FMI prevê queda de 8% no PIB português, com mais 380 mil desempregados

Quebra profunda da economia este ano, bem maior do que na crise da troika, é a previsão do FMI, que ainda assim acredita numa recuperação parcial já no decorrer do próximo ano.

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LUSA/PATRICIA DE MELO MOREIRA

Num cenário de contracção da economia à escala mundial, o ano de 2020 irá, em Portugal, bater todos os recordes negativos, prevê o FMI, com a economia a afundar-se e a taxa de desemprego a mais do que duplicar. A retoma pode chegar logo no ano seguinte, mas, num cenário de grande incerteza, o Fundo alerta que existe o risco de o impacto negativo do coronavírus nas economias ser ainda pior e mais prolongado do que o agora projectado.

Não há, na Europa, um único país que escape à recessão. No caso português, aquilo que o Fundo Monetário Internacional (FMI) estima é uma contracção do PIB em 2020 de 8%. Será a contracção do PIB anual mais acentuada de que há registo, bastante pior do que a verificada no pior ano da última crise. Em 2012, o ano em que mais se fizeram sentir as medidas de austeridade da troika, o PIB português contraiu-se 4,1%, apenas um pouco mais de metade do que aquilo que o FMI projecta agora de quebra da actividade económica.

As previsões do FMI para este ano são também mais pessimistas do que as apresentadas no final do mês passado pelo Banco de Portugal. A autoridade nacional previa reduções do PIB que, no cenário-base, eram de 3,7%, mas que podiam, num cenário mais adverso, chegar aos 5,7%.

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Agora, com o passar das semanas, as expectativas ficam ainda mais sombrias.

A quebra de 8% projectada pelo FMI parece ficar em linha com aquilo que são os cenários com que o Governo está a trabalhar neste momento. Nesta segunda-feira, numa entrevista à TVI, o ministro das Finanças antecipava perdas no PIB anual de 6,5% por cada 30 dias úteis de contenção na actividade semelhante à actual.

A paragem já se verifica desde meados de Março, o que significa, usando os números do ministro, que, se a presente situação de contenção se prolongar para lá do início de Maio, a descida anual do PIB se começa a aproximar da marca dos 10%. Ainda assim, o ministro disse acreditar que a redução anual do PIB em 2020 “não chegará aos dois dígitos”.

Portugal é, entre os 19 países da zona euro, o quinto, a par da Espanha e da Eslovénia, com uma redução esperada do PIB mais acentuada este ano. Em média, a contracção projectada para a zona euro é de 7,5% e os países que mais se destacam são a Grécia e a Itália, com quebras de 10% e 9,1%, respectivamente.

Há algumas características comuns entre os países com previsões de recessão mais profunda. Estão a ser particularmente afectados pela pandemia, têm níveis de endividamento elevados e o peso do sector do turismo na economia é bastante alto. As duas últimas características podem ter tido um efeito relevante na previsão do FMI para Portugal (no relatório não são dadas explicações para a previsão realizada para cada país).

Desemprego duplica

A contracção abrupta da economia (em 2019, a economia portuguesa cresceu 2,2%) irá ter, como seria de esperar, um efeito muito negativo no mercado de trabalho. Para o FMI, a taxa de desemprego, que tinha vindo a descer consecutivamente desde 2013, poderá mesmo mais do que duplicar em 2020, passando dos 6,5% em 2019 para 13,9%.

É um salto nunca visto desde que se realiza o registo da taxa de desemprego no país e mostra bem o enorme choque que o FMI está a antecipar para uma parte muito significativa da população portuguesa. Tendo em conta os números actuais da população activa, o aumento da taxa de desemprego estimado significa que, em 2020, cerca de 380 mil portugueses poderão perder o seu emprego.

Ainda assim, a taxa de desemprego de 13,9% fica abaixo do máximo histórico deste indicador, já próximo dos 17%, que foi atingido em Portugal em 2013.

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Em 2021, a recuperação?

A notícia mais positiva nas previsões é que, pelo menos no seu cenário-base, o FMI está a apontar para uma retoma célere e relativamente forte. Logo para o ano de 2020, o Fundo coloca a economia portuguesa, mais uma vez a par do resto do mundo, a crescer 5%, recuperando uma parte do terreno perdido no ano anterior. A taxa de desemprego, por sua vez, voltaria a cair, para 8,7%.

É um resultado que é obtido pelo facto de o FMI, no seu cenário central, estar a assumir que as medidas de confinamento adoptadas para travar o vírus começarão a ser levantadas durante a segunda metade deste ano, permitindo a reactivação da actividade económica. A previsão parte também do princípio de que focos de reacendimento do contágio em 2021 serão limitados.

No actual cenário de incerteza, antecipar como será a evolução da pandemia é um exercício cheio de riscos. E o próprio FMI, ao falar das suas projecções para o total do globo, avisa que alerta que há “riscos severos de um resultado pior”.

Traça mesmo três cenários alternativos, bastante mais desfavoráveis. No primeiro, assume uma manutenção das medidas de contenção em todos os países por um período 50% mais longo do que o previsto no cenário-base, além de um ambiente menos favorável nos mercados financeiros, com subida das taxas de juro da dívida. Só isso faz com que a contracção do PIB prevista para 2020 seja três pontos percentuais mais negativa, isto é, a economia mundial cairia 6% este ano.

No segundo cenário, assume-se que ocorrerá um regresso da pandemia em 2021, com uma dimensão dois terços mais forte do que o assumido no cenário-base. Isso faria com que a retoma agora prevista para 2021 fosse posta em causa, já que se teria de retirar cinco pontos percentuais à taxa de crescimento projectada, passando-a assim para 0,8% (com a Europa, por exemplo, a manter taxas de crescimento negativas).

No terceiro cenário, o pior, o FMI assume não só um período de contenção mais longo em 2020 como a ocorrência de uma recaída em 2021. E aí, o PIB ficaria 8% abaixo do cenário-base no próximo ano.

Se um destes cenários se concretizar, as previsões para a economia portuguesa, já assim no nível mínimo histórico, conseguirão atingir um recorde ainda mais assustador.

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