Layoff simplificado: a subtileza dos números

O Governo faz um figurão com custos muito mais baixos do que numa situação de desemprego, restando ainda perceber se os números refletem ou não esta realidade, pois se o não fizerem estão a esconder uma realidade objetiva.

O Decreto-lei 10-G/2020 de 26 de Março, implementou o regime do layoff simplificado como uma medida excecional e temporária de proteção dos postos de trabalho no âmbito da pandemia de covid-19. Este regime permite pagar aos trabalhadores dois terços do salário bruto, ou seja, antes de IRS e TSU, com um mínimo de 635,00 euros e um máximo de 1.905,00 Euros (artigo 305.º n.º3 do Código do Trabalho).

Em concreto, o empregador recebe, da Segurança Social, um apoio extraordinário à manutenção de contratos de trabalho de 70% do valor de dois terços dos ordenados brutos dos seus trabalhadores, com a duração de um mês, prorrogável mensalmente até três meses. Em caso de redução temporária do horário de trabalho, o apoio será proporcional ao tempo de redução.

Para se poder aceder a estes apoios é exigido ao empregador uma série de requisitos legais, nomeadamente a paragem total ou parcial da atividade da empresa ou do estabelecimento, uma redução abrupta e acentuada da faturação, de pelo menos 40%, no período de trinta dias anterior à do pedido de layoff e com referencia à média mensal dos dois meses anteriores a esse período, ou face ao período homólogo do ano anterior ou ainda, para quem tenha iniciado a atividade há pelo menos doze meses, à média desse período.

Como contrapartida, o empregador tem de ter a sua situação contributiva regularizada, está proibido de proceder a despedimentos coletivos ou por extinção do posto de trabalho até agosto de 2020, tem que fazer prova documental dos requisitos legais que lhe são impostos para poder aceder a este regime, tem de pagar pontualmente os ordenados dos seus trabalhadores e está proibido de distribuir dividendos aos seus sócios ou acionistas durante a vigência das obrigações decorrente do presente incentivo. 

Ora, sem pôr em causa a bondade e as evidentes virtudes deste incentivo, tentarei analisá-lo numa perspetiva do esforço que é pedido a cada uma das partes, socorrendo-me para o efeito a uma análise objetiva dos números, de modo a poder fazer uma leitura que me permita dilucidar o investimento de cada um e do Estado neste regime, face ao que seria necessário numa situação de desemprego.

Analisemos então a situação concreta dum trabalhador que aufere a quantia mensal bruta de 1404,00 euros. Este trabalhador, no regime normal anterior à sua entrada em layoff, recebia uma remuneração líquida de 1128,75 euros. Em layoff, este mesmo trabalhador recebe dois terços do seu salário bruto, ou seja recebe agora 936,00 euros, que depois de descontados 142,00 euros para o IRS e 102,96 euros de TSU, acaba por receber o valor líquido de 691,04 euros.

Por sua vez, do valor bruto do salário deste trabalhador o Estado, através da Segurança Social, comparticipa com 655,20 euros e o empregador com 280,80 euros. Contudo o Estado, por força do regime fiscal e parafiscal aplicável, vem descontar sobre o salário deste trabalhador 142,00 euros em sede de IRS e 102,96 euros referentes 11% para a Segurança Social (TSU) descontados diretamente ao trabalhador, o que perfaz um montante global de descontos de 244,96 Euros.

Isto é, na realidade a injeção de capital feita pela Estado para pagamento deste incentivo é de 410,24 euros e não de 655,20 euros, uma vez que recupera, por via dos impostos e contribuições para a Segurança Social, 244,96 euros. Por outro lado, este mesmo trabalhador se fosse colocado numa situação de desemprego receberia do Estado a importância líquida de 987,66 euros, uma vez que o subsídio de desemprego não está sujeito a qualquer desconto.

Assim, confrontando o lay-off versus subsídio de desemprego os números apontam para a seguintes conclusões:

O trabalhador recebe menos 296,62 euros em layoff, o empregador paga 280,00 euros e o Estado paga menos 577,42 euros do que pagaria nesta mesma situação de desemprego.

Nestes termos, nesta situação de crise empresarial em que nos encontramos, com o layoff, posso concluir que os trabalhadores perdem uma parte substancial do seu salário normal mas ficam com emprego, isto partindo do princípio que o empregador soube fazer contas e tem recursos próprios que lhe permitam aguentar a fase de reentrada da economia na normalidade sem ter que pedir a sua insolvência daqui a uns meses.

As empresas, nesta crise, têm um custo com a massa salarial superior a 50% do custo líquido do Estado, pairando a dúvida se todos fizeram bem as contas e se, acima de tudo, fizeram uma leitura correta das condições de admissibilidade para poderem recorrer a este regime de manutenção de emprego ou terão de devolver o dinheiro dos apoios mais tarde com os juros respetivos.

O Governo faz um figurão com custos muito mais baixos do que numa situação de desemprego, restando ainda perceber se os números que nos são apresentados pelo Governo como os montantes globais colocados nas empresas em layoff, refletem ou não esta realidade, pois se o não fizerem estão a esconder uma realidade objetiva com grande relevância nos números dos apoios concedidos.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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