Covid-19: Um espectáculo cancelado equivale a 18 artistas sem rendimento

Inquérito lançado pela Fundação GDA indica que, por cada espectáculo cancelado, ficaram sem rendimento, em média, 18 artistas, 1,3 profissionais de produção e 2,5 técnicos.

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A música é o sector mais afectado pela pandemia nas artes José Frade

Por cada espectáculo cancelado em Portugal, até 31 de Março, devido à pandemia da covid-19, 18 artistas ficaram sem rendimento, de acordo com os resultados de um inquérito promovido pela Fundação GDA (Gestão dos Direitos dos Artistas).

“O inquérito lançado pela GDA indica que, por cada espectáculo cancelado, ficaram sem rendimento, em média, 18 artistas, 1,3 profissionais de produção e 2,5 técnicos”, refere aquela estrutura num comunicado enviado à agência Lusa.

A GDA criou o inquérito em Março – depois de começarem a ser adiados ou cancelados espectáculos na sequência das medidas de contingência definidas pelas autoridades para tentar travar a propagação da covid-19 com o “objectivo de recolher dados que contribuam para avaliar a situação real vivida no sector das artes do espectáculo”.

Ao inquérito responderam, até 31 de Março, 992 profissionais, que deram conta do cancelamento de 4.287 espectáculos. A maioria dos que foram cancelados diz respeito à música (2.964), seguindo-se os de teatro (1.048) e os de dança (100). Na categoria “espectáculos de outra natureza”, foram reportados 175 cancelamentos.

Dos quase mil profissionais que responderam ao inquérito, a maioria são músicos (67%), seguindo-se depois actores (23%) e bailarinos (4%). Os restantes (6%) “provêm de outras profissões do espectáculo”.

A GDA destaca que os resultados do inquérito “acabam por reflectir muito as características da relevância da amostra”, uma vez que o mesmo foi promovido por uma cooperativa constituída por actores, bailarinos e músicos.

Considera a Fundação GDA que, “somados aos dados da Associação dos Músicos de Portugal (AMP) e do Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos, do Audiovisual e dos Músicos (Cena-STE), os resultados [deste inquérito] poderão contribuir para a construção de um retrato da situação que seja fiel à realidade dramática que está a ser vivida por muitos artistas em Portugal”.

Segundo a GDA, “a informação recolhida já foi discutida com a ministra da Cultura e com o Presidente da República, assim como com partidos com assento parlamentar e com o presidente da Associação Nacional de Municípios”.

Os resultados do inquérito da GDA complementam outros cujos resultados foram divulgados anteriormente por outras estruturas. Segundo um inquérito promovido pelo Cena-STE, e cujos resultados foram anunciados no início de Abril, 98% dos trabalhadores de espectáculos viram trabalhos cancelados e, 33% deles, por mais de 30 dias.

Em termos financeiros, para as 1.300 pessoas que responderam ao questionário, as perdas por trabalhos cancelados representam ainda dois milhões de euros, apenas para o período de Março a Maio deste ano, de acordo com o Cena-STE (o que indica a perda de um valor médio de receita, por trabalhador, de cerca de 1.500 euros).

O inquérito, realizado já na segunda quinzena de Março, no contexto de confinamento, em resposta à pandemia da covid-19, indica ainda que 85% dos trabalhadores questionados são independentes e não têm qualquer protecção laboral.

De acordo com um inquérito realizado pelo Movimento SOS Arte PT, a 300 pessoas entre 3 e 17 de Abril, 65% dos profissionais das artes três em cada quatro registaram fortes quebras de rendimento devido à pandemia.

Em Março, devido à covid-19, 62% dos inquiridos tiveram o seu trabalho completamente ou quase completamente parado, 65% (dois em cada três) viram ser completamente afectada a sua vida profissional e 75% (três em cada quatro) a sua vida pessoal.

Cerca de metade dos inquiridos (54%) afirmaram que a covid-19 prejudicou completamente os seus rendimentos, enquanto apenas 6,6% disseram não ter os rendimentos afectados pela paralisação. Ao mesmo tempo, 65% dos inquiridos viram a vida profissional completamente afectada pela covid-19, contra 0,6% dos inquiridos que disseram que a pandemia do novo coronavírus não os afectou.

Cancelamentos começaram em Março

Os espaços culturais começaram a encerrar, e consequentemente a adiar ou cancelar espectáculos, no início de Março, quando tal era ainda apenas uma recomendação do Governo. De acordo com a Associação de Promotores de Espectáculos, Festivais e Eventos (APEFE), desde meados de Março e até ao final de Abril, foram cancelados, suspensos ou adiados cerca de 27 mil espectáculos. A APEFE contabilizou apenas eventos com bilhetes pagos.

Entretanto, o Governo aprovou em 30 de Abril, em conselho de ministros, o Plano de Desconfinamento, que previa a reabertura de livrarias, bibliotecas e arquivos (que aconteceu no dia 4 de maio), seguindo-se museus, palácios, galerias e monumentos, em 18 de Maio, data que coincide com o Dia Internacional dos Museus. Segundo este plano, cinemas, teatros, auditórios e salas de espectáculos podem abrir em 1 de Junho, “com lugares marcados, lotação reduzida e distanciamento físico”. Estas decisões serão “reavaliadas a cada 15 dias”.

Além disso, na semana passada deu entrada no Parlamento uma proposta de lei, da autoria do Governo, que proíbe a realização de “festivais e espectáculos de natureza análoga” até 30 de Setembro, mas com excepções. Segundo a proposta de lei, que será discutida em plenário na quinta-feira, “até 30 de Setembro, os espectáculos podem acontecer em recinto coberto ou ao ar livre, com lugar marcado e no respeito pela lotação especificamente definida pela Direcção-Geral da Saúde em função das regras de distanciamento físico que sejam adequadas face à evolução da pandemia da covid-19”.

A proposta é aplicável ao reagendamento ou cancelamento de espectáculos não realizados entre os dias 28 de Fevereiro de 2020 e 30 de Setembro de 2020. É ainda feito o alerta de que a proibição da realização de “festivais e espectáculos de natureza análoga” pode ser prolongada para depois de 30 de Setembro, “com fundamento em recomendação da Direcção-Geral da Saúde”.

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