Quem ganha até 650 euros tem mais dificuldade em comprar máscaras por serem caras

Barómetro da Escola Nacional de Saúde Pública conclui que é também este grupo o que mais tem de sair para exercer a sua profissão. E que são as pessoas com menor rendimento e menos escolaridade as que menos informação têm sobre como usar as máscaras.

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LUSA/MÁRIO CRUZ

São as pessoas que ganham menos e as que têm menos escolaridade as que têm mais dificuldade em comprar máscaras por causa do preço e usá-las correctamente. E é este o grupo que mais precisa de sair para exercer a sua actividade profissional, concluiu o questionário Opinião Social do Barómetro Covid-19, realizado pela Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP).

O questionário realizado online recolheu, entre os dias 21 de Março e 17 Abril, 177.573 respostas. Ao longo destas semanas, várias perguntas têm sido colocadas para traçar o efeito da pandemia provocada pelo SARS-CoV-2 no país. A ENSP salienta, porém, que os resultados não devem ser generalizados à população portuguesa.

Os dados publicados esta terça-feira pela ENSP voltam a focar-se nas desigualdades. E uma delas tem a ver com a aquisição e utilização de máscaras, que agora é obrigatória nos transportes públicos ou em lojas e supermercados. De acordo com a informação recolhida, 60% das 2343 pessoas que responderam a esta questão disseram sentir dificuldades na aquisição de máscaras.

Os resultados mostram que quem ganha menos de 650 euros mensais reporta “até quatro vezes mais dificuldade em adquirir máscaras por estas serem caras”. “Ou seja cerca de uma em cada duas pessoas”, refere o comunicado da ENSP, que destaca que só “uma em cada dez pessoas com rendimentos superiores a 2000 euros” reporta essa dificuldade.

Para Sónia Dias, coordenadora científica do inquérito Opinião Social, “estes resultados são ainda mais inquietantes quando analisamos quem, por força de ter de se deslocar para o local de trabalho, tem maior exposição ao risco de contrair Covid-19”. Isto porque segundo os resultados, “54% das pessoas que ganham menos de 650 euros tem de se deslocar para o local de trabalho, enquanto 75% das pessoas com rendimentos superiores a 2500 euros estão a desenvolver a sua actividade profissional em teletrabalho.

“Os dados mostram-nos que são as pessoas menos escolarizadas que poderão estar mais expostas: 76% das pessoas com até ao 9.º ano de escolaridade tem de ir para o local de trabalho, enquanto esta proporção desce para 26% nas pessoas com ensino superior”, refere a investigadora no comunicado. São também estas as que mais referem não saber ou não se terem informado sobre como usar as máscaras.

Pouco mais de metade (51%) dos respondentes disse utilizar máscara sempre que sai de casa, enquanto 43% admitiu que só usa esta protecção em determinadas situações. “Dos que referem nunca usar máscara, um em cada dez idosos assume não usar máscara protectora”, salienta o comunicado.

O inquérito Opinião Social fez também uma análise ao acesso aos cuidados de saúde em função do escalão de rendimento. Com base nas respostas dadas por 4100 pessoas, concluiu que “é nos escalões mais baixos que se verificam proporções maiores de pessoas que, tendo necessidade, não tiveram consulta”. “Cerca de 1 em cada 2 pessoas cujo rendimento é inferir a 650 euros não tiveram consulta”, especifica.

O Alentejo foi a região onde se verificou a maior proporção de pessoas que não tiveram consulta (71%), seguindo-se a zona Centro (61%). “De entre as pessoas que necessitaram de uma consulta médica durante o período de covid-19, 73% dos idosos não a tiveram, em comparação com 55% das pessoas com idades entre os 46 e os 65 anos.” São igualmente os idosos que mais disseram não ter ido à urgência ou fazer um tratamento num serviço de saúde, quando comparado com os mais jovens.

Quem mais perdeu o rendimento?

A pergunta é lançada pela ENSP e os dados, que reportam a respostas dadas por 10.700 pessoas, permitiram perceber que são as pessoas com remunerações mais baixas, a camada mais jovem e a menos escolarizada quem está a ser mais afectada pela perda de rendimento.

Das pessoas cujo rendimento mensal é inferior a 650 euros, “duas em cada três referem tê-lo perdido durante a crise covid-19”: 40% de forma parcial e 25% de forma total. Quanto aos jovens entre os 16 e os 25 anos, também um em cada dois reportou ter perdido rendimento. Bem como metade dos que têm até ao 9.º ano de escolaridade.

O Algarve regista a maior proporção de pessoas que perderam rendimentos (57%), seguindo-se o Norte com 47% e o Centro com 42%. Foi também na região algarvia que mais pessoas que suspenderam a actividade profissional: 30%.

Segundo o comunicado, dados preliminares revelam que o número de participantes – 124 mil pessoas, neste caso - que refere obter rendimentos inferiores a 650 euros triplicou entre o questionário da primeira semana e da sétima. “Estes dados chamam a atenção para o facto de nos próximos tempos ainda se poderem agravar mais as vulnerabilidades socioeconómicas já existentes”, alerta a investigadora Sónia Dias.

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