Influencers devem ser responsabilizados se difundirem desinformação, defende investigador

Francisco Goiana da Silva justifica que os meios de comunicação são regulados e não existe qualquer lei para influencers, instagramers, youtubers e bloggers.

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Influencers podem alcançar mais pessoas do que os meios de comunicação tradicionais Francisco Romao Pereira

Os influencers deveriam ser responsabilizados no caso de partilharem desinformação, já que os conteúdos que difundem abrangem milhares de pessoas e poderão representar um perigo para a saúde pública, defende Francisco Goiana da Silva, co-autor de um estudo sobre desinformação na saúde.

O paradigma da transmissão de informação mudou e já não são apenas os grupos de comunicação social os “responsáveis e responsabilizáveis pela informação” que é transmitida, aponta o professor na Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade da Beira Interior e co-autor de “Desinformação e Saúde: Uma Perspectiva Bioética”, que venceu, este ano, o Prémio em Bioética João Lobo Antunes.

Influencers, instagramers, youtubers e bloggers. Esta é a terminologia utilizada para designar as pessoas que começaram a fazer carreira no mundo digital que surgiu no século XXI e cujo alcance é muito maior do que a generalidade dos órgãos de comunicação social. Estas pessoas “têm de ser, de alguma forma, responsabilizadas pelo impacto que aquilo que defendem e que apresentam tem nos seus ouvintes ou nos seus seguidores e, neste momento, a legislação actual não prevê isso”, defende Francisco Goiana da Silva.

O investigador faz um paralelismo entre, “por um lado, uma indústria dos media que é extremamente regulada e, por outro, uma indústria informal”, que tem cada vez mais influência, mas que não tem “qualquer tipo de regulação”.

Francisco Goiana da Silva dá um exemplo prático da necessidade de regulação destes “novos difusores de informação”: “A directora-geral da Saúde [Graça Freitas] encontra, no Facebook, um  influencer que tem 100.000 seguidores e que veicula uma informação que é um perigo para a saúde pública. Vimos isto até a acontecer com líderes políticos. A directora-geral da Saúde encontra isto e, neste momento, não há nenhuma forma formal, um canal estabelecido, através do qual possa notificar que aquela notícia não tem validade científica.”

O investigador lembra que um influencer é diferente de uma pessoa que apenas está presente nas redes sociais. O número de seguidores é muito superior e “deixa de ser só partilha de opinião” para começar a ser também “gerador de capital” e de rendimento.

Por isso, é necessário “haver uma revisão da legislação no sentido de fazer, nada mais, nada menos, do que assumir que estes novos veículos de informação existem e têm de ser responsabilizáveis pela informação que transmitem”. Mas, salvaguarda que esta responsabilização não pode ser baseada em censura: “Isto nunca pode ser feito à custa da violação do direito à opinião, à expressão.”

Falta de conhecimento e fake news

O professor propõe a criação de uma plataforma que reúna os órgãos de comunicação social portugueses, as autoridades sanitárias e os influencers, para permitir uma verificação correcta da informação que é divulgada, podendo impedir, inclusive, que chegue a ser difundida.

Em relação à saúde, “estamos a falar de uma área muito específica”, acrescenta, considerando que, neste campo, os órgãos de comunicação social não têm o “conhecimento técnico e as bases científicas para saberem o que é correcto”, acabando por divulgar notícias que citam estudos que carecem de validação científica. “Há artigos [científicos] que não devem ser partilhados porque são fracos e podem induzir em erro”, diz, uma vez que isso também é uma formar de propagar desinformação.

Por isso, Francisco Goiana da Silva destaca a necessidade de investir em plataformas nas quais “as entidades técnicas e científicas” possam “dar esse suporte” na exposição de fake news sobre saúde e relatórios científicos deficientes.

A combinação destes dois factores poderá contribuir para um novo tipo de literacia centrada na promoção “do espírito crítico” das pessoas. “O cidadão não tem falta de informação. O que tem é informação a mais e falta de capacidade de distinguir o trigo do joio”, realça, acrescentando que as autoridades nacionais e internacionais deveriam, por isso, “desenvolver ferramentas”, como uma checklist muito simples para que qualquer cidadão, independentemente do seu grau de escolaridade, consiga saber o que deve procurar numa notícia antes de a partilhar”.

O investigador lembra a necessidade, principalmente durante uma pandemia sobre a qual a comunidade científica ainda sabe pouco, de verificar a fonte das informações antes de partilhar uma possível “notícia falsa”, incluindo através do link dessa fonte, para saber se remete, de facto, para autoridades oficiais, como, por exemplo, a Direcção-Geral da Saúde ou a Organização Mundial da Saúde.

“Alguém que partilha mentiras, torna-se, por associação, mentirosa e, portanto, as pessoas têm de ter muito cuidado e rigor com tudo aquilo que partilham. Podem estar a veicular informação que pode colocar em risco a vida de terceiros”, conclui.

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