Estudo mostra que falar emite gotículas que duram pelo menos oito minutos

A descoberta pode explicar a frequência de casos de infecção pelo novo coronavírus em lares de idosos, conferências, navios e outros espaços fechados.

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Os investigadores dizem que falar mais alto produz mais gotículas Jon Nazca/Reuters

O acto de falar provoca a emissão de pequenas gotículas respiratórias que permanecem no ar pelo menos oito minutos — e potencialmente muito mais tempo —, de acordo com um estudo publicado esta quarta-feira. Os resultados podem ajudar explicar a frequência de surtos do novo coronavírus em lares de idosos, no seio familiar, em conferências, cruzeiros e outros espaços fechados onde exista uma circulação de ar limitada.

O relatório, de investigadores do Instituto Nacional da Diabetes e de Doenças Digestivas e Renais e da Universidade de Pensilvânia, nos EUA, foi publicado na revista académica Proceedings of the National Academy of Sciences, que usa o processo de peer-review (sistema de avaliação de artigos científicos pelos pares). Baseia-se numa experiência em que foi usada luz laser para estudar o número de gotículas que são emitidas através da fala humana.

A resposta: muitas.

“Observações altamente sensíveis de dispersões de luz laser relevam que a fala pode emitir milhares de gotículas de fluído oral por segundo”, lê-se no relatório.

Outras investigações têm referido que surtos do novo coronavírus num call center na Coreia do Sul, onde os empregados trabalhavam em proximidade, e também num restaurante lotado na China, levam alguns especialistas a suspeitar que o vírus altamente contagioso pode propagar-se através de aerossóis. A teoria permanece assunto de investigação e debate, com o consenso actual entre especialistas de que o vírus se propaga, por norma, através de gotículas respiratórias de grandes dimensões.

O novo estudo não envolveu amostras do novo coronavírus ou de qualquer outro vírus, mas analisou a forma como as pessoas emitem gotículas respiratórias quando falam. Em vez de observar gotículas de grandes dimensões, a experiência focou-se nas pequenas que permanecem muito mais tempo no ar. É possível que estas gotículas contenham partículas suficientes de um vírus capazes de representar uma carga infecciosa, notam os autores.

Falar mais alto produz mais gotículas, apontam ainda. O estudo estima que um minuto a “falar alto” gera “pelo menos mil núcleos de gotículas contento viriões que permanecem no ar” por mais de oito minutos.

“Esta visualização directa demonstra como o discurso normal gera gotículas que podem permanecer suspensas dezenas de minutos ou mais e são muito capazes de transmitir doenças em espaços restritos”, escrevem os autores.

Um vídeo a mostrar a experiência esteve a circular no início do mês passado nas redes sociais, numa altura em que as autoridades de saúde pública ainda estavam a discutir a possibilidade de recomendar o uso generalizado de máscaras à população. Na altura os Institutos Nacionais de Saúde, nos EUA, alertaram que a investigação era “altamente preliminar” e não deveria ser usada como base para medidas de saúde pública.

Pouco depois, no entanto, os Centros de Controlo e Prevenção de Doenças americanos recomendaram cobrir a cara em locais públicos onde o distanciamento social não podia ser facilmente mantido.

“Este estudo representa a medição mais precisa do tamanho, número e frequência de gotículas que saem da boca durante uma conversa normal e atingem ouvintes nas proximidades”, disse Benjamin Neuman, um virologista da Universidade de Texas A&M – Texarkana, que não participou na investigação.

“Este estudo não testa directamente se o vírus pode ser transmitido através da fala, mas apresenta um argumento circunstancial forte para a ideia de que gotículas emitidas durante uma conversa normal, em proximidade, podem ser grandes e frequentes o suficiente para representar um risco de transmissão do vírus SARS-CoV-2, ou de qualquer outro vírus, entre duas pessoas que não estão a utilizar máscaras”, diz Neuman.

“O discurso produz gotículas que respirar, por si só, não produz. Isso torna-se muito mais claro”, notou Andrew Noymer, um epidemiologista da Universidade de Califórnia, em Irvine, que também não esteve envolvido na investigação. “Tagarelas do mundo, tenham cuidado. Estão a pôr o resto das pessoas em risco.”

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post

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