Covid-19: “É possível adiar o início do ano lectivo” mas é uma operação de “alguma complexidade”

Decreto presidencial permite adiar os exames e o início do próximo ano lectivo. Directores escolares dizem que “todas as possibilidades são legítimas”. Se houver alterações ao calendário até aqui definido, passa a ser possível encontrar uma solução para o ingresso nas universidades e nos politécnicos, diz o presidente da comissão nacional de acesso.

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ADRIANO MIRANDA

“A situação em que vivemos é de tal modo estranha e grave que tudo é possível”, diz José Eduardo Lemos, presidente do Conselho de Escolas, o organismo que representa os directores junto do Ministério da Educação, sobre as alternativas avançadas na proposta de decreto presidencial que permite adiar os exames e o início do próximo ano lectivo.  Por exemplo, “é possível adiar o início do ano lectivo”, embora seja uma operação de “alguma complexidade”, sublinha.

O também director da Escola Secundária Eça de Queiroz, na Póvoa de Varzim, chama a atenção de que “tudo irá depender” da altura que for possível reiniciar as aulas.

“Se for até ao final de Abril, princípio de Maio, então estes problemas vão ficar resolvidos quase naturalmente”. Mas se tal não for exequível, então o “final do ano lectivo estará perdido e também os exames, como os conhecemos”, alerta o também presidente do Conselho das Escolas.

O projecto do decreto do Presidente da República para a renovação do estado de emergência, divulgado nesta quarta-feira, abre a porta ao adiamento dos exames nacionais do ensino secundário, previstos para a segunda quinzena de Junho. Entre as medidas enquadradas por este diploma está também um possível prolongamento do terceiro período, bem como o adiamento do arranque do próximo ano lectivo.

Quanto aos exames, se a situação actual se prolongar, José Eduardo Lemos afirma ser “óbvio que os seus conteúdos têm de ser alterados de modo a não incluírem os conteúdos que deveriam ter sido ministrados desde o início de Março até ao final de Junho”. Ou então tem de se “redistribuir as cotações atribuídas a estes conteúdos pelo resto da prova”.

"Preparados para medidas novas"

“Todas as possibilidades são legítimas”, afirma o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE), Manuel Pereira, a propósito das alternativas apresentadas pelo Presidente da República, frisando que existem aqui dois “interesses superiores” a defender: os da saúde e os dos alunos.

“Estamos a viver uma situação de absoluta excepção em que temos de estar preparados para medida novas e de excepção”, frisa este director. Por exemplo, assumir a realização das provas de aferição, marcadas para Maio, “não qualquer sentido” e também que “se deixe cair os exames do 9.º ano”. 

Sobre o ensino secundário sublinha que o mais importante “é garantir a equidade e que ninguém fique prejudicado no acesso ao ensino superior”, adiantando por exemplo as datas dos exames, como também foi sugerido por Marcelo Rebelo de Sousa, e ponderando a possibilidade de, no fim da pandemia, os alunos do secundário “voltarem às escolas, para ficarem melhor preparados”.

“Quanto ao resto, vamos ter muito tempo depois para recuperar”, defende para destacar também o papel que os professores têm tido no sentido de “manterem os alunos motivados para as aprendizagens”, o que tem sido “um grande desafio atendendo às limitações de muitas escolas, alunos e famílias”.

E deste tempo em que o país mergulhou também há “ganhos” que se estão a conseguir, como “o voltar a estar em família e o reconhecimento da importância das escolas e dos professores”, afirma ainda Manuel Pereira.

O adiamento dos exames já foi defendido pela Confederação Nacional das Associações de Pais no caso desta situação de excepção “se prolongar”. Também representantes estudantis ouvidos pelo PÚBLICO se pronunciaram a favor desta alternativa.

O decreto do Presidente da República prevê ainda “a proibição ou limitação de aulas presenciais”, em vigor desde 16 de Março, e a “imposição do ensino à distância por meios telemáticos (com recurso à Internet ou à televisão)”, um cenário em que o Governo tem adiantado estar a trabalhar, sem, no entanto, ter clarificado até agora como poderá ser implementado.

“Ajustes ao modelo de acesso ao ensino superior”

Ao contrário do que aconteceu no primeiro decreto de declaração do estado de emergência, que não continha medidas específicas para o sector da Educação – a suspensão das aulas presenciais já tinha sido decidida pelo Governo uma semana antes – desta feita Marcelo Rebelo de Sousa prevê a possibilidade de “adiamento ou prolongamento de períodos lectivos”, bem como o ajustamento de métodos de avaliação e a “suspensão ou recalendarização de provas de exame”. O diploma prevê ainda eventuais mudanças na “abertura do ano lectivo” e “ajustes ao modelo de acesso ao ensino superior”.

O projecto de decreto do Presidente da República permite “começar a clarificar a situação”, avalia o presidente da Comissão Nacional de Acesso ao Ensino Superior (CNAES), João Guerreiro. O diploma dá o enquadramento necessário para fazer “deslizar” o calendário não só dos exames nacionais, previstos para a segunda quinzena de Junho, tal como tinha vindo a ser pedido por estudantes, directores de escolas e encarregados de educação, mas também antecipa um eventual adiamento do início do próximo ano lectivo.

Se houver alterações ao calendário até aqui definido, passa a ser possível encontrar uma solução para o ingresso nas universidades e politécnicos, cujas candidaturas estão previstas para Julho – com os resultados das colocações agendados para o início de Setembro, entende Guerreiro. A decisão sobre um eventual adiamento deste calendário poderá ser tomada no final da próxima semana pela CNAES e pelo Ministério do Ensino Superior.

O presidente da CNAES entende que a melhor solução passa por manter o acesso ao ensino superior nos moldes habituais, ou seja com a realização de exames nacionais no ensino secundário, que são decisivos para definir o futuro dos estudantes. Ainda que uma decisão quanto à forma de conclusão do ensino secundário caiba ao Ministério da Educação, João Guerreiro diz que não seria razoável que o ingresso nas universidades e politécnicos fosse feito sem que os alunos realizassem provas nacionais. “Tenho reservas a utilizar apenas as notas internas”, diz, lembrando que os dados da Inspecção-Geral de Educação e Ciência tem divulgado nos últimos anos mostram discrepância importantes entre os resultados obtidos nas escolas e o desempenho dos alunos nas provas.

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