Joe Exotic, o rei dos tigres que cativou o mundo

Tiger King: Murder, Mayhem and Madness, a bizarra e alucinante série documental da Netflix centrada no fundador de um jardim zoológico privado no Oklahoma, é um fenómeno à escala mundial.

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Joe Exotic e um dos seus animais em Tiger King Netflix

Após vários anos de preparação, Tiger King: Murder, Mayhem and Madness, uma inacreditável série documental da Netflix, saiu, por acaso, a 20 de Março. Com uma boa parte do seu potencial público fechada em casa, transformou-se rapidamente num fenómeno. A série, co-realizada por Eric Goode e Rebecca Chaikin, segue a colorida história de Joe Exotic — nome escolhido por este homem que nasceu Joe Schreibvogel e passou a chamar-se Joseph Maldonado-Passage após um casamento a três.

Joe Exotic é um auto-intitulado redneck, o termo depreciativo para os brancos pobres do meio rural norte-americano. Cabelo oxigenado culminando numa mullet, é um amante de armas e o fundador, em Oklahoma, de um jardim zoológico privado inaugurado no final dos anos 1990, especializado em tigres e outros felinos grandes. Em 2016, candidatar-se-á à presidência dos Estados Unidos, manobra que lhe trará alguma fama ao proporcionar-lhe uma aparição num episódio de Last Week Tonight, o talk show de John Oliver. Tiger King, que parte de anos de filmagens no jardim zoológico, enquanto tudo e mais alguma coisa ia acontecendo, versa sobre ele e os seus colaboradores, rivais e oponentes, personagens tão ou mais interessantes (ou condenáveis) quanto o protagonista, e sobre o submundo da criação e da venda de espécies protegidas na América.

Ao longo de seis episódios alucinantes, recheados de revelações inesperadas e de fazer cair o queixo, com uma montagem inteligente e sensacionalista, a série mergulha-nos no universo de Joe Exotic. Há de tudo aqui: intriga, mistério, traição, avareza, maus-tratos a animais (que não são explorados na plenitude) e abusos a pessoas, fogo posto e tentativas de homicídio. Há o dono de uma reserva animal que é simultaneamente líder de um culto polígamo e um trabalhador do zoo cujo braço é arrancado por um tigre e volta quase logo a seguir ao trabalho; há uma activista dos direitos dos animais que poderá ou não ter assassinado o ex-marido e um ex-traficante de droga que diz ter sido a inspiração para o Tony Montana de Scarface  A Força do Poder. 

E Tiger King ainda tem muito mais, mesmo deixando de fora partes significativas da história de Joe Exotic.

Para além de Tiger King

Para fazer o documentário, Eric Goode passou mais de cinco anos embrenhado neste mundo. Não foi o único. Robert Moor, um jornalista sem qualquer ligação a Tiger King ou a Goode, também passou muito tempo a investigar o universo de Joe Exotic. Para a segunda temporada do podcast Over My Dead Body, Moor falou com muitas das pessoas retratadas na série. Teve com elas conversas um pouco mais intimistas, que pintam um retrato mais completo de muitas delas e da história. É mais informativo do que o documentário, e tem mais empatia, por exemplo, com os problemas de drogas que assolam a zona de Oklahoma em que o jardim zoológico está situado. Também aprofunda a vida do protagonista, falando do seu ex-marido que morreu há quase duas décadas, acontecimento que ficou de fora da série e é apontado no podcast como um momento-chave na transformação de Joe Schreibvogel em Joe Exotic.

podcast saiu em Agosto do ano passado, e já tinha entretanto sido comprado para ser adaptado à televisão, com Kate McKinnon, de Saturday Night Live, a fazer de Carole Baskin, a némesis de Joe, que a série da Netflix demoniza bem mais do que as restantes personagens abusivas. Foi relançado como Joe Exotic: Tiger King, com episódios bónus, a 19 de Março. O sexto (e último) episódio volta a sair na próxima semana.

Pouco depois da estreia de Tiger King, Moor comentou algumas curiosidades da história de Joe Exotic no Twitter, clarificando certas omissões do documentário, evocando outras situações estranhas que ficaram de fora e apontando mentiras que os visados dizem nas entrevistas. Entre outros factos, Moor argumenta que Eric Goode é uma personagem tão ou mais interessante quanto aquelas que aparecem na série. Um artista plástico da Nova Iorque dos anos 1980, dono de discotecas como a mítica Area, bem como de restaurantes e hotéis, Goode tem-se dedicado à conservação (e à criação) de tartarugas. Ou seja, também está, como as pessoas que filmou, envolvido no mundo animal. 

Entre as críticas que Moor aponta à série está, por exemplo, o facto de serem mostrados telediscos de canções supostamente compostas, tocadas e cantadas por Joe Exotic, mas nas quais, na realidade, só se ouve um pouco da má voz do protagonista. E Saff, o trabalhador que ficou sem um braço e é uma das poucas personagens por quem se torce, é identificado no documentário como mulher, quando é na realidade um homem trans.

Jeff Lowe, o ex-parceiro de negócios de Joe que tem um papel fulcral na trama, anunciou entretanto, num vídeo partilhado no Twitter (mas não por ele), que há um episódio novo da série a sair esta semana. A Netflix não confirma nem desmente. É possível que ele esteja a dizer a verdade, mas há várias razões, como perceberá quem vir a série, para duvidar. De resto, o vídeo tem o logótipo da plataforma Cameo, que permite que se pague a figuras conhecidas para dizerem o que se quiser (Jeff Lowe cobra 140 euros). Já o puseram, por exemplo, a falar de como “o colapso do capitalismo global é (...) inevitável” e “o comunismo vai erguer-se das suas cinzas”...

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