É oficial: Mário Ferreira garante 30,22% da dona da TVI

Depois da desistência da Cofina, a quem se tinha juntado para comprar a Media Capital, o empresário dono da Douro Azul assegurou a “negociação exclusiva” de 30,22% do capital do grupo dono da TVI, confirmou a Prisa em comunicado ao mercado.

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fvl Fernando Veludo/NFACTOS

O empresário Mário Ferreira, com interesses na área do turismo, entrou na fase de “negociação exclusiva” até 15 de Maio da compra de uma fatia de 30,22% do Grupo Media Capital, que detém a TVI, as rádios Comercial, Smooth, m80, Cidade, os sites iol, Maisfutebol, Planeo, Selfie, e ainda a sociedade de produção de conteúdos audiovisual (Plural), o activo que gera maior apetite. “A Prisa e a Pluris, sociedade portuguesa detida por Mário Ferreira, subscreveram um memorando de entendimento em relação a uma possível operação de aquisição por parte da Pluris de 30,22% do capital social” da Media Capital, confirmou a Prisa esta sexta-feira.

Segundo um comunicado do grupo espanhol, divulgado ao mercado, o objectivo do memorando é definir “os termos e condições iniciais” da operação, assim como “os passos a seguir para a realização da operação, incluindo os contactos preliminares com as autoridades reguladoras portuguesas”. Adicionalmente, este acordo visa “obter a autorização de determinados credores financeiros da Prisa” e prevê um prevê um “período de exclusividade até 15 de Maio de 2020”.

A Prisa não faz referência a qualquer valor da operação, mas sinaliza que a empresa de Mário Ferreira terá a representação adequada (sem controlo) na administração da Media Capital, mantendo-se o grupo espanhol como accionista único de controlo, sem qualquer acordo parassocial. A finalizar, a Prisa sublinha o “compromisso” de Mário Ferreira “com Portugal”, em “apoiar e ajudar a gestão da Media Capital com a sua experiência financeira”, a “sua trajectória como investidor responsável e orientado para o crescimento”, bem com a “sua capacidade de proporcionar, se necessário, financiamento adicional à Media Capital”.

Mário Ferreira, de 52 anos, dono do Grupo Mystic Invest (empresa de cruzeiros de mar e de rio e de hotéis), ter-se-á posicionado numa primeira fase sozinho, mas já contará neste momento com o apoio do Abanca. A aquisição de 30% da Media Capital - noticiada pela Visão e confirmada pelo PÚBLICO - trava a obrigatoriedade de Mário Ferreira lançar uma oferta pública de aquisição sobre todo o capital (obrigatória a partir de 33%). E deixa a porta aberta a eventuais parceiros. Este domingo, o Abanca, através de fonte oficial veio “desmentir as informações erradas de que acompanhará o empresário Mário Ferreira na operação de aquisição de participação na Media Capital”.

As conversas entre este empresário e o grupo espanhol foram desencadeadas assim que o consórcio liderado por Paulo Fernandes, presidente da Cofina, e que incluía Mário Ferreira e o banco de capitais venezuelanos Abanca (com 5% da Media Capital), cancelou unilateralmente o acordo com a Prisa, conhecido no Outono de 2019. Isto aconteceu a 11 de Março do corrente ano, já com a crise instalada pela pandemia por covid-19.

Horas depois de Paulo Fernandes ter anunciado que recuara no acordo, o presidente do Grupo Mystic Invest declarou publicamente que se tratara de uma decisão exclusiva dos accionistas da Cofina, que não conseguiram realizar o aumento de capital de 80 milhões de euros previsto para sustentar o investimento na Media Capital. E referiu que “ninguém me consultou” sobre a desistência.

Na altura, Mário Ferreira (um dos accionistas do Eco) mostrou-se desagradado e declarou que tinha as verbas disponíveis, 20 milhões de euros, para subscrever o aumento de capital que ficou por realizar, tendo mesmo ido ao mercado comprar 2% da Cofina, dona, entre outros títulos, do Correio da Manhã, da CMTV, do Negócios e da Sábado. Em Maio de 2019, Mário Ferreira vendeu 40% do Grupo Mystic Invest ao fundo americano Certares, por 250 milhões de euros, o que lhe conferiu uma substancial liquidez. O PÚBLICO tentou falar com Mário Ferreira que não esteve disponível para prestar declarações.

Um dos administradores não executivos do grupo de Mário Ferreira é Diogo Lacerda Machado, administrador da TAP (e que se tornou conhecido como amigo do primeiro-ministro António Costa). Mas o nome que se destacou nos últimos dias foi o de Manuel Alves Monteiro, o antigo presidente da Bolsa de Lisboa, e também ele “administrador” de carreira.

E isto porque, quando na semana passada foi tornado público que Alves Monteiro tinha sido nomeado administrador executivo da Media Capital, em representação da Prisa, foi interpretado como um sinal de que a negociação estaria em fase avançada. Na altura, levantou-se uma frente de rumores de que Alves Monteiro era um testa-de-ferro de Mário Ferreira para fazer uma due-diligence (análise da empresa), interpretação logo negada mas que, entretanto, ganhou força, dado o quadro de guerra de bastidores e contra-informação que se instalou com a renúncia da Cofina (sobre a qual incorrem acções judiciais iniciadas pela Prisa).

A 22 de Abril, o PÚBLICO avançara já que outro consórcio, encabeçado pelo presidente do Grupo Bel (áreas da distribuição de bens essenciais, tabaco e bebidas e da indústria), Marco Galinha, de 43 anos (o actual vice-presidente da ANJE-Associação Nacional de Jovens Empresários), por Gustavo Guimarães, que representa o grupo Apollo, pelo Prozis Group e pela Nova Expressão, também se posicionara na corrida para ficar com a Media Capital. Fê-lo através de um email-carta, com data de 8 de Abril, que incluía uma proposta de manifestação de vontade em negociar e cujos destinatários foram o presidente não executivo da Prisa e o do Santander Negócios. Note-se que Javier Monzón de Cáceres acumula o cargo de chairman da Prisa com o de chairman do Openbank, 100% detido pelo Santander. E o Santander é o principal credor do grupo Prisa (e também da Media Capital). Esta intenção foi dada entretanto a conhecer ao primeiro-ministro, António Costa.

O PÚBLICO apurou, junto de fontes financeiras, que quem tem estado, em nome deste grupo, a desenvolver contactos com a Prisa é Gustavo Guimarães, o representante do private equity norte-americano que protagonizou um dos negócios mais rentáveis das últimas décadas. No Outono de 2014, a Apollo, com Guimarães ao leme, comprou por 40 milhões de euros a Tranquilidade ao Novo Banco, já na esfera pública e gerido pelo Banco de Portugal, com o compromisso de injectar na seguradora 150 milhões de euros. Precisamente cinco anos depois, no final de 2019, vendeu a Tranquilidade à Generali por 600 milhões de euros, tendo a gestão recebido uma comissão que em regra, nestas operações, é de 5%.

Horas depois de o PÚBLICO ter noticiado a iniciativa do consórcio encabeçado Marco Galinha e Gustavo Guimarães, o Correio da Manhã noticiava que o administrador da Prisa na Media Capital informara que a proposta do consórcio encabeçada por Marco Galinha tinha sido recusada. O PÚBLICO confrontou fonte oficial do consórcio, que disse: “não nos chegou qualquer informação de que a Prisa se tenha recusado a ouvir-nos e pelo que sei não temos qualquer informação de que está a negociar em exclusivo com outro grupo.”  

A Prisa entrou na Media Capital em 2005, investindo 750 milhões de euros, uma operação que resultou de um entendimento apadrinhado pelos dois primeiros-ministros de Portugal, José Sócrates, e de Espanha, Jose Luis Zapatero. Na altura, Pais do Amaral e o seu sócio Nicolas Berggruen, que actuaram do lado vendedor, encaixaram 303 milhões de euros. Em 2018, e depois de várias tentativas falhadas por parte da antiga PT (com o apoio de Jose Sócrates) para controlar o gripo TVI, a Altice voltou à carga oferecendo 440 milhões de euros. Mas a proposta caiu por terra perante os obstáculos regulatórios.

Notícia actualizada uma primeira vez com comunicado da Prisa e, mais tarde, com desmentido do Abanca

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