Clima 2021-2030 e Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050), o PEE inclui um conjunto ambicioso de planos de investimento (mecanismo de transição justa), estratégia sectorial (indústria, produção agro-alimentar, biodiversidade, economia circular) e legislação (Lei Climática Europeia – em consulta pública – e Pacto Climático Europeu).

Como está bem patente na crise pandémica que atravessamos, também ela implicando uma resposta urgente e global, ciência e tecnologia são instrumentos vitais para esta resposta. Ao nível da energia, a comunidade científica europeia encontra um fórum na EERA – European Energy Research Alliance, que conta mais de 250 membros de 30 países, e está estruturada em 17 programas conjuntos que abarcam temas tão diversos como a energia solar de concentração, armazenamento de energia ou hidrogénio. Suportando as suas actividades de investigação num conjunto de infraestruturas às escalas nacional e europeia, de que é exemplo a Infraestrutura Nacional de Investigação em Energia Solar de Concentração (INIESC), integrada no Roteiro Nacional de Infraestruturas de Investigação e alinhada com o roteiro europeu equivalente (ESFRI, na sigla em inglês), a EERA procura, através da comunidade científica, um apoio efectivo ao Plano Estratégico de Tecnologia Energética (SET Plan), a transferência de conhecimento e tecnologia para a indústria e, em resultado disso, para a sociedade civil.

A comemoração do Dia Internacional da Energia apresenta-se como um momento oportuno para uma reflexão sobre este desafio. Um desafio que implica uma acção concertada, estratégica, coerente e, acima de tudo, conjunta, que envolva a comunidade científica, os actores políticos, a indústria, o sector financeiro e, muito importante, a sociedade civil e os consumidores. Um desafio que apresenta, também, oportunidades: para a indústria na criação de novos produtos e serviços, para a ciência na criação de novas soluções tecnológicas, para a sociedade civil na aceitação de novos paradigmas societais, para o consumidor na adopção de estilos de vida e de consumo mais sustentáveis (e, porque não, mais saudáveis).

Como enunciado pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, na sua comunicação ao Parlamento Europeu, “[…] o Pacto Ecológico Europeu é o momento ‘Homem na Lua’ para a Europa”. Para a Europa e para cada europeu, este é um desafio que apresenta, também, uma oportunidade histórica que importa abraçar.

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