O Tribunal Constitucional alemão desafiou a autoridade europeia: vamos sancioná-lo?

Na União Europeia não há qualquer ancoragem possível num federalismo político prévio, no sentido em que se pode defender tal tese nos EUA e na sua Constituição. Isso vale mesmo no caso da União Económica e Monetária, a área da UE que mais se aproxima dessa faceta federal.

1. O acórdão de 5 de Maio de 2020 do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha, com 94 páginas na tradução oficial em língua inglesa, continua a provocar ‘ondas de choque’ e perplexidade. Neste texto, vai olhar-se para as possíveis opções da União Europeia, em particular para a possibilidade de a Comissão, enquanto ‘guardiã dos tratados’, instaurar um processo por infracção à Alemanha no Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE). Pelo que se pode ler e ouvir nos últimos dias, essa possibilidade originou (bastante) entusiasmo na imprensa e entre certos juristas, sendo vista como a forma de repor justiça após a afronta que o Tribunal Constitucional da Alemanha ousou fazer à autoridade da União. Todavia, o caso é muito mais complexo do que imaginam os que se entusiasmaram com tal perspectiva. Na realidade, não é claro que seja um mecanismo eficaz de resolver o intricado problema das interpretações divergentes feitas pelo TJUE e pelo Tribunal Constitucional Federal alemão, no caso do programa de compras de dívida pública pelo Banco Central Europeu (BCE). Mas além disso, onde esse processo de infracção é de eficácia (ainda) mais duvidosa, é no ponto jurídico-político mais sensível da questão. O TJUE reivindica para si uma competência irrestrita de interpretar o direito da União, algo que o Tribunal Constitucional alemão não nega, enquanto princípio, mas traça limites em casos excepcionais onde o TJUE actue ultra vires (para além dos seus poderes). É necessário então explicar as razões pelas quais provavelmente não irá funcionar a via judicial e só uma saída política resolverá o impasse criado.

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